Fornecimento de Medicamento pelo Poder Público - A Jurisprudência do STJ

STJ
Por Giovanna Fant - 27/04/2024 as 16:32

O direito à saúde é garantido pela Constituição Federal, estando previsto nos artigos 196 a 200, além de integrar o rol de direitos fundamentais sociais, por estar relacionado ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana, compondo, assim, o mínimo existencial. 

Ao analisar os artigos 5º, caput, e 196 da CF/88, o Supremo Tribunal Federal (STF) considera o direito à saúde uma consequência inerente ao direito à vida, assegurado a todos os indivíduos. 

Visando a regulamentação das condições de promoção, proteção e recuperação da saúde e a organização e funcionamento dos serviços correspondentes, a Lei 8.080/90 foi alterada, sendo instituído o Sistema Único de Saúde (SUS), que consiste em um conjunto de ações e serviços de saúde prestados por instituições públicas federais, estaduais e municipais, de administração direta e indireta e de fundações mantidas pelo Poder Público. 

Em relação ao fornecimento de medicamentos, a determinada lei confere a inclusão de assistência integral, estando a farmacêutica inclusa. O ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirma que a concessão ampla de medicamentos pelo Poder Público seja positiva, não deixando de apontar a judicialização excessiva do assunto. 

Na 5ª edição da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename), o Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde reconheceu o direito ao acesso aos medicamentos fundamentais como um eixo norteador das políticas de medicamentos e de assistência farmacêutica. 

O fornecimento de medicamentos deve seguir as normas da Política Nacional de Medicamentos, instituída pela Portaria 3.916/98, observando que todas as pessoas têm direito de receber quaisquer medicamentos que integram a Rename dos órgãos de Poder Público, não havendo a necessidade de contraprestação imediata. 

 

Confira a Jurisprudência em Teses do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema:

 

Fornecimento de Medicamento pelo Poder Público

(Os entendimentos foram extraídos de julgados publicados até 19/03/2021.)

 

1) O Ministério Público tem legitimidade para pleitear tratamentos médicos ou entregas de medicamentos nas demandas de saúde propostas contra os entes federativos, ainda que se trate de feitos contendo beneficiários individualizados, pos se refere a direitos individuais indisponíveis, na forma do art. 1º da Lei n. 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). (Tese julgada sob o rito do art. 1.036 do CPC/2015 - TEMA 766) 

Julgados: 

AgInt no REsp 1647125/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/05/2019, DJe 20/05/2019; 

AgInt no AREsp 1170199/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/10/2018, DJe 10/10/2018.

 

2) Há a possibilidade de submeter ao rito dos Juizados Especiais Federais as causas que envolvem o fornecimento de medicamentos ou tratamentos médicos, em que o valor seja de até 60 salários mínimos, ajuizadas pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública em favor de pessoa determinada. 

Julgados: 

RMS 64517/MT, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2020, DJe 18/12/2020; 

AgInt no REsp 1353165/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/02/2020, DJe 04/03/2020.

 

3) Cabe a atribuição de efeitos erga omnes em decisão de procedência proferida em ação civil pública referente ao fornecimento de medicamentos, sendo de responsabilidade de cada titular do direito o ônus de comprovar o seu enquadramento na hipótese prevista pela sentença. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1569132/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/09/2019, DJe 13/09/2019; 

AgInt no REsp 1658199/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/02/2019, DJe 26/02/2019.

 

4) Não é impositivo o chamamento ao processo da União com base no art. 77, III, do CPC, nas demandas propostas contra os entes federativos responsáveis sobre o fornecimento de medicamentos ou prestação de serviços de saúde, mostrando-se inadequado a oposição de um obstáculo inútil para a garantia fundamental do cidadão à saúde. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 - TEMA 686) 

Julgados: 

AgInt no CC 173185/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 02/03/2021, DJe 05/03/2021; 

AgInt no AgRg no AREsp 692804/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe 28/08/2018.

 

5) É solidária a responsabilidade dos entes federativos nas ações que buscam o fornecimento de medicamentos, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou de forma isolada. 

Julgados:

AgInt no CC 174544/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 16/03/2021, DJe 23/03/2021; 

AgInt no CC 172502/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 02/03/2021, DJe 08/03/2021.

 

6) Ao se tratar de fornecimento de medicamentos, é cabível ao Juiz a adoção de medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo determinar até mesmo o sequestro de valores do devedor (bloqueio), de acordo com o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 - TEMA 84) 

Julgados: 

AgInt no REsp 1551920/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020; 

REsp 1823521/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2019, DJe 29/10/2019.

 

7) Há a possibilidade de concessão da antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública para obrigá-la ao fornecimento de medicamento. 

Julgados: 

AgRg no REsp 1291883/PI, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2013, DJe 01/07/2013; 

AgRg no Ag 1299000/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 10/02/2012.

 

8) Há a possibilidade de imposição de multa diária  a ente público, para compeli-lo ao fornecimento de medicamento à pessoa desprovida de recursos financeiros. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 - TEMA 98). VIDE art. 461, § 4º, do CPC/1973 correspondente ao art. 537 do CPC/2015 

Julgados: 

AgInt no AREsp 1409836/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2020, DJe 17/11/2020; 

AREsp 1579684/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/03/2020, DJe 18/05/2020.

