Dos 50 primeiros municípios listados como referência pelo Instituto Trata Brasil, o Estado do Espírito Santo aparece apenas uma vez, na quadragésima primeira colocação, sendo este o Município de Vitória. A Companhia Espírito Santense de Saneamento (CESAN), é uma empresa de economia mista que apresenta regime jurídico de direito privado como Sociedade Anônima. Logo, cabe informar que neste regime, a privatização ocorre apenas quando a maior parte das ações são transferidas permanentemente à iniciativa privada, sendo certo que, até o presente momento, as ações majoritárias da CESAN são de propriedade do Governo do Estado.
Com o novo Marco do saneamento básico assinado pelo Presidente Lula, fica determinado que não há mais o limite de 25% para a participação de Parceria Público-Privada nas concessões de saneamento, o que significa que uma estatal, como a CESAN, estaria autorizada a repassar ao setor privado uma maior parcela do serviço, cabendo ainda o repasse de sua totalidade. De acordo com a Lei 11.079/2004 (citação), o conceito de Parceria Público- Privada (PPP) pode ser entendido com um contrato de vigência consideravelmente longo realizado entre um ente público e uma parte privada visando o desenvolvimento e/ou gestão de bem ou serviço público, que tem como principais características a “ênfase na provisão dos serviços (como objetivo principal) e significativa transferência dos riscos ao setor privado” no decorrer da vida deste contrato (FRANCO, 2007, p. 20).
Assim, apesar de ocupar a 41ª posição, o que chama atenção para este município são dois principais pontos, o primeiro é na melhora de 12 posições no ranking, já que em 2022 o município ocupava o 53º lugar, e o segundo, é o de que apesar de ter sido autorizado um novo estudo para a mudança no modelo de concessão pela Prefeitura de Vitória, o Tribunal de Contas do Espírito Santo impediu o prosseguimento da ação sob justificativa de que a Lei Estadual nº 6.871/2001 evidencia que a CESAN deve ser a “única e exclusiva prestadora dos serviços de saneamento básico no âmbito da Região Metropolitana da Grande Vitória”, por um período de 50 anos, conforme a Lei Complementar nº 325, de 2005 (POLITÉCNICA UFRJ).
Sendo assim, atualmente, é possível afirmar que mesmo com as experiências positivas em relação ao desenvolvimento do setor de saneamento sob gestão de uma empresa pública, a Companhia Estadual de Saneamento já apresenta três contratos de parcerias público-privada (PPPs) assinados, nos Municípios de Cariacica, Serra e Vila Velha, havendo previsão de que novos contratos com PPPs ocorram em Vitória e nas outras 43 cidades (FILHO, 2023). Logo, diante da tendência de desestatização no estado, nos resta abordar a experiência de Cachoeiro de Itapemirim, o quinto município mais populoso do estado.
Em meados de 1990, a mudança no modelo de gestão, que contextualizava diversos estados brasileiros, se revelava pela forte pressão dos poderes legislativo e executivo dentro dos Municípios, de modo que houve grande estímulo para a privatização dos bens públicos no país, cujo principal instrumento de coação se deu com a restrição no acesso aos financiamentos, que, teve por consequência da falta de investimentos no setor a insatisfação dos usuários com a qualidade dos serviços prestados pelo antigo Serviço Autônomo de Água e Esgotos (SAAE). Desta forma, não houve debate quanto ao processo de desestatização, tendo em vista que não havia opções a esta alternativa (OLIVEIRA; REZENDE; HELLER, 2011, p. 399).
Dentre as experiências desfavoráveis, é possível citar o aumento das tarifas cobradas aos usuários, o não funcionamento, como havia sido previsto do Conselho Municipal de Saneamento, das audiências públicas, principalmente no que se refere à divulgação dos canais de participação à população, instituídos pela Prefeitura e Concessionária que permanecem pouco conhecidos e utilizados, ou ainda, a presença de uma Agência Reguladora que, apesar de possuir autonomia financeira para funcionar, se apresenta sob influência política, visto que a ocupação de cargos da diretoria é feita por pessoas nomeadas pela Prefeitura, que frequentemente se posicionam a favor desta ou da Concessionária quando divergentes dos interesses da população.
Atenta-se que o caso remete ao ocorrido em Berlim, cujos dirigentes foram nomeados de acordo com os interesses da iniciativa privada, confrontando a ideia de que a gestão dos serviços quando realizados pelo setor público ficam submetidos às influências políticas, enquanto supostamente as ações da iniciativa privada ganham maior autonomia. Pois, conforme ambos os casos evidenciam, há possibilidade de que ações convenientes à manutenção dos operadores privados também sofram influências. Ainda, é possível citar o desencontro entre as Instituições que não determinam os responsáveis pelas demandas de seus usuários que, usualmente, se esquivam de tal função, ao passo em que disputam entre si pela mesma atribuição ou pela divisão dos recursos financeiros disponíveis. Em suma, há grande carência de ações integradas entre os níveis de governo, a Agência Reguladora e a Empresa
Concessionária (OLIVEIRA; REZENDE; HELLER, 2011, p. 397). Por outro lado, parte da população descreve grande melhoria na qualidade dos serviços prestados após a desestatização apontando que ante à precariedade do período em que a antecedeu, comparados aos investimentos realizados com recursos públicos subsidiados, a melhoria foi clara. Neste sentido, cabe retratar que houve preferência da Concessionária pelos serviços de abastecimento de água em detrimento do esgotamento sanitário, assim como também permaneceu notória a preferência à prioridade dada às áreas mais desenvolvidas e centrais da cidade justificadas pelo maior retorno financeiro. Assim, as periferias ocuparam segundo plano enquanto as áreas rurais sequer faziam parte do Contrato de Concessão.
Já em relação aos valores referentes especificamente ao esgotamento sanitário, é possível dizer que houve contestação devido ao fato de que o serviço estava sendo cobrado aos cidadãos, sob respaldo da justiça e da lei municipal sem que o serviço estivesse disponível à população, causando comprometimento no orçamento de inúmeras famílias, em que mesmo após a venda da empresa ocorrida em 2008, não houve pretensão de mudança referente aos aspectos supracitados (OLIVEIRA; REZENDE; HELLER, 2011, p. 397). Observa-se nesse sentido, para além da dissimulação o claro enriquecimento sem causa, que houve promoção do empobrecimento da população em prol dos interesses dos operadores privados sem motivo que ensejasse causa à cobrança, tendo em vista a indisponibilidade dos serviços cobrados, ainda que os operadores tenham agido sob respaldo da justiça.