Instituição e organização
O Institucionalismo Sociológico adota a perspectiva cultural em seu bojo por recusar a ideia de que as ações dos atores são motivadas única e exclusivamente por um ganho maior de eficiência. Essa ideia repercute, necessariamente, na explicação do surgimento/modificação da instituição, que deixa de ser por razões de aumento de eficácia (como ocorre no Institucionalismo da Escolha Racional) e se prende mais na ideia de legitimidade social, a instituição existe enquanto seus valores forem amplamente reconhecidos.
Dentro dessa perspectiva, Philip Selznick (apud SANTOS FILHO, 2009, p. 45) se preocupou em diferenciar “organização” de “instituição”:
a organização é um instrumento técnico que mobiliza energia humana visando a uma finalidade pré-estabelecida, avaliada segundo premissas técnicas, e que, por conta disso, tem a sua sobrevivência vinculada à capacidade de atingir tecnicamente os resultados pretendidos. São transitórias e 'consumíveis'.
Por outro lado, as instituições, apesar de concebidas como grupos ou práticas parcialmente desenhadas segundo premissas técnicas, possuem também uma dimensão “natural”. São produtos da interação e adaptação ao ambiente, receptáculos do idealismo do grupo, e mais perenes.
Ou seja, enquanto a organização busca resultados objetivos, a instituição busca resultados simbólicos, que garantem a sua legitimidade e, consequentemente, sua sobrevivência. Nesse sentido, Selznick (1996, p. 14 apud SANTOS FILHO, 2009, p. 46) observa que a institucionalização ocorre quando uma organização se transforma em uma instituição pelo decurso do tempo ao assimilar certos valores presentes no ambiente em que está inserida:
Institucionalização é um processo. É algo que acontece a uma organização com o passar do tempo, refletindo sua história particular, o pessoal que nela trabalha, os grupos que engloba com os diversos interesses que criaram, a maneira como se adaptou ao seu ambiente.
Nelson Santos Filho (2009) chama atenção a importância da variável tempo para análise institucional, uma vez ser impossível estudar o processo de institucionalização sem se ater as construções históricas e as influências do meio social que contribuíram para a organização se transformar em instituição.
Institucionalização por DiMaggio e Powell e por Tolbert e Zucker
Diversos autores estudaram o processo de institucionalização, como o próprio Philip Selznick, além de Peter Ludwig Bergere e Thomas Luckmann, John Wilfred Meyer e Brian Rowan, Paul Joseph DiMaggio e Walter Woody Powell, Pamela Tolbert e Lynne Goodman Zucker (ALVES; CASTRO; SOUTO; 2013; SANTOS FILHO, 2009). O presente trabalho se vale dos estudos produzidos por Paul Joseph DiMaggio e Walter Woody Powell e por Pamela Tolbert e Lynne Goodman Zucker.
Pamela Tolbert e Lynne Goodman Zucker (1999 apud SANTOS FILHO, 2009) explicam o processo de institucionalização por três etapas: habitualização, objetificação e sedimentação. A habitualização, ou estágio de pré-institucionalização, ocorre quando a organização adota novos arranjos estruturais a fim de solucionar problemas específicos. Nessa etapa começa a haver um processo de normalização de tais estruturais “mediante políticas e procedimentos de uma dada organização, ou um conjunto de organizações que encontrem problemas iguais ou semelhantes” (TOLBERT; ZUCKER, 1999 apud PENHA et al., 2008, p. 51).
Na objetificação, ou estágio de semi-institucionalização, há uma difusão da nova estrutura criada em decorrência da existência de “certo grau de consenso social entre os decisores da organização a respeito do valor da estrutura, e a crescente adoção pelas organizações” (ibid., p. 51). Nelson Santos Filho (2009) explica que esse consenso pode se dar tanto pela percepção de outras organizações similares dos resultados obtidos por essa nova estrutura, quanto pelas ações de líderes organizacionais, conhecidos como “champions”, que são grupos de “pessoas com interesse material na estrutura”. (VENTURA, 2005, p. 45).
A última etapa, sedimentação, também conhecida como institucionalização total, é quando ocorre efetivamente a institucionalização. A estrutura escolhida é propagada pelos diversos atores que na teoria são considerados adotantes adequados e é perpetuada por um grande período de tempo. A sedimentação também é marcada por atores contrários a estrutura, que se organizam a fim de combatê-la, e pelos questionamentos entre a estrutura escolhida e os resultados desejados. Superados esses obstáculos, a estrutura está institucionalizada (TOLBERT; ZUCKER, 1999 apud SANTOS FILHO, 2009; TOLBERT; ZUCKER, 1999 apud VENTURA, 2005).
