Joint Venture: Contrato de Empreendimento Comum

Por Leonice Cober Lopes - 24/05/2022 as 08:44


Esse artigo tem por objetivo definir a joint venture, que de momento podemos dizer que é uma expressão de origem inglesa, que significa Empreendimento Conjunto e também pode ser entendida como “união com risco” entre duas ou mais empresas, que podem ou não ser do mesmo ramo, que se unem por um tempo específico ou, até mesmo por tempo indeterminado para desenvolver um determinado projeto.

Ainda, pretendemos apontar neste artigo, alguns fatos históricos, como por exemplo a aparição da joint venture como modalidade de negócio no mundo jurídico e, como todo e qualquer instituto jurídico, tem sua trajetória, as joint ventures não fugiram a regra. E, foi no século XV, durante as grandes expedições que os armadores encontram esta modalidade de associação para fazerem seus negócios.

As joint ventures, tem suas características únicas de associações para desenvolvimento de negócios de risco. Desta forma, iremos apresentar as principais características dos contratos das joint ventures e demonstrar o porquê de ser tão utilizado nesta modalidade de contratos de alto risco.

Ainda, apresentaremos as vantagens e desvantagens de firmar estes acordos de empreendimento comum com tanta frequência nos mais diferentes ramos de negócios, e em vários países, hoje envolvendo grandes empresas dos mais variados tipos de empreendimentos. Apresentaremos ainda, alguns exemplos de empresas que uniram seus esforços através de um contrato joint venture para manter no mercado seu nome e seus produtos.

Ainda, será mencionado algumas características da cláusula de confidencialidade muito presente nos contratos joint ventures e sua grande importância para as partes, seus investidores e principalmente a proteção do projeto a ser perseguido.

No que diz respeito diretamente ao empreendimento comum, e seu contrato destacaremos algumas especificidades desta modalidade negocial utilizando como exemplo os contratos da indústria petrolífera, considerados contrato de alta complexidade por envolver muitos agentes e atividades a serem desenvolvidas,  que normalmente são executadas a longo prazo.
 

História das Primeiras Joint Ventures

A origem e evolução histórica das joint ventures não pode ser contada sem antes mencionar a origem das sociedades anônimas, que foi criada em 1409 e recebeu esta denominação. Esta figura jurídica, também se manifestou em 1602 com as companhias colonizadoras que se destacaram na Holanda e a Companhia das índias Orientais e a Companhia das Índias Ocidental que foram fundadas em 1621.

Contudo, os primeiros contratos das joint ventures não tiveram um evento específico como as sociedades anônimas, pois não temos datas exatas de seu aparecimento como figura jurídica, e esta denominação foi construída com o passar do tempo. Contudo, temos notícias que esta modalidade apareceu em negócios realizados no final do século XV, logo no fim da idade média e início do Renascentismo.

Nesta época de grandes expedições, principalmente para transporte de metais, pedras preciosas e outras especiarias de alto valor agregado, os armadores buscavam parceiros comerciais, pois se tratava de navegações de alto risco, devido as grandes dificuldades enfrentadas pelo transporte marítimo na época, como ataques de piratas em alto mar, falta de equipamento de segurança para evitar impactos das embarcações contra rochas submersas, além de ocorrência de motins, que era comum na época.

Desta forma, os armadores buscavam parceiros com o intuito de partilhar lucros e prejuízos, caso acontecesse algum imprevisto, ou seja, empresas juntam esforços para enfrentar as dificuldades, os riscos e as limitações de um determinado projeto a fim de mitigar as consequências de prejuízos não prováveis.

Com relação ao termo jurídico joint venture, este surgiu na Grã-Bretanha no século XVI, utilizado por associações que tinham negócios no comércio marítimo. Estas associações competiam com as “Chartered Companies” que eram companhias privadas com certos benefícios conferidos pelo governo que detinham grande parte do mercado.  

Neste passo, as “Chartered Companies”, recebiam benefícios do estado, mas em contrapartida ficavam sujeitas as normas, fiscalização e estatutos rígidos do governo, de outro modo, as joint ventures eram associações sem personalidade jurídica e ficavam livres, informais e desvinculadas de restrições dos governos o que lhes davam boa margem para negociações.

