Compliance e o Acordo de leniência

Por Júlia Brites - 09/04/2024 as 16:48

O que é acordo de leniência? 

O acordo de leniência está previsto na Lei Anticorrupção (Lei no 12.846/2013) que prevê a possibilidade da autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública firmar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos na Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte: 

- a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber; e 

- a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração. 

No entanto, para o acordo ser celebrado, a pessoa jurídica precisa preencher, cumulativamente, alguns requisitos, quais sejam: 

- deve ser a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito; 

- deve cessar completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo e 

- deve admitir a sua participação no ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.

Quais os benefícios do acordo de leniência? 

De acordo com a lei, a celebração do acordo de leniência reduzirá em até 2/3 (dois terços) o valor da multa aplicável e isentará a pessoa jurídica das sanções previstas no inciso II do art. 6o e no inciso IV do art. 19 da lei, conforme segue: 

Art. 6o Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes sanções: (...) II - publicação extraordinária da decisão condenatória. 

Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5o desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras: (...) IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos. 

Segundo a lei, os efeitos do acordo de leniência serão estendidos às pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo econômico, de fato e de direito, desde que firmem o acordo em conjunto, respeitadas as condições nele estabelecidas. Importante observar que o acordo não traz isenção à pessoa física. 

Importante destacar que o acordo de leniência não exime a pessoa jurídica da obrigação de reparar integralmente o dano causado. 

O que acontece em caso de descumprimento do acordo? 

A pessoa jurídica ficará impedida de celebrar novo acordo pelo prazo de 3 (três) anos contados do conhecimento pela administração pública do referido descumprimento, segundo dispõe §8o do artigo 16 da Lei. 

Quem celebra o acordo? 

De acordo com a lei, a Controladoria-Geral da União - CGU é o órgão competente para celebrar os acordos de leniência no âmbito do Poder Executivo federal, bem como no caso de atos lesivos praticados contra a administração pública estrangeira. 

Ainda, a administração pública poderá também celebrar acordo de leniência com a pessoa jurídica responsável pela prática de ilícitos previstos na Lei no 8.666/93 (Lei de Licitações). 

Acordo de leniência, segundo o MPF 

Foi elaborado um guia prático de acordos de leniência pela 5a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, responsável por homologar os acordos de leniência firmados pelo MPF envolvendo casos de corrupção, com o objetivo de auxiliar os membros do MPF quando procurados por empresas que desejem colaborar com as investigações de improbidade administrativa. 

O documento destaca a definição do acordo de leniência, qual seja: “é um mecanismo de combate à corrupção que tem surtido diversos resultados positivos para o país. E o Ministério Público Federal (MPF) é um dos protagonistas em sua implementação. Já foram negociados pelo Órgão vinte e nove acordos de leniência, que contribuíram para o desmonte de diversas redes de corrupção. Os casos mais emblemáticos são no âmbito da Força-Tarefa Lava Jato (FT-LJ). Foram, até então, firmados treze acordos de leniência, sem os quais seria impossível a FT-LJ obter êxito nas investigações”. 

Ainda, o guia traz como objetivo do acordo de leniência a imposição de compromisso e responsabilidade às pessoas jurídicas que voluntariamente se propõem a romper com o envolvimento com a prática ilícita e a adoção de medidas para manter suas atividades de forma ética e sustentável, em cumprimento à sua função social. 

Para mais informações sobre o guia, segue o link: http://midia.pgr.mpf.mp.br/5ccr/acordos- leniencia/ 

Entendimento do Supremo Tribunal Federal 

Uma vez firmado o acordo, as empresas apresentam dados que demonstram a prática dos atos ilícitos e representam verdadeiras provas para a possível instauração de um inquérito para a apuração da responsabilização penal dos autores dos delitos que não firmaram o acordo com o Poder Público. 

Ao firmar o acordo com a pessoa jurídica, a mesma apresenta informações e dados que demonstram a prática de atos ilícitos, sendo consideradas provas pertinentes para a instauração de inquérito com a finalidade de apurar a responsabilidade penal dos autores dos ilícitos que não firmaram acordo com o Poder Público. 

Diante da polêmica da questão, o STF analisou e concluiu o seguinte: 

“Todavia, não há óbice ao compartilhamento das provas, desde que o pedido se mostre adequadamente delimitado e justificado, na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) (Pet 6.8457.463), observadas cautelas especiais quando se tratar de colaboração premiada e acordo de leniência. Dessa forma, é legítimo o compartilhamento com o fim de instrução de inquérito que investiga pessoa a qual não celebrou acordo de leniência, desde que não acarrete eventual prejuízo aos aderentes do instrumento”. 

Ainda, a 2a Turma do STF afirmou que, no acordo de leniência em questão, o Ministério Público Federal (MPF) se compromete a não propor, contra os aderentes, qualquer ação de natureza cível ou penal em relação aos fatos e condutas nele revelados. 

Relação com o Compliance 

Compliance é estar em conformidade com um conjunto de regras que uma empresa estabelece para seus funcionários, visando o respeito às normas, às regras criadas, bem como aos próprios valores da empresa, como a ética e o combate à corrupção. 

Os programas de compliance e os acordos de leniência têm em comum o objetivo de combate à corrupção, aos atos ilícitos e às más práticas de conduta por parte das pessoas jurídicas, fazendo com que estas tenham, futuramente, honra com os compromissos de sua função social, obtendo, assim, uma boa relação com o Estado e perante a sociedade.