Joseph Dimaggio e Walter Woody Powell (1983 apud ALVES; CASTRO; SOUTO, 2013), no entanto, explicam o processo de institucionalização de forma distinta. Para os autores o processo de institucionalização ocorre pelo isomorfismo, que é um processo de homogeneização de práticas e formas organizacionais por atores que se encontram no mesmo campo organizacional. Esse entendido como:
um conjunto de atores organizacionais que, através de suas inter-relações, são capazes de criar padrões de comportamento aceitos como legítimos e, portanto, absorvidos por todos que integram o conjunto (ou passam a integrá-lo). Esses padrões de comportamento são considerados importantes por todos, para a garantia da sobrevivência das organizações integrantes do campo (SANTOS FILHO, 2009, p. 63).
Ou seja, as organizações que de alguma forma se relacionam tendem assemelhar suas condutas.
DiMaggio e Powell (1983 apud ALVES; CASTRO; SOUTO, 2013) informa que existem três mecanismos isomórficos, que embora distintos não são excludentes, isso é, podem coexistir num mesmo contexto: o isomorfismo coercitivo, o isomorfismo mimético e o isomorfismo normativo.
O isomorfismo coercitivo é resultado de pressões formais e informais sobre a organização. Essas pressões normalmente são “exercidas por organizações das quais dependem, e pelas expectativas culturais da sociedade” (ibid., p. 23). Nelson Santos Filho (2009) dá como exemplo as regulamentações editadas pelo Governo e as pressões de movimentos sociais.
O isomorfismo mimético ocorre quando uma organização adota as mesmas práticas que vem sendo adotadas por outra (s) organização (s). Isso porque as práticas imitadas apresentam-se como legitimas (bem-sucedidas) para enfrentar determinados obstáculos. Dessa forma, as organizações preferem imitá-las, ou por falta de conhecimento, ou para evitar encarar as incertezas criadas pelo ambiente (DIMAGGIO; POWELL, 1999 apud SANTOS FILHO, 2009). Nelson Santos Filho (2009) informa que a transferência das práticas pode ocorrer de forma indireta ou involuntária, quando há transferência de empregados entre empresas ou por meio de consultorias organizacionais.
Por último, existe o isomorfismo normativo, que ocorre pela padronização das práticas e métodos organizacionais e consequente compartilhamento dessas práticas. Dimaggio e Powell (2005 apud CORRÊA, 2014) afirmam que isso ocorreria principalmente pela profissionalização. Eles dão especial atenção ao processo formal de Educação (cursos de especialização, Ensino Superior e etc.) e às associações profissionais (conselhos profissionais) que emitem normas de conduta profissionais. (DIMAGGIO; POWELL, 1999 apud SANTOS FILHO, 2009).
Verificando-se os mecanismos de institucionalização propostos por Tolbert-Zucker e DiMaggio-Powell, percebe-se que eles não são excludentes, existindo, na realidade, equivalência entre as duas perspectivas. Nelson Santos Filho (2009) afirma que a habitualização do modelo de Tolbert-Zucker corresponde a um primeiro momento da teoria de Dimaggio, onde o campo organizacional e a relação dos integrantes desse campo estariam em processo de formação. Posteriormente, no estágio de objetificação, haveria o início do isomorfismo, uma vez que o campo organizacional já estaria mais definido e as relações entre os atores mais intensa. E por último, na sedimentação, o campo organizacional estaria cristalizado e a ação do isomorfismo estaria bem mais intensa, tornando as organizações mais semelhantes em suas atuações.
Desinstitucionalização por Oliver
O processo de institucionalização tem como característica, em último estágio, tornar perene a instituição. No entanto, embora aparente imutabilidade, a instituição pode ser objeto de transformações e até mesmo de extinção. A desinstitucionalização é justamente o “processo através do qual as instituições podem enfraquecer e desaparecer” (SCOTT, 2008 apud SANTOS FILHO, 2009, p. 67).
Oliver (1992 apud CORRÊA, 2014) propõe um modelo para explicar a desinstitucionalização. Segundo a autora o perecimento institucional pode ocorrer por 03 pressões: pressões políticas, pressões instrumentais ou pressões sociais. As pressões políticas ocorrem quando há dúvida por parte dos atores organizacionais acerca da utilidade, necessidade ou legitimidade da adoção das práticas e estruturas institucionalizadas. Essa desconfiança é muitas vezes decorrente de sucessivas crises de desempenho organizacional, bem como pelo surgimento de novas crenças e interesses contrários a ordem vigente. Aos poucos esse juízo vai sendo compartilhado por mais e mais atores organizacionais, gerando o processo de desinstitucionalização.
As pressões instrumentais, por sua vez, levam em conta a análise técnica e funcional da prática institucionalizada. Questiona-se o valor instrumental da prática institucionalizada, verificando-se se determinada prática adotada é a mais adequada para os interesses da organização, caso não seja, a desinstitucionalização pode ser impulsionada. Nelson Santos Filho (2009, p. 69) informa, por exemplo, que uma “atividade institucionalizada pode ser descontinuada se a sua perpetuação deixar de ser recompensada”.
Já as pressões sociais são as decorrentes de ações sociais ou ações estatais (tal como as mudanças legislativas) que estimulam a desinstitucionalização. (OLIVER, 1992 apud CORRÊA, 2014).