As joint ventures por sua vez, eram de caráter temporário, pois ao final do projeto repartiam os produtos que adquiriam, produtos como a seda, especiarias, metais preciosos, dentre outros itens adquiridos na expedição, ou “adventures” como eram conhecidas as expedições por ser, de certa forma, uma aventura.

Estas associações mercantis que eram designadas por joint ventures tiveram grande notoriedade comercial na América e na Europa, e por este fato sofreram grandes ataques tanto pelos tribunais americanos como pelos europeus. No entanto, hoje é aceita mundialmente como um acordo empresarial com caráter associativo entre duas ou mais sociedades, formalizando societariamente ou não.

Segundo o autor Luís de Lima Pinheiro em Contrato de Empreendimento Comum em Direito Internacional Privado, os contratos de joint venture nos países em desenvolvimento, se destacaram somente no pós-guerra.

“Com respeito aos países em desenvolvimento, firma-se que os joint ventures foram impulsionados, no pós-guerra, por ambiciosos planos de industrialização dirigidos a consecução do objetivo político da independência económica. Mas e também na década de sessenta que o fenômeno se revela com um dos traços dominantes nas relações Norte/Sul, principalmente com a associação de empresas multinacionais a parceiros locais, mas também com a colaboração entre parceiros de países em desenvolvimento, por iniciativa dos respectivos governos”.

Esta proliferação dos joint ventures relaciona-se com a vaga de nacionalizações ocorrida nestes países a partir dos anos cinquenta e pelo desfavorecimento da exploração direta de recursos naturais em regime de concessão que lhe está diretamente ligado. Carentes dos capitais e tecnologias exigidos pela exploração destes recursos, estes países foram levados, inevitavelmente, a interessar as empresas multinacionais na associação com um parceiro local. 

Se pensarmos nos contratos firmados na área de petróleo, BAIN & COMPANY E TOZZINI FREIRE ADVOGADOS. Relatório I – Regimes jurídico-regulatórios e contratuais de E&P de petróleo e gás natural, define este modelo de Contrato como “No modelo de Joint Venture, também conhecido como Contrato de Participação ou Associação, as atividades de exploração e produção são realizadas por meio de uma sociedade de propósito específico (“SPE”), constituída entre o Estado, representado por sua NOC,652 e as OCs, não havendo celebração de contratos representativos de outros regimes jurídico-regulatórios, tais como Contratos de Concessão ou Contratos de Partilha de Produção. Por ter natureza societária, as Joint Ventures ou Equity / Incorporated Joint Ventures, são adotadas quando há investimento ou associação de capitais pelas partes por meio da constituição da SPE.”

E continua: “O tipo societário a ser adotado pelas partes dependerá sempre das leis societárias e fiscais, principalmente, do país produtor; mas, em boa parte dos casos, variações das sociedades anônimas ou das sociedades limitadas são utilizadas. As Joint Ventures também foram adotadas em resposta às disputas concernentes ao desequilíbrio contratual vislumbrado nos primeiros contratos de concessão firmados entre os países produtores do Oriente Médio e as OCs, em que estas recebiam um tratamento mais diferenciado”. 

Estas Associações sempre cumpriram seu papel desde seu início, e atualmente, os riscos nas operações são de grande magnitude devido a expansão da economia americana, chinesa e do mundo moderno globalizado, exigindo cada vez mais investimentos com inovações tecnológicas, infraestrutura e conhecimento para atingir os mercados multinacionais, o que favorece a prática desta modalidade jurídica de fazer negócios.
 

Definição, Características, Vantagens e Desvantagens das Joint Ventures

Quando pensamos em joint ventures, pensamos em fazer negócios, e uma definição mais simples desta modalidade de fazer negócios, ocorre quando duas ou mais empresas fazem um acordo e se unem com um objetivo comercial comum, por tempo determinado. Neste período desenvolvem estratégias que unem seus recursos podendo ser eles somente financeiros, matéria-prima, mão-de-obra ou tecnológicos, tendo ou não partilhamento de Know-how. Tudo isso, de acordo com os termos do contrato a ser firmado.

Ainda, este modelo estratégico, visa desde uma simples colaboração para fins comerciais, ou tecnológicos, ou até mesmo a criação de uma terceira empresa para administrar este contrato, não implicando em perda da identidade e individualidade como pessoa jurídica dos participantes.