 

9) O valor da multa cominatória cobrada pelo descumprimento da obrigação de fornecer tratamento e medicamentos adequados ao portador de doença grave deve ser revertido em favor do credor independentemente do recebimento de perdas e danos. VIDE art. 461, § 4º, do CPC/1973 correspondente ao art. 537 do CPC/2015 

Julgados: 

AgInt no AREsp 1663064/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 30/11/2020, DJe 02/12/2020; 

AgInt no REsp 1171875/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 05/09/2019.

 

10) Há a possibilidade de reconhecimento do direito de sucessores ao recebimento de multa diária imposta em demandas com o objetivo de efetivação do direito à saúde, uma vez que o valor referido não se reveste da mesma natureza personalíssima que tem a pretensão principal, ao se tratar de crédito patrimonial, logo, transmissível aos herdeiros. VIDE art. 461, § 4º, do CPC/1973 correspondente ao art. 537 do CPC/2015 

Julgados: 

AgInt no REsp 1761086/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/11/2020, DJe 25/11/2020; 

AgInt no AREsp 1139084/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 28/03/2019.

 

Fornecimento de Medicamento pelo Poder Público II

(Os entendimentos foram extraídos de julgados publicados até 16/04/2021.)

 

1) Há a possibilidade do fornecimento de medicamentos não incorporados em atos normativos do Sistema Único de Saúde - SUS através de protocolos clínicos, uma vez que comprovada a imprescindibilidade do tratamento prescrito, nos processos iniciados antes de 4/5/2018. Julgados: 

AgInt no AREsp 1103039/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 29/09/2020; 

AgInt no AREsp 920410/RO, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 29/06/2020, DJe 01/07/2020.

 

2) A concessão dos medicamentos que não integram os atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, mediante laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. (Tese julgada sob o rito do art. 1.036 do CPC/2015 - TEMA 106) 

Modulam-se os efeitos do presente repetitivo de forma que os requisitos acima elencados sejam exigidos de forma cumulativa somente quanto aos processos distribuídos a partir da data da publicação do acórdão embargado, ou seja, 4/5/2018. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1881171/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/02/2021, DJe 09/03/2021; 

AgInt no AREsp 1651435/GO, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/11/2020, DJe 18/11/2020.

 

3) Em ações em que se busca o fornecimento de medicamentos, a escolha do fármaco cabe ao médico habilitado e conhecedor do quadro clínico do paciente, podendo ser um profissional particular ou de rede pública. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1373566/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe 27/08/2020; 

EDcl no REsp 1801213/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/12/2019, DJe 20/08/2020.

 

4) A substituição ou complementação do medicamento pleiteado na inicial não configura inovação do pedido ou da causa de pedir, apenas mera adequação do tratamento para a cura da enfermidade do paciente. 

Julgados: 

AgInt no RMS 47529/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/06/2019, DJe 25/06/2019; 

AgInt no REsp 1706278/MG, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/05/2019, DJe 24/05/2019.

 

5) A decisão que determina ao Estado o fornecimento de medicamento especificado na inicial não incorre em condenação genérica, tal como de outros que se mostrem necessários no decorrer do tratamento da doença objeto da ação, uma vez que seja devidamente comprovada a necessidade. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1868760/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/09/2020, DJe 01/10/2020; 

AgInt no REsp 1841230/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 29/06/2020, DJe 01/07/2020.

 

6) Não existe julgamento extra petita no reconhecimento do direito de receber o medicamento reivindicado conforme prescrito, sendo considerada a necessidade de apresentação de receita médica como forma de fiscalização, sobretudo em se tratando de sentença sujeita a reexame necessário. 

Julgados: 

AgRg no AREsp 295706/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 20/05/2013; 

AgRg no AREsp 85191/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/02/2012, DJe 23/02/2012.

 

7) Não há ofensa à coisa julgada quando o autor pleiteia a substituição ou o complemento de medicamento diverso do requerido na petição inicial, uma vez que relativo à mesma enfermidade, para fins de mera adequação do tratamento, em atenção aos princípios da celeridade processual e da instrumentalidade das formas. 

Julgados: 

REsp 1795761/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/05/2019, DJe 30/05/2019; 

REsp 1888557/PR (decisão monocrática), Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2020, publicado em 12/11/2020. 

 

8) Os honorários sucumbenciais podem ser arbitrados por apreciação equitativa, nas ações em que se busca o fornecimento de medicamentos de forma gratuita, considerando que o proveito econômico, em regra, é inestimável. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1881171/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/02/2021, DJe 09/03/2021; 

AgInt no REsp 1886469/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/02/2021, DJe 01/03/2021.

 

9) Quando extinta a demanda que objetivava o fornecimento de medicamentos, sem resolução do mérito, devido ao falecimento da parte autora, o ente estatal deve responder pelo pagamento das verbas sucumbenciais, seguindo o princípio da causalidade. 

Julgados: 

AgInt no REsp 1810465/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/06/2020, DJe 17/06/2020; 

AgInt no AREsp 1236461/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2018, DJe 11/09/2018.

 

10) A solidariedade reconhecida em um dos pedidos não se estende aos ônus da sucumbência, em ações em que se busca o fornecimento de medicamentos, porque a regra da proporcionalidade por despesas e honorários somente será afastada quando decidida expressamente na sentença. VIDE art. 23 do CPC/1973 correspondente ao art. 87 do CPC/2015 

Julgados: 

AgRg no REsp 1182529/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 10/02/2012; 

REsp 1214824/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/11/2010, DJe 01/12/2010.