Sanções e Fiscalização: A Necessidade de Criação de Autoridade Nacional de Proteção de Dados

Por Thaís Netto - 27/04/2024 as 12:11

Neste artigo, pretende-se discorrer sobre a necessidade de criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD. Para tanto, inicia-se a abordagem partindo de aspectos introdutórios sobre a Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD e o cenário de imprevisibilidade no que se refere à data da entrada em vigor da lei indicada. 

Posteriormente, parte-se para a definição e a caracterização da ANPD, para enfim, enumerar as suas competências. Defende-se desde o início da exposição a relevância da ANPD e a necessidade urgente de sua instituição. 

Aspectos Introdutórios 

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD foi promulgada em 14 de agosto de 2018. Ao sancionar a LGPD - Lei nº 13.709 de 2018 o Presidente Michel Temer vetou o dispositivo que criava a Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD por vício de iniciativa. De acordo com o Presidente apenas a lei de iniciativa da Presidência da República pode criar cargos e gastos no Poder Executivo. 

Diversas entidades e instituições acadêmicas pressionaram para que fosse criada a ANPD, tendo em vista que a ANPD é fundamental para que sejam implementadas as sanções da LGPD. 

Assim, em 27 de dezembro de 2018 foi editada a Medida Provisória nº 869 que visava alterar a Lei nº 13.709 de 2018 para dispor sobre a proteção de dados pessoais e para criar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD. Informa-se que a Medida Provisória indicada foi convertida na Lei nº 13.853 de 2019 sancionada pelo atual Presidente. Destaca-se que a ANPD ainda não foi instituída. 

A LGPD no momento de sua promulgação estava prevista para entrar em vigor em agosto de 2020. Conforme já sinalizado em diversos artigos publicados no Instituto de Direito Real, houve diversos projetos de lei com o intuito de prorrogar a entrada em vigor da referida Lei. 

O cenário é de imprevisibilidade e no presente momento, encontra-se vigente a Medida Provisória nº 959 de 2020 - que teve a vigência prorrogada por mais 60 dias - que adia a entrada em vigor da LGPD para 03 de maio de 2021. A Medida Provisória indicada ainda não passou pela votação no Congresso Nacional, assim, ainda não se pode afirmar a data que a LGPD entrará em vigor. 

Pode-se dizer que as sanções administrativas dispostas nos artigos 52, 53 e 54, da LGPD estão previstas para entrarem em vigor na data de 01 de agosto de 2021, em virtude da Lei nº 14.010 de 2020.

Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD

A Lei nº 13.853 de 2019 alterou alguns dispositivos da LGPD e criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Apesar da Lei indicada ter criado a ANPD, a autoridade nacional ainda não foi instituída. Como se verá ao longo do artigo a ANPD é importante para a efetividade da LGPD.

De acordo com o artigo 5º, XIX, da LGPD, a ANPD pode ser definida como o órgão pertencente à Administração Pública responsável por zelar, implementar, bem como, fiscalizar o cumprimento da LGPD em todo o território nacional. 

Diversos dispositivos espalhados na LGPD fazem menção à ANPD. Além disso, muitos dispositivos aguardam regulamentação da ANPD. O capítulo IX da LGPD trata da ANPD e do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, engloba a seção I referente à Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais - ANPD, dos artigos 55 - A ao artigo 55 - L. 

A ANPD será composta de: Conselho Diretor - órgão máximo de direção-; Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade; Corregedoria; Ouvidoria; órgão de assessoramento jurídico próprio e de unidades administrativas e unidades especializadas necessárias à aplicação das disposições da LGPD. A ANPD será vinculada à Presidência da República. 

O Conselho Diretor da ANPD será composto por cinco diretores, incluindo o Diretor Presidente. O mandato para os membros do Conselho Diretor será de quatro anos. Cabe informar que o Conselho Diretor será responsável por dispor sobre o regimento interno da ANPD. 

O Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade será composto por 23 representantes, titulares e suplentes de diversos órgãos, tais como: 

  • 5 do Poder Executivo federal; 

  • 1 do Senado Federal; 

  • 1 da Câmara dos Deputados; 

  • 1 do Conselho Nacional de Justiça; 

  • 1 do Conselho Nacional do Ministério Público; 

  • 1 do Comitê Gestor da Internet no Brasil; 

  • 3 de entidades da sociedade civil que tenham uma atuação relacionada com a proteção de dados pessoais; 

  • 3 de instituições científicas, tecnológicas e de inovação; 

  • 3 de confederações sindicais representativas das categorias econômicas do setor produtivo; 

  • 2 de entidades representativas do setor empresarial no que se refere ao tratamento de dados pessoais;

  • 2 de entidades representativas do setor laboral.

O Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade é responsável por propor diretrizes estratégicas e fornecer subsídios para que seja elaborada a Polícia Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade e para a atuação da ANPD; por elaborar relatórios anuais de avaliação da execução das ações da Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade; por sugerir ações a serem realizadas pela ANPD; por elaborar estudos, bem como, realizar debates e audiências públicas sobre a proteção de dados pessoais e a privacidade e por disseminar o conhecimento referente à proteção de dados pessoais e da privacidade à população, nos termos do artigo 58-B, da LGPD. 

Competências da ANPD

Segundo a Advogada e Doutora em Direito Rita Blum e o Advogado Hélio Moraes (2020) a

ANPD é importante para que sejam definidas novas políticas e padronização de fiscalização, bem como, para ser o elemento de reciprocidade em relação às legislações estrangeiras como o General Data Protection Regulation - GDPR, devendo ter independência e autonomia. 

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais - ANPD é responsável por zelar pela proteção de dados pessoais, de acordo com a legislação; zelar pela observância dos segredos comercial e industrial, respeitando a proteção de dados pessoais e o sigilo das informações quando protegidos por lei ou nos casos em que a quebra do sigilo violar os fundamentos da LGPD e elaborar as diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade.

Salienta-se que a ANPD é responsável por fiscalizar e aplicar sanções nos casos de tratamento de dados realizado, que descumpra a legislação, por intermédio de processo administrativo, que assegure o contraditório, a ampla defesa e o direito de recurso. 

O tratamento de dados se refere à operação realizada com dados pessoais, como a coleta, a produção, o acesso, o arquivamento, o armazenamento, a eliminação, a transferência, entre outros. O tratamento indicado deve respeitar a boa-fé, a finalidade, os limites, a prestação de contas, possibilitar a consulta ao titular, entre outros. 

Outrossim, a ANPD é competente para apreciar petições do titular contra o controlador após a comprovação da apresentação de reclamação ao controlador, que não foi solucionada no prazo indicado na legislação. 

A ANPD deve promover na população o conhecimento das normas e das políticas públicas com relação à proteção de dados pessoais e às medidas de segurança, além de promover estudos sobre as práticas nacionais e internacionais com relação à proteção de dados pessoais e à privacidade. 

A ANPD deve editar regulamentos e procedimentos sobre a proteção de dados pessoais, realizar auditorias ou determinar a sua realização; editar normas e procedimentos simplificados e diferenciados, para que as microempresas e as empresas de pequeno porte possam se adequar às disposições da LGPD. 

Válido destacar que a ANPD definirá, por regulamento próprio sobre as sanções administrativas as metodologias que orientarão o cálculo do valor base das sanções de multa. O regulamento deve ser objeto de consulta pública. Indica-se que as metodologias citadas devem ser previamente publicadas, para que os agentes de tratamento tenham ciência. 

Além disso, as metodologias devem apresentar de maneira objetiva as formas e as dosimetrias para o cálculo do valor-base das sanções de multa, que devem conter fundamentação detalhada dos elementos, confirmando o respeito aos critérios previstos em lei. 

Para a Advogada Patrícia Peck Pinheiro (2020) a aplicação do disposto no artigo 53, § 1º e § 2º, da LGPD, no que se refere às sanções está pendente da constituição da ANPD, mesmo que a vigilância e a lei possam ser realizadas pelo Ministério Público até que a ANPD seja constituída. 

Diante do exposto, verifica-se a importância da ANPD para a aplicação das sanções e para a fiscalização do cumprimento das disposições da LGPD. Muitos dispositivos ainda carecem de regulamentação. Outrossim, a instituição da ANPD torna-se mais do que necessária e urgente em tempos da pandemia do novo coronavírus COVID-19, em que os governos pretendem usar e acessar dados pessoais dos cidadãos no combate à doença. 

A ANPD é fundamental para regular o uso dos dados pessoais, para que os dados não sejam utilizados de forma indevida e não seja violada a intimidade e a privacidade dos cidadãos. 

Referências:

BLUM, Rita Peixoto Ferreira.; MORAES, Hélio Ferreira. Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD. In: CARVALHO, André Castro.; ALVIM, Tiago Cripa.; BERTOCCELLI, Rodrigo; VENTURINI, Otavio. Manual de Compliance. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

Lei que cria autoridade nacional de proteção de dados é sancionada com vetos. Senado Federal. 09 jul. 2019. 

Lei nº 13.709 de 2018.

Lei nº 13.853 de 2019. 

PINHEIRO, Patrícia Peck. Proteção de Dados Pessoais: comentários à Lei nº 13.709 de 2018. 2 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.