Compliance nas empresas: elaboração de Códigos, Políticas e Canal de Denúncias

Por Thaís Netto - 09/04/2024 as 14:35

A implantação de programas ou sistemas de compliance auxilia a empresa a desempenhar suas funções em conformidade com as normas e os regulamentos. Neste artigo pretende-se dispor sobre o compliance, a elaboração de Código de Conduta, as políticas e os canais de denúncias nas empresas. 

Compliance

Compliance significa cumprir, concordar e agir de acordo. O termo compliance surgiu nos EUA, na década de 1950, com o objetivo de prevenir delitos econômicos e empresariais e, posteriormente, na década de 1980 expandiu-se para outras atividades financeiras. Em 1990 várias organizações públicas e privadas passaram a adotar os processos de conformidade.

No Brasil o compliance começou a ser adotado no final da década de 1990. Salienta-se que a temática ganhou notoriedade com a Lei Anticorrupção - Lei nº 12.846 de 2013, que foi regulamentada pelo Decreto nº 8.420 de 2015. 

Pode-se dizer que os programas de compliance são importantes não apenas para que a organização respeite a legislação, mas para auxiliar a alta administração na sua responsabilidade de observar as regulações,  na execução de estratégias e na tomada de decisões. 

Segundo a Procuradora Regional da República e Doutora em Direito Carla Veríssimo de Carli (2017), para que o programa de compliance possa contribuir para que a empresa esteja em conformidade com a legislação e repercutir de forma favorável na responsabilização da pessoa jurídica e das pessoas físicas, ele deve ser efetivo. 

Conforme indicado pela Procuradora Carla Veríssimo (2017), no Brasil, a Portaria Conjunta da CGU e do Ministério da Micro e Pequena Empresa nº 2279 de 2015 determina medidas de integridade mais simples, com menor rigor formal, que indiquem o comprometimento com a ética e com a integridade, na condução das atividades das micro e pequenas empresas. A medida faz sentido, tendo em vista que não é necessário exigir estruturas complexas em tais casos. 

Dessa forma, o programa deve ser desenvolvido pela empresa. Para tanto, deve-se montar um plano de ação levando em consideração fatores como o tamanho da empresa, o porte da operação, a área de atuação e os riscos relacionados com a natureza da atividade. Outrossim,  deve-se criar um Código de Conduta, estabelecer canais de comunicação, capacitar os colaboradores, monitorar o funcionamento, realizar atualizações e correções quando necessário.

Políticas institucionais e Código de Ética ou Código de Conduta

As políticas institucionais e os códigos de conduta ou códigos de ética constituem os documentos essenciais de um programa de integridade, já que representam importantes instrumentos de gestão e de controle de riscos, estabelecem regras e procedimentos internos, formas de atuação dos departamentos, formas de relacionamento, entre outros (OAB-DF, 2018). 

As políticas institucionais objetivam formalizar a postura da organização, englobando os parâmetros em que devem ser desenvolvidas as ações da empresa e de seus colaboradores. Ressalta-se que as políticas institucionais devem ser coerentes com os valores éticos compartilhados. 

O Programa de Integridade se refere ao conjunto de mecanismos e de procedimentos internos de integridade, de auditoria e de incentivo à denúncia de irregularidades e aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com o intuito de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades contra a administração pública nacional ou estrangeira, nos termos do artigo 41, do Decreto nº 8.420 de 2015. 

Conforme indicado no artigo 42 e Incisos, do Decreto nº 8.420 de 2015, o programa de integridade será avaliado com relação a sua existência e aplicação, com base nos parâmetros de comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, nos padrões de conduta e códigos de ética, nos treinamentos periódicos, na análise periódica de riscos, nos registros contábeis que reflitam de maneira completa e precisa as transações da pessoa jurídica, nos canais de denúncia de irregularidades, na transparência da pessoa jurídica com relação a doações para candidatos e partidos políticos, entre outros. 

O Estatuto das Empresas Estatais - Lei nº 13.303 de 2016 - faz referência no artigo 9º, II, §1º e incisos, ao compliance e aos Programas de Integridade. Com base na disposição indicada, deve ser elaborado e divulgado pelas empresas estatais o Código de Conduta e Integridade, que contenha os princípios, a missão e os valores dessas organizações, assim como orientações com relação à prevenção de conflito de interesses e vedação de atos de corrupção e fraude. 

Para que o programa de compliance seja estruturado adequadamente, deve-se desenvolver e identificar padrões de conduta, bem como, deve-se estabelecer políticas e procedimentos, para promover o seu cumprimento. 

Segundo os professores Lélio Lauretti e Adriaan de Andrade Solé (2019), os princípios éticos e as normas de conduta são a integridade, os compromissos com a empresa, os compromissos da empresa, a equidade, a prestação de contas, a transparência, o respeito pela concorrência, a sustentabilidade ambiental, a responsabilidade social, a solidariedade, a valorização do capital humano, os relacionamentos construtivos e a liderança responsável.

A elaboração de Código de Conduta tem sido considerada vantajosa para a empresa, uma vez que melhora a imagem institucional, padroniza os relacionamentos, auxilia na percepção de desvios dentro da empresa, além de trazer mais segurança, diante de situações de conflito. 

A finalidade do Código indicado é formalizar as exigências das instituições que deverão ser seguidas pelos funcionários ao desempenharem suas funções. Dessa forma, todos os membros da instituição devem conhecer o Código de Conduta, bem como, as normas e regulamentações a que estão sujeitos. 

