O concubinato esteve presente no Código Civil de 1916, sendo dividido entre duas modalidades: o concubinato puro e o impuro.
Considerava-se o concubinato puro as relações oriundas de pessoas que não possuía nenhum impedimento de casar, conquanto, preferiam não o fazer.
Por sua vez, o concubinato impuro advinha da relação de pessoas que tinham impedimentos, como por exemplo, uma pessoa casada, portanto, não poderia casar novamente.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, o que era considerado concubinato puro recebeu uma nova terminologia, qual seja: união estável.
E o concubinato que antes era considerado “impuro”, passou a ser apenas concubinato e tendo sua seara discutida dentro do direito das obrigações.
Assim, nota-se que a CF/88 trouxe avanços significativos no campo do direito de família, sobretudo no que tange ao conceito de entidade familiar, conforme a redação do §3º do art. 226 da CF/88, o que possibilitou que a união estável fosse tutelada pelo Estado como forma de entidade familiar.
Desta maneira, o Código Civil de 2002, trouxe no seu art. 1.723 a figura da união estável.
Considera-se união estável a convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher que tem como objetivo de constituir família.
Buscando assegurar o direito à igualdade e à liberdade previstos na CF/88, em 2011 o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu à formalização da união estável como entidade familiar, entre casais do mesmo sexo que tinha como objetivo de constituição de família.
Desse modo, para efeitos pessoais e patrimoniais passou a ser considerado união estável as diversas pluralidades de relações de afetos que tem como o intuito a constituição de família, e, não apenas a união estável entre o homem e a mulher como previsto na redação do Código Civil.
Qual a diferença entre o casamento e a união estável?
Com base no disposto pelo Código Civil, o casamento é um instituto civil, formal, solene, regido pela vontade das partes, tendo como base a igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges.
No que tange à sua natureza jurídica, há quem considera o casamento como sendo um negócio jurídico, tal entendimento se dá haja vista à vontade entre as partes, todavia, há também uma interpretação no sentido de ser um ato jurídico, tendo em vista o conjunto de regras estabelecidas pelo legislador.
Ocorre que, para além desses dois entendimentos, há quem julga a natureza jurídica do casamento como mista ou eclética, tal entendimento se dá por causa da complexidade dos seus atos, bem como pelas suas características contratuais e institucionais.
No que concerne a união estável, esta é fundada pela convivência pública, contínua e duradoura, entre casais que têm o afeto e possui a finalidade de constituir família, todavia, despida pela formalidade exigida no instituto do casamento.
Assim, observa-se que para efeitos de união estável é necessário analisar todo o contexto no qual está estabelecida a convivência entre o casal, como por exemplo, a estabilidade, publicidade e continuidade.
E, foi nesse sentido que a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu “que o namoro de dois meses com coabitação de duas semanas não é suficiente para evidenciar a estabilidade de um relacionamento como união estável. ”
Ainda, o Relator o ministro Luiz Felipe Salomão destacou que:
"A união estável tem origem no elo efetivo dos companheiros, sendo ato-fato jurídico que não exige qualquer manifestação ou declaração de vontade para produzir efeitos, bastando-lhe a existência fática para que recaiam sobre ela as normas constitucionais e legais cogentes e supletivas para a conversão da relação fática em jurídica".
Nesse mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF), através da Súmula 382, decidiu que, “a vida em comum sob o mesmo teto, ‘more uxório’, não é indispensável à caracterização do concubinato. ”
Desse modo, para que configure a existência da união estável, não é necessário que o casal more no mesmo teto, ou seja, a coabitação não é um requisito essencial para que se caracterize a convivência, o importante é a presença de todos os fatores dispostos nos artigos 1.723 e 1.724 do Código Civil.
Insta salientar que, diferente do casamento no qual a pessoa altera seu estado civil, como por exemplo, era solteira e passou a ser casada, na união estável não há essa alteração, ou seja, se a pessoa for solteira antes da união estável, após ela continuará sendo solteira.
Faz-se necessário mencionar que, no casamento a figura existente é o cônjuge, contudo, nas relações de união estável as nomenclaturas comumente utilizadas são companheiros e conviventes.
No que concerne ao fim do vínculo entre os companheiros, a Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal (STF), trouxe a possibilidade da dissolução de união estável, conforme in verbis:
“Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”
Portanto, a união estável pode ser dissolvida pelas vontades das partes, ou também pode ser convertida em casamento, conforme descrito no art. 8º da Lei 9.278/96, que:
“Os conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio.”
