O Teletrabalho na Perspectiva da Reforma Trabalhista

Análise crítica da perspectiva da reforma sobre o teletrabalho: impactos legais e desafios enfrentados no contexto atual do mercado de trabalho

Por Márcia Vizeu - 17/04/2024 as 16:40

Não é novidade que nos últimos anos estamos vivenciando uma verdadeira revolução tecnológica, que a cada ano vem se intensificando, com a criação de vários meios de acesso ao mundo virtual, tornando cada vez mais fácil o desenvolvimento de atividades e, principalmente, comunicação.

Devido a essa evolução, o cenário trabalhista também se desenvolveu e se adaptou a nova realidade, que trouxe mudanças positivas com a introdução de tecnologias de informação e comunicação para as relações de trabalho, tanto no ambiente industrial quando para a prestação de serviços.

Se antes a relação de trabalho era pautada na territorialidade e contagem de tempo, hoje passou a ser pautada nos resultados. Com o avanço da tecnologia e a nova visão proporcionada por ela, surgiu uma nova modalidade de trabalho, que vem se tornando cada vez mais comum, chamada de Home Office.

Isso porque, com as diversas possibilidades e facilidade de comunicação entre empregado e empregador, o local da realização do trabalho e o controle do tempo passam a ser irrelevantes.

O Teletrabalho na Reforma Trabalhista

Assim, devido ao crescimento dessa modalidade de trabalho, a Lei nº 13.467/17- Reforma Trabalhista, inseriu na CLT um capítulo para tratar do tema, dispondo sobre aspectos inerentes a classe, que é denominada pelo legislador de Teletrabalho.

É importante destacar que A Organização Internacional do Trabalho (OIT) por meio da Convenção n. 177/1996 e Recomendação n.º 184/1996, foram criadas e adotadas pala Conferência Internacional do Trabalho para dispor sobre questões do trabalho em domicílio, como seu conceito e temas relacionados à segurança e saúde. Todavia, é de suma importância saber diferenciar trabalho em domicílio de teletrabalho, visto que são modalidades distintas.

O teletrabalho, como bem conceitua o legislador, é toda “prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.

Ou seja, podemos observar duas características básicas, uma em relação ao ambiente da prestação de serviços, que deve ser realizado fora da sede da empresa, mas não necessariamente no domicílio do empregado, podendo ser desenvolvido em qualquer ambiente da preferência do trabalhador.

A outra é em relação a forma do trabalho, onde a questão não é somente trabalhar à distância, mas sim através do uso de tecnologia, os denominados mecanismos “telemáticos”, ou seja, o trabalho realizado com computadores e outros meios de informação, comunicação e tecnologia, que permitam a realização e envio das tarefas designadas, a produção de resultados e a interação entre empregados e empregador.

As Vantagens e Desvantagens do Teletrabalho

As principais vantagens trazidas com o home office são em relação a flexibilidade de horários, economia do tempo gasto com locomoção e maior convívio familiar. Já as desvantagens giram em torno do isolamento, falta de interação, menor proteção quanto a inspeção laboral, dentre outras. Devido a isso, o texto trazido pela Reforma Trabalhista aborda questões inerentes à classe e normas a serem seguidas na relação contratual, visando atenuar riscos e problemas decorrentes do teletrabalho, além de uniformizar critérios que antes não possuíam regulamentação.

Uma questão importante trazida pela lei, no §2º do art. 75-C da CLT, é sobre a alteração do regime de teletrabalho para o regime presencial pelo empregador, mediante acordo com o trabalhador ou de forma unilateral. Também é abordada a questão da aquisição, manutenção e fornecimento dos equipamentos utilizados para desenvolver a atividade, expressa no art. 75-D da CLT, que deixa a responsabilidade a critério contratual acordado pelas partes.

Assim, fica claro que ao teletrabalho é aplicada a flexibilização contratual trazida pela Reforma, que dá ao empregador e ao empregado maior liberdade para pactuar as clausulas contratuais e acordar sobre grande parte do vínculo empregatício.

O Teletrabalho e a Segurança do Trabalhador

Com relação aos acidentes de trabalho, fica expresso no artigo 75-E que é obrigação do empregador “ instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho”, e em contrapartida é obrigação do empregado “seguir as instruções fornecidas pelo empregador”, mediante termo assinado de responsabilidade.

Dessa forma, mesmo diante de um trabalho que não é realizado na sede da empresa, o empregador não fica eximido da responsabilidade de fiscalização do ambiente laboral, principalmente porque com a tecnologia há diversas formas de controle e monitoramento.

Por isso, o teletrabalhador deve ser orientado quanto ao uso das ferramentas que utiliza, postura adequada, condições do ambiente de trabalho e outras medidas para garantir a saúde e segurança. Ademais, mesmo diante da previsão constitucional da inviolabilidade do domicílio, deve constar no contrato ou ser autorizado pelo trabalhador a possibilidade de fiscalização.

Apesar de não constar expressamente na CLT a responsabilidade do empregador por danos decorrentes do teletrabalho, os enunciados nº 72 e 83 aprovados na 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho dispõe entendimento no sentido que “o regime de teletrabalho não exime o empregador de adequar o ambiente de trabalho às regras da NR-7 (PCSMO), da NR-9 (PPRA) e do artigo 58, § 1o, da Lei 8.213/91 (LTCAT), nem de fiscalizar o ambiente de trabalho, inclusive com a realização de treinamentos”.

Portanto, podemos observar que a regulamentação do Teletrabalho preencheu uma lacuna na lei e uniformizou entendimentos que estavam em discussão. Em contrapartida, muitas questões ficaram omissas, como o ônus da prova em caso de demanda processual, a responsabilidade do empregador em acidentes decorrentes da prestação de serviços e doenças ocupacionais e as horas extras, por exemplo, que ainda dependem do posicionamento jurisprudencial.