Formas de Partilha de Bens no Inventário

O que é Partilha?

No procedimento de inventário, sendo ele feito judicialmente ou de forma extrajudicial, após a determinação de todo o patrimônio e das dívidas do de cujus, da apuração de seus herdeiros e eventuais credores, da avaliação dos bens e do cálculo do imposto, dá-se início à fase de partilha do patrimônio.

A partilha de bens é o ato de divisão do acervo hereditário entre os herdeiros e legatários, de modo a conferir-lhes seus respectivos quinhões (Rosa e Rodrigues, 2021, p. 483). O Código Civil, em seu art. 1.784, preconiza que a herança é transmitida aos herdeiros no momento do óbito, dessa forma, pode-se afirmar que a partilha é apenas declaratória dos direitos dos herdeiros, e não atributiva desses direitos (Oliveira e Amorim, 2016, p.399), o que não retira a importância do ato, tendo em vista a necessidade de transmissão da titularidade dos bens determinados que, até então, faziam parte de um todo unitário, a cada herdeiro individualmente.

Formas e Espécies de Partilhas

A partilha dos bens deixados por uma pessoa, após a sua morte, pode ser feita tanto utilizando-se a via do Poder Judiciário quanto feita de forma extrajudicial, a depender da situação. Também existem as figuras da sobrepartilha e da partilha parcial. A partir deste momento serão analisadas individualmente cada uma destes institutos.

Partilha Extrajudicial

Quando todos os herdeiros forem capazes e, havendo consenso entre os mesmos (partilha amigável), o Código de Processo Civil (art. 610, §1º) possibilita que o inventário e a partilha de bens ocorra fora do âmbito do Poder Judiciário, por meio de escritura pública, perante o Cartório de Notas. Frisa-se que a opção pela via extrajudicial, nas hipóteses permitidas, é mera faculdade dos herdeiros.

Nesses casos, o próprio documento de escritura pública servirá para qualquer ato de registro e para levantamento de importâncias depositadas em instituições financeiras, não havendo necessidade de homologação judicial (Rosa e Rodrigues, 2021, p. 401). Entre os benefícios dessa forma de partilha encontram-se a celeridade do procedimento, bem como a flexibilidade do local a ser escolhido para a sua celebração, além de evitar possíveis transtornos que um longo processo judicial pode ocasionar, como a divergência na divisão dos bens, além de conflitos entre os próprios familiares.

Destaca-se que o tabelião responsável por lavrar a escritura pública da partilha age com múnus público, atuando com fé pública em suas declarações, cabendo-lhe proceder à análise das condições daquele procedimento e identificar possíveis vícios de vontade, podendo recusar a lavratura da escritura nesses casos.
Em que pese a incidência de emolumentos e custas, caso os herdeiros declarem a impossibilidade de arcar com os referidos custos, poderá ser requerida a gratuidade na lavratura da escritura (Resolução nº 35 do CNJ).

Por fim, outro ponto gerador de dúvidas diz respeito ao testamento, se a sua existência obsta a realização da partilha de bens de forma extrajudicial. Em regra, de acordo com o Código de Processo Civil, essa resposta é positiva, contudo, se no testamento não houver disposições sobre a partilha dos bens, entende a melhor doutrina pela possibilidade da opção pela escritura pública “como forma de dar efetividade ao direito fundamental de acesso à justiça, que representa o direito de acesso à solução justa, mas não uma imposição de que a solução para uma questão ou conflito se dê pelo Judiciário” (Rosa e Rodrigues, 2021, p. 406).

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já proferiu entendimento permitindo a realização da partilha de bens, de forma extrajudicial, ainda que haja testamento com disposições patrimoniais, quando for feito o prévio registro deste testamento judicialmente ou se obtenha autorização judicial para tanto. (RESP 1808767).

Partilha Judicial 

De acordo com o Código Civil, a partilha de bens deverá ser feita pela via do Poder Judiciário quando não houver consenso entre todos os herdeiros a respeito da divisão do patrimônio, bem como quando houver herdeiro incapaz (art. 2.016). Ou seja, ainda que a partilha seja amigável, caso haja herdeiro incapaz será obrigatório o ingresso de ação judicial.

