Prevenção e Reparação de Danos Causados ao Consumidor: Causas Excludentes da Responsabilidade Civil

Por Júlia Brites - 27/04/2024 as 12:19

 

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O Código de Defesa do Consumidor adotou a responsabilidade objetiva como regra, entretanto admitiu causas excludentes da responsabilização do fornecedor, numa nítida evidência de que a teoria do risco fundamentadora da aludida responsabilidade não foi a do risco integral, que, por sua vez, não admite causas excludentes, conforme argumenta Fabrício Bolzan.

Dessa forma, o CDC enumera as excludentes próprias de responsabilidade civil no artigo 12, § 3° que dispõe que o fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Artigo semelhante é o 14, §3º do CDC que dispõe que o fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

A seguir, iremos analisar cada uma das excludentes acima:

 

Causas excludentes de responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto

 

- Excludente da não colocação do produto no mercado

A primeira causa excludente da responsabilidade civil é a não colocação do produto no mercado de consumo, o que deve ser demonstrado.

Fabrício Bolzan explica:

“Basta pensarmos na situação de um lote de medicamentos em que foi constatado o defeito e, por essa razão, acabou sendo alocado para determinado galpão isolado até a realização da respectiva incineração. Neste meio-tempo, enquanto se aguardava o momento de sua destruição, o lote foi furtado e vendido no “mercado paralelo” ou dentro de transportes coletivos, situação corriqueira no dia a dia dos grandes centros urbanos. Em tal contexto, caso um consumidor venha a adquirir medicamento nessas condições irregulares e sofra algum tipo de dano, poderá o fornecedor invocar a excludente de responsabilidade de que não colocou o produto no mercado de consumo, demonstrando que tal produto era integrante de determinado lote que fora objeto de furto. O mesmo raciocínio valerá em caso de produtos falsificados”.

 

- Excludente da ausência do defeito

Essa causa de excludente da responsabilidade civil nos traz a ideia de que o fabricante, o construtor, o produtor ou importador assume a colocação do produto no mercado, respectivamente, mas comprova a ausência de defeito.

 

- Excludente da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro

A última causa da excludente de responsabilidade tem como causador do dano, exclusivamente, o consumidor ou o terceiro, tornando o fornecedor isento dos prejuízos ocorridos.

O autor Fabrício Bolzan exemplifica:

“Colocamos como exemplo um produto como o veneno para matar insetos cuja periculosidade é normal e previsível, com todas as informações sobre os riscos expressas de maneira ostensiva e adequada, mas, mesmo assim, o consumidor faz mau uso e acaba sofrendo danos por culpa exclusiva sua. Tratando-se de culpa concorrente do consumidor não há falar em causa excludente de responsabilidade, mas em atenuante desta. Esse também é o entendimento consolidado no STJ: A circunstância de o paciente ter consumido o produto sem prescrição médica não retira do fornecedor a obrigação de indenizar. Pelo sistema do CDC, o fornecedor somente se desobriga nas hipóteses de culpa exclusiva do consumidor (art. 12, § 3º, do CDC), o que não ocorre na hipótese, já que a própria bula do medicamento não indicava os riscos associados à sua administração, caracterizando culpa concorrente do laboratório. (REsp 971.845/DF, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, 3ª T., DJe 1º-12-2008)”.

A questão polêmica da presente excludente é se o comerciante poderia se enquadrar como terceiro.

O Superior Tribunal de Justiça, bem como a doutrina majoritária entende que não é possível enquadrar o comerciante como terceiro, uma vez que a figura do terceiro deve ser pessoa estranha à cadeira de fornecedores. Dessa forma, segue entendimento do STJ: “O comerciante e o fabricante estão inseridos no âmbito da cadeia de produção e distribuição, razão pela qual não podem ser tidos como terceiros estranhos à relação de consumo” (REsp 980.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 2-6-2009).

Muitos questionam-se se o caso fortuito e a força maior seriam causas excludentes da responsabilidade civil. O autor Fabrício Bolzan entende que sim, pois rompem o nexo de causalidade, porém desde que ocorram após a inserção do produto no mercado de consumo:

“Isto porque é dever do fornecedor inserir no mercado de consumo produto de qualidade — escoimado de defeitos —, não podendo invocar conduta humana ou fenômeno da natureza como responsáveis pela deterioração de um produto se tal acontecimento ocorrer antes de introduzir o bem no mercado. Assim, se um laboratório de medicamentos tem seu galpão inundado por fortes chuvas que foram as responsáveis pela deterioração de seus medicamentos, estes não poderão jamais ser introduzidos no mercado de consumo, pois o fenômeno da natureza aqui ocorreu antes da colocação do bem no mercado”.

 

Causas excludentes de responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço

 

- Excludente da ausência de defeito

A presente excludente da responsabilidade civil consiste na demonstração do fornecedor de que o defeito na prestação do serviço não existe. Ou seja, exige-se prova da inexistência, tornando-se um regime mais rigoroso de responsabilidade.

 

- Excludente da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro

A culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro é a última excludente da responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço.

Nesse sentido, segue entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE RODOVIA. ROUBO E SEQUESTRO OCORRIDOS EM DEPENDÊNCIA DE SUPORTE AO USUÁRIO, MANTIDO PELA CONCESSIONÁRIA. FORTUITO EXTERNO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. 1. Ação ajuizada em 20/09/2011. Recurso especial interposto em 16/09/2016 e distribuído ao Gabinete em 04/04/2018. 2. O propósito recursal consiste em definir se a concessionária de rodovia deve ser responsabilizada por roubo e sequestro ocorridos nas dependências de estabelecimento por ela mantido para a utilização de usuários (Serviço de Atendimento ao Usuário). 3. “A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não usuário do serviço público, é condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado” (STF, RE 591874, Repercussão Geral). 4. O fato de terceiro pode