4. O Processo de Desestatização da CEDAE - Parte I

Em 30 de abril de 2021, ocorreu na B3, uma das principais empresas de infraestrutura de mercado financeiro no mundo, localizada no estado de São Paulo e conhecida como a bolsa de valores do Brasil, o leilão para a concessão da Companhia Estadual de Águas e Esgoto do Rio de Janeiro (CEDAE). Tal Leilão pode ser considerado o maior no setor de infraestrutura de saneamento na história do país devido aos contratos estimados de, aproximadamente, R$30 bilhões em investimento pela iniciativa privada em um prazo de 35 anos de concessão (SILVEIRA, 2021). Cumpre informar que o Leilão foi dividido em 04 blocos, os quais foram separadamente leiloados. O Bloco 01, composto pela Zona Sul da capital e mais 18 municípios, foi arrematado pelo consórcio Aegea com lance de 8,2 bilhões. O Bloco 02, que engloba a Barra da Tijuca, Jacarepaguá e mais 2 municípios, foi arrematado pelo consórcio Iguá com o lance de R$7.286 bilhões. E, por fim, o Bloco 04, composto por 106 bairros do Centro e Zona Norte da capital, bem como sete municípios, recebeu oferta de 3 consórcios, tendo sido arrematado pelo consórcio Aegea com o valor de R$7,2 bilhões (SILVA, 2021). Ressalta-se que o Bloco 03, considerado o menos lucrativo devido à necessidade de grande investimento para as áreas mais pobres e afetadas pela falta de infraestrutura, que englobou na primeira tentativa de Leilão apenas parte da Zona Oeste do Rio e os municípios de Piraí, Rio Claro, Itaguaí, Paracambi, Seropédica e Pinheiral, não recebeu propostas de empresas, mesmo tendo sido exigido a menor outorga mínima do leilão, de aproximadamente, R$ 908 milhões de reais. Após segunda tentativa para arremate do Bloco 03, a empresa Águas do Brasil venceu a empresa Aegea, de modo que o terceiro bloco passou a englobar 20 municípios do estado do Rio, além de parte da Zona Oeste da capital, tendo sido o lance vencedor de R$ 2,2 bilhões, valor significativamente inferior aos demais blocos. (EXTRA, 2021).

Cabe inferir que, com a concessão da CEDAE, os serviços de coleta e tratamento de esgoto e distribuição de água em 21 Municípios, além dos bairros da zona oeste do estado do Rio de Janeiro, passam a ser competência da empresa Águas do Brasil. (GRUPO ÁGUAS DO BRASIL, 2021). Ainda, foi elaborado, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) o Plano de Concessão, no qual há comprometimento formalizado da iniciativa privada para fazer investimentos em melhorias e inovações, assumindo o risco da exploração. Importante salientar que, ao final do prazo de concessão, os ativos retornam para o Estado, podendo novamente ser concedidos à iniciativa privada ou permanecer sob respaldo da Administração Pública. 

Dentre os principais motivos para a concessão da Companhia, é preciso destacar para além dos investimentos no setor, a geração de empregos para a população, a possibilidade de ampliação de acesso à rede de saneamento e a maior eficiência do atendimento à população, sob justificativa de que as empresas quando administradas pelo setor público ficam sujeitas a interferências políticas.

O debate ganhou maior notoriedade após divulgação massiva dos meios de comunicação ao considerar que a Companhia passava por uma crise, popularmente conhecida como a “crise da Geosmina”, nome atribuído à substância responsável pelas alterações de coloração e de gosto, produzida por algas que se reproduzem no esgoto, que chegava às casas e que culminou na intensificação da ideia de uma incapacidade da gestão pública em fornecer serviços de qualidade para o público e que, consequentemente, tais problemas poderiam ser solucionados através da privatização da Companhia (G1, 2021). Ademais, segundo o parecer de Indicação nº 002/2017 de autoria do consórcio Sr. Fernando Máximo de Almeida Pizarro Drummond, Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, a proposta para a concessão seria a de que a privatização da CEDAE ocorresse como contrapartida de auxílio financeiro com intuito de que o Estado do Rio de Janeiro fosse capaz de conseguir atender às suas emergências financeiras. Em outras palavras, trata-se de uma solução imediatista para atender a interesses políticos e econômicos. (INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS, 2017).

Por outro lado, dentre as fundamentações que ensejaram os argumentos contrários à privatização do serviço de saneamento básico, constam a desigualdade de fornecimento e precarização da Zona Oeste, uma das mais pobres do Rio; a previsão do aumento dos preços para os serviços; o saneamento básico como um direito humano e bem comum; a falácia de que a privatização é sinônima a maior eficiência e transparência, além do fato de que tais medidas seguem na contramão do movimento mundial de remunicipalização dos serviços de saneamento.