Ao se analisar o modus operandi da organização criminosa e do crime institucionalizado, uma grande semelhança pode ser observada: em ambos os casos são realizadas diversas ações com o objetivo de se obter algum tipo de vantagem e, por isso, esses dois delitos podem ser confundidos.
A principal diferença entre eles está relacionada com à legalidade/ilegalidade das ações realizadas: estão presentes do crime organizado ações marginais e atividades ilegais, como o tráfico de drogas, por exemplo. Por outro lado, no crime institucionalizado ocorrem atividades lícitas, que geram resultados ilícitos, podendo ser citada a prestação de certo tipo de serviço por uma empresa (ato lícito), porém com o contrato superfaturado (ato ilícito).
Outra diferença que pode ser destacada é o poder de nomeação dos partícipes. Nas organizações criminosas, por exemplo, um indivíduo infiltra-se em alguma unidade para coletar dados e informações, repassando-os aos outros membros da organização. Já no crime institucionalizado, os cargos que apresentam certo poder de influência são ocupados por autoridades que, premeditadamente, atuarão em benefício próprio e/ou de terceiros.
Observa-se, no primeiro caso, a presença de atividade ilícita no momento em que o sujeito finge ser algo que não é, visando obter ciência de elementos necessários à execução da prática criminosa. No segundo caso, o agente é legalmente instituído para ocupar determinado cargo e, a partir dali, começa a agir de maneira diversa da apropriada, com intuito de favorecimento pessoal e de terceiros.
Cabe destacar, ainda, que nas organizações criminosas existe violência e ameaça contra quem o crime está sendo cometido. Em contrapartida, no crime institucionalizado, existem projetos de leis que visam intimidar aqueles que criam qualquer tipo de empecilho e que não colaboram para o sucesso da atividade – ressalta-se, mais uma vez, que na elaboração das leis é observada uma atividade lícita, porém, com finalidade danosa.
Diante disso, verifica-se que a principal diferença entre esses dois institutos é que as organizações criminosas estão conectadas diretamente a atividades ilegais, enquanto o crime institucionalizado está entranhado às esferas da lei.
O crime institucionalizado está enraizado em nosso poder público, onde aqueles que detêm o poder de indicação de cargos são capazes de propor, discutir e aprovar leis, criando um instrumento facilitador de proteção dos recursos por eles desviados, sendo capazes, com isso, de ditar as regras e controlar toda a organização dessa atividade criminosa, através da corrupção. Nas palavras de Luís Roberto Barroso:
A corrupção no Brasil não foi produto de falhas individuais ou pequenas fraquezas humanas. O que se viu foi uma corrupção estrutural e sistêmica, com um espantoso arco de alianças que incluiu empresas privadas, estatais, empresários, servidores públicos, partidos políticos (de todas as cores), membros do Executivo e do Legislativo. Foram esquemas profissionais de arrecadação e de distribuição de dinheiro público desviado.
[...]
A corrupção generalizada, no topo da pirâmide política, foi produto de um pacto oligárquico celebrado por parte da classe política, parte da classe empresarial e parte da burocracia estatal para saque do Estado e, em última análise, da sociedade e do povo. O Estado brasileiro é um Estado apropriado indevidamente.
(BARROSO; ANSELMO; PONTES, 2019, p.10)
A concentração e o aprimoramento do combate à corrupção seriam instrumentos essenciais para que a dimensão da punibilidade e da criminalidade institucionalizada fosse alastrada e diminuísse o sentimento de impunidade, muito presente em nossa sociedade, tendo em vista o baixo índice de agentes efetivamente condenados e que tenham executados a pena por esse crime.
A dificuldade no enfrentamento dessa prática encontra-se no fato de que esse sistema criminoso é o responsável pela nomeação de pessoas com diversas atribuições que permitem, por exemplo, a interferência na regulamentação do trabalho da polícia investigativa e na nomeação dos que integrarão os órgãos julgadores. Ou seja, de nada adianta haver um esforço para perpetrar investigações e chegar a possíveis culpados sendo que quem irá julgá-los não o fará com a imparcialidade necessária, pelo motivo de julgado e julgador estarem juntos nesse meio.
Diante de tudo que foi discutido no presente trabalho, é possível concluir que o crime institucionalizado é caracterizado por ser uma atividade mais segura e mais lucrativa do que qualquer outra atividade ilegal, pois é praticado por autoridades que utilizam seus cargos para o cometimento de tais delitos, criando-se uma rede de proteção entre todos os envolvidos. Soma-se a isso, o alto índice de impunidade, que dá força ao cometimento desse crime, cada vez mais presente no cotidiano do nosso país.
Referência:
ANSELMO, Márcio; PONTES, Jorge. Crime.gov: quando corrupção e governo se misturam. Rio de Janeiro: Objetiva, 2019.