O Código de Conduta pretende assegurar a padronização na forma de encaminhar questões; indicar critérios para nortear a atuação dos profissionais de acordo com os preceitos éticos; melhorar a integração entre os colaboradores da organização; garantir a sustentabilidade da empresa; proporcionar um bom ambiente de trabalho que, por sua vez, interferirá de forma positiva na qualidade da produção, nos bons rendimentos e na lucratividade. 

Após a elaboração desses Códigos é fundamental que existam treinamentos com os funcionários da empresa, que devem se comprometer a respeitar as normas e os padrões de conduta da empresa. Deve ficar claro para os colaboradores como é importante seguir o Código e as normas da empresa. 

Para tanto, a equipe responsável por firmar esse compromisso pode elaborar cartilhas e guias sobre compliance, com o intuito de conscientizar os funcionários; expor de forma didática experiências bem-sucedidas de compliance, entre outros. 

Canal de Denúncia e elementos da denúncia 

O Programa de Integridade deve prevenir irregularidades. Entretanto, é impossível garantir que, mesmo após a implementação do programa, não aconteça nenhuma irregularidade na empresa.

Dessa forma, para que as eventuais ocorrências de irregularidades sejam encaminhadas ao conhecimento da organização, é importante que seja criado um Canal de Denúncias, acessível aos colaboradores, aos fornecedores e aos parceiros. Destaca-se que deve ser garantida a privacidade e anonimato caso o denunciante deseje. 

A Lei Anticorrupção não trata de maneira expressa dos Canais de Denúncia, mas pode ser considerada o marco inicial legislativo desses canais. No artigo 42, X, do Decreto nº 8.420 de 2015 é delimitado que os canais de denúncia de irregularidades devem ser abertos e divulgados de maneira ampla aos funcionários e terceiros e devem possuir mecanismos destinados a proteger denunciantes de boa-fé. 

Os exemplos práticos de canais de denúncia são o Canal de Denúncias e as Ouvidorias. De acordo com a cartilha da OAB-DF (2018), o Canal de Denúncias poderá ser implantado de diversas maneiras: por telefone; por sites; por e-mails; por caixas de sugestões, de denúncias e reclamações que deverão estar presentes em diversos ambientes da empresa ou podem ser combinados esses modelos. 

Conforme indicado pelos Advogados e Consultores Tiago Cripa Alvim e André Castro Carvalho (2020) para que a denúncia seja considerada uma “boa” denúncia deve preencher os requisitos de qualidade: verossimilhança e nível adequado de informações. O denunciante deve saber o suficiente sobre o assunto e estar disposto a informar o que sabe. A denúncia pode ser anônima.

De acordo com Alvim e Carvalho (2020) os elementos da denúncia ou quesitos são: “o que está sendo fraudado ou corrompido?; quem é ou quem são os fraudadores e corruptos?; por qual motivo está se realizando a fraude ou corrupção, qual o seu propósito?; em qual área da organização ou âmbito geográfico está ocorrendo a fraude?; em que momento a fraude ocorreu ou está ocorrendo? em que data, mês, ano?; qual a forma de atuação dos fraudadores e corruptos, como eles executam a fraude?; quais os montantes envolvidos? é possível estimá-los?”. 

No contexto de compliance não há obrigatoriedade legal para a denúncia. A regra é a de liberdade de denúncia. Contudo, o canal de denúncia ou linha ética é um elemento importante na comunicação e treinamento corporativo em compliance. Segundo Alvim e Carvalho (2020) a denúncia é a principal maneira de recebimento das informações de fraude. 

Salienta-se que com a criação da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD a política de compliance já implementada nas empresas deverá ser atualizada. A LGPD objetiva resguardar a privacidade, a liberdade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. Assim, a gestão do canal de denúncias deve buscar garantir a privacidade no tratamento dos dados, na condução da apuração, no compartilhamento das informações com as autoridades, entre outros. 

Além disso, os programas de integridade devem ser adequados para evitar que ocorra vazamentos de dados e uso inadequado de informações. Cumpre informar que a lei indicada prevê tratamento especial para os dados sensíveis, sendo assim, a organização deve elaborar uma política própria de proteção de dados pessoais, integrando todos os setores da organização que realizarem o tratamento de informações e de dados. 

Diante do exposto, percebe-se a importância da implementação de programas de compliance na empresa, bem como, da criação de Canais de Denúncia. Conforme delimitado os programas de integridade ou compliance não conseguem garantir que não ocorra nenhum desvio ou fraude. 

Assim, torna-se necessário e fundamental que sejam criados Canais de Denúncia para que os ilícitos, que por ventura venham a ocorrer cheguem ao conhecimento da alta direção. Percebe-se ainda, a necessidade de atualização dos programas e canais já existentes e dos que futuramente forem criados de acordo com os fundamentos da LGPD. 

Referências: 

ALVIM, Tiago Cripa.; CARVALHO, André Castro. Funcionamento da linha ética. In: CARVALHO, André Castro.; BERTOCCELLI, Rodrigo de Pinho.; ALVIM, Tiago Cripa.; VENTURINI, Otavio. Manual de Compliance. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

LAURETTI, Lélio.; SOLÉ, Adriana de Andrade. Código de Conduta: evolução, essência e elaboração - a ponte entre a ética e a organização. Belo Horizonte: Fórum, 2019. 

OAB/DF. Programa de Integridade em organizações do Terceiro Setor: manual de compliance. Brasília, 2018. 

VERÍSSIMO, Carla. Compliance: incentivo à adoção de medidas anticorrupção. São Paulo: Saraiva, 2017.