Quais os requisitos para o reconhecimento da união estável?
Para que haja o reconhecimento da união estável, é necessário:
I) convivência pública: a relação ser de conhecimento de amigos, familiares e/ou comunidade;
II) contínua: sem interrupções constantes, “idas e vindas”;
III) duradoura: embora não haja uma determinação sobre o tempo mínimo, é necessário que esse tempo seja estável;
IV) e com o intuito de constituir uma família.
Há também alguns pressupostos expostos no Código Civil dos quais destacamos a ausência de impedimentos matrimoniais.
Desse modo, o §1º do art. 1723 do código civil prevê que:
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
Assim, o art. 1.521 do Código Civil aborda os impedimentos no que concerne o instituto do casamento, o que podemos trazer para a união estável, tendo em vista a semelhança dos institutos.
Art. 1.521. Não podem casar:
I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II - os afins em linha reta;
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;
V - o adotado com o filho do adotante;
VI - as pessoas casadas;
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
Insta mencionar que, em relação as pessoas casadas, caso haja a separação de fato ou judicial não há impedimentos para constituir à união estável.
Quais são os efeitos patrimoniais e sociais da união estável?
De acordo com o art. 1.725, “na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”
Destarte, caso não haja definição em relação ao regime de bens escolhido pelo casal durante a união, observar-se-á o patrimônio que os mesmos adquiriram durante a constância da relação, sendo este partilhado em igual proporção.
Outro ponto importante no que concerne aos efeitos patrimoniais é em relação ao direito real de habitação.
Considera-se direito real de habitação o direito que o cônjuge sobrevivente tem de permanecer no imóvel que o casal residia após o falecimento do seu consorte.
O art. 1.831 do Código Civil determina que:
“Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar. “
Considerando a omissão do Código Civil em abordar o direito real de habitação pelo companheiro, a Lei nº 9.278/96, garantiu que o companheiro sobrevivente, tenha direito ao direito real de habitação, conforme descrito no parágrafo único do art. 7º.
“Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família. ”
Nesse mesmo diapasão, a 1ª Jornada de Direito Civil entendeu que:
“117 – Art. 1.831: O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/88. ”
Quanto ao direito de sucessão, o Código Civil no art. 1.790 traz que:
“A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.”
Ocorre que, o supracitado artigo foi objeto de Recurso Extraordinário, sendo certo que o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que ele faz distinção e busca uma hierarquização entre entidade familiar, o que não é permitido pela CF/88.
Pois, contribui para a violação de princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, igualdade, e vedação ao retrocesso.
“Com base nesse entendimento, o Plenário, ao apreciar o Tema 498 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário para reconhecer, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 1.790 (1) do Código Civil de 2002 e declarar o direito do recorrente de participar da herança de seu companheiro, em conformidade com o regime jurídico estabelecido no art. 1.829 do referido código. ” RE 646721/RS, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 10.5.2017. (RE-646721).
Em relação à pensão por morte, o companheiro terá direito, todavia, deverá comprovar junto ao INSS, por meio de procedimento administrativo, que vivia em união estável.
No que tange ao uso do sobrenome do companheiro em união estável, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que:
“É possível a alteração de assento registral de nascimento para a inclusão do patronímico do companheiro na constância de uma união estável, em aplicação analógica do art. 1.565, § 1º, do CC, desde que seja feita prova documental da relação por instrumento público e nela haja anuência do companheiro cujo nome será adotado. ” REsp 1.206.656-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/10/2012.
Alguns aspectos processuais da união estável
A competência para processar e julgar as ações de união estável é da vara de família, e a tramitação segue em segredo de justiça, conforme disposto no art. 8º da Lei 9.278/96.
O reconhecimento da união estável pode ser realizado através de uma escritura pública, via extrajudicial, onde as partes comparecem diretamente a um cartório de notas, momento em que deve ser informado a data do início da união, assim como qual o regime de bens a ser escolhido, e demais informações que acharem propícias.
Ou por via judicial, nesse caso é ação declaratória de reconhecimento de união estável, geralmente é feita quando um dos companheiros são falecidos ou quando há a necessidade de dissolver a união, e envolve patrimônio. Assim, haverá a obrigatoriedade de comprovação por prova documental e/ou testemunhal.