Dispõe o art. 647 do CPC que, após o pagamento de eventuais débitos deixados pelo falecido, o juiz facultará às partes que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, formulem pedido de quinhão e, em seguida, proferirá a decisão de deliberação de partilha, resolvendo os pedidos das partes e designando os bens que devam constituir quinhão de cada herdeiro e legatário. O Código Civil, por sua vez, estabelece que os herdeiros serão legitimados a requerer a partilha, assim como seus cessionários e credores também gozarão de tal faculdade (art. 2.013).

Quando houver consenso entre os herdeiros, a partilha amigável de bens pode ser feita pelo procedimento do arrolamento sumário; por pedido de adjudicação, havendo único herdeiro; e até mesmo dentro dos autos da ação de inventário, em virtude de autocomposição das partes. Não sendo o caso, o CPC, em seu art. 648, prescreveu regras a serem observadas na realização da partilha, sendo estas:

a) a máxima igualdade possível quanto ao valor, à natureza e à qualidade dos bens;
b) a prevenção de litígios;
c) a máxima comodidade dos coerdeiros, do cônjuge ou do companheiro, se for o caso.

Procedida a divisão do patrimônio e cumpridos os demais requisitos necessários, o juiz julgará por sentença a partilha (art. 654, CPC). Em seguida, após o trânsito em julgado da referida decisão, receberá o herdeiro os bens que lhe tocarem, juntamente do formal de partilha.

Pode ser feita partilha em vida?

A partilha em vida, feita por escritura pública ou por meio de testamento, é válida na medida em que não ultrapasse a legítima referente aos herdeiros necessários do falecido. Pode ser feita no formato de doação, por ato entre vivos, bem como por disposição de última vontade, na forma de testamento público, privado ou cerrado. Dessa forma, respeitando a parte pertencente à legítima, na hipótese de existirem herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge/companheiro), no total de 50% do patrimônio arrecadado, o testador ou doador poderá dispor do restante, da forma que lhe competir (art. 1.846 do Código Civil).

Sobrepartilha

Deve ser feita nova partilha, chamada de sobrepartilha, quando na primeira divisão for deixado de fora algum bem pertencente ao acervo hereditário da pessoa falecida. Tais bens podem ter sido alvo de sonegação por algum dos herdeiros ou somente descobertos após a partilha original. Também podem tratar-se de bens litigiosos, assim como os de liquidação difícil ou morosa, e até mesmo dos que forem situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o inventário (art. 669, CPC).

A sobrepartilha poderá ocorrer nos próprios autos em que foi processado o inventário (economia processual) ou por meio de escritura pública, ainda que o inventário tenha sido feito pela via judicial, de forma a prestigiar o direito de obtenção da solução justa para o conflito de interesses (Rosa e Rodrigues, 2021, p. 408).

Pode ser feita partilha parcial?

A doutrina especializada também admite a realização de partilha parcial por meio de escritura pública, nos casos em que não for possível proceder, de plano, à partilha de todo o patrimônio arrecadado, estando os herdeiros de acordo e na hipótese de serem todos capazes. Para tanto, a integralidade do patrimônio será indicada na escritura da partilha parcial, até mesmo a parte dos bens que forem deixados de fora do rateio, mediante justificativa para a não realização da divisão naquele primeiro momento (Rosa e Rodrigues, 2021, p. 408).

Referências

BRASIL. Código de Processo Civil (2015). Código de Processo Civil Brasileiro. Brasília, DF: Senado, 2015.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.

OLIVEIRA, Euclides de; AMORIM, Sebastião. Inventário e partilha: teoria e prática. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

REsp 1808767/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, julgado em 15/10/2019, DJe 03/12/2019.

ROSA, Conrado Paulino da; RODRIGUES, Marco Antônio. Inventário e partilha: teoria e prática. 3. ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2021.