Quanto às características deste contrato joint venture, destacamos as principais:

a) Objetivo comum: este objetivo comum pode ser no desenvolvimento de um produto específico, na exploração mineral, construção, podendo ser de natureza simples ou complexo o projeto.

b) Tempo determinado ou indeterminado: estes contratos são firmados por um tempo determinado ou não, pois são dissolvidos quando atingem o objetivo que levaram as empresas a união ou na data determinada no próprio contrato.

c) Divisão dos resultados: Desde sua criação, as joint ventures dividem o resultado do empreendimento, do projeto, os lucros, etc.

d) Termo de Confidencialidade entre as partes: É o compromisso das partes de manter em sigilo as informações do negócio, projetos, produtos, processos, serviços, transações, planos de vendas e marketing, informações de clientes, materiais e conhecimentos específicos nos termos do contrato a fim de manter a confiança e impedir que informações importantes possam comprometer ou prejudicar o empreendimento ou a outra parte.

No que diz respeito aos pontos a serem protegidos pela confidencialidade das partes, dependerá do projeto ao ser desenvolvido no contrato, pois estes termos devem ser determinados de acordo com o tipo de cada empresa e suas características especiais e para cada cenário diferente, e devem ser redigidos por um especialista, sem erros ou expressões ambíguas, assim irá garantir que o documento possa ser executado nos tribunais, em caso de incumprimento, pois assim irá cumprir seu papel para o qual foi elaborado. Contudo, estes termos de confidencialidade, em caso de incumprimento, não poderá ir além da previsão legal.

Os termos de confidencialidade, são muito comuns em ambientes comerciais e empresariais, e não se restringe apenas nas joint ventures, eles também podem aparecer, até mesmo em contratos de trabalho, principalmente aqueles que o colaborador fará parte de equipas que estão desenvolvendo novas tecnologias. Em casos de quebra da cláusula de confidencialidade, o colaborador poderá, além de perder seu posto, enfrentar uma ação judicial nos tribunais.

Estes termos de confidencialidade também aparecem em contratos onde empresas contratam consultores externos, uma vez que estes consultores irão manipular dados importantes da empresa.

Outro exemplo que podemos imaginar, é o caso de uma start-up, que está a desenvolver uma ideia e assinam um termo de confidencialidade com seus investidores a fim de proteger sua ideia, seu projeto então em desenvolvimento.

Ainda, o contrato de joint venture pode existir de duas formas, uma associativa e outra societária, ou seja, as empresas podem se unir de forma Societária formando uma nova pessoa jurídica ou unicamente estabelecendo um acordo, de forma associativa para execução de determinados projetos e continuando ambas atuando como pessoa jurídica distinta, neste caso atuam com uma figura chamada consórcio. Isso é comum para o desenvolvimento de grandes projetos de construção civil, como ponte, barragens, e também é uma modalidade muito usada em pesquisas, exploração e produção petrolífera.

e) Vantagens e desvantagens: A união de empresas para desenvolver um projeto tem suas vantagens e desvantagens, pois estas parcerias oferecem muitas oportunidades e riscos, e o sucesso deste negócio vai depender em grande parte deste contrato joint venture.

Muitas empresas são beneficiadas em termos de expansão, pois podem ingressar em novos negócios e atingir novos mercados principalmente em outros países, como por exemplo, é o que acontece na China, pois para desenvolvimento de alguns modelos de negócios por empresas estrangeiras, estas devem se associar a empresas chinesas a fim de conseguir atuar em alguns setores do mercado.

Uma das vantagens jurídica da forma associativa é a limitação de poder do co- venture, ou seja, cada empresa é responsável por si, e no caso de falência, cada uma responde isoladamente pela sua pessoa jurídica.
Outra vantagem neste modelo de negócio diz respeito a divisão de responsabilidade, pois cada empresa tem sua responsabilidade dentro do projeto, o que faz, de certa forma diminuir os riscos do negócio. Contudo, haja vista que cada participante investe com recursos necessário para o desenvolvimento do projeto, isso contribuiu, de certa forma, para diminuir os riscos dos investimentos.

Para as pequenas empresas, a modalidade joint venture lhes beneficia, pois apresenta-se como uma chance de atuar de uma forma conjunta para superar barreiras comerciais, de novos mercados ou para competir de forma mais eficiente.

Necessário se faz mencionar também que a joint venture oferece a oportunidade de diferentes empresas aprenderem umas com as outras, ultrapassando os desafios de forma mais eficiente e competindo no mercado com mais competência.

Ainda, quando falamos em vantagens nas joint ventures, devemos mencionar também sobre o investimento inicial. Nos projetos desta natureza, o capital inicial para investimento das empresas é menor em comparado em executar o projeto sozinha, pois associação é benéfica, e muitas vezes uma empresa tem tecnologia de ponta, e a outra tem know-how e mão-de-obra disponível, isso favorece ambas para o desenvolvimento do produto, ou do negócio de forma geral. Um exemplo deste modelo de negócio foi a joint venture firmado, em 2001, entre a empresa japonesa Sony que tem expertise na produção de câmara fotográfica e a sueca Ericsson especialista na produção de celulares.

Outro exemplo de joint venture, ocorreu em 2017, entre duas grandes empresas conhecidas internacionalmente, empresa Unilever Myanmar, com suas cadeias de suprimentos e marketing, e a Europe & Asia Commercial Company (EAC) com seu conhecimento local, fabricação e distribuição de produtos. Neste projeto, o objetivo é desenvolver o comércio em Mianmar, Ásia-Pacifico (APAC).

Outro caso, historicamente mais significativos de joint ventures, ocorreu nos Estados Unidos em 1889, é o caso da “Terminal Railroad Association of Faint Louls”, envolvendo 15 (quinze) empresas que atuavam no ramo de ferrovias, cujo objetivo era prover e manter os equipamentos daquele importante entroncamento de estradas de ferro.
No Brasil, temos vários exemplos de empresas que fizeram uma joint venture, a maior delas é a empresa BRF – Brasil Foods (empresa de produtos alimentícios) que no ano de 2012, associou-se a empresa chinesa DCH - Dah Chong Hong Holding Limited com o objetivo de distribuir no mercado chinês produtos alimentícios in natura e processados e desenvolver a marca Sadia na China.

Outro exemplo de joint venture no ramo de alimentação temos a Perdigão que garantiu sua eficiência em logística, compreendendo o armazenamento, distribuição e vendas, firmando contrato com a Unilever que disponibilizou equipamentos e mão-de-obra.

Mais um exemplo, temos a Autolatina, que promoveu uma cooperação econômica entre a Volksvagem e a Ford entre 1987 e 1997, e nesta cooperação foi realizado o compartilhamento dos custos de montagem, produção e comercialização, além de parcerias voltadas para o fortalecimento de ambas as marcas no país.

Existem várias empresas de diversos setores na economia que investem neste tipo de união, e as maiores joint ventures no mundo acontecem nos ramos de alimentação, tecnologia e automobilismo.

Quanto às desvantagens, podemos apontar o desequilíbrio de muitas empresas no decorrer do projeto, muitas vezes pela demora na chegada dos lucros, pelo aumento do grau de dificuldade encontrada na execução do projeto, e muitas outras vezes pelos conflitos enfrentados na gestão dos investimentos, o que pode desgastar muito a relação entre os participantes.

Ainda, a ocorrência de conflito ocorrerá, quando qualquer das partes tenta alterar o equilíbrio contratual, ou seja, a dinâmica de repartição dos riscos e do capital, de modo a atrair pra si o máximo de vantagens a custo da outra parte.

E, a fim de diminuir estes riscos, muitas empresas desenvolvem metodologias de análise de execução do projeto de forma permanente e adotam consultorias profissional independente para manter a qualidade do produto, a satisfação do cliente, tudo de acordo com a natureza da joint venture, tudo com o objetivo de proteger seus investimentos.

 

Referências Bibliográficas

Pinheiro, Luís de Lima – Contrato de Empreendimento Comum. Edições Cosmos. Lisboa, 1998.

BAIN & COMPANY E TOZZINI FREIRE ADVOGADOS. Relatório I – Regimes jurídico-regulatórios e contratuais de E&P de petróleo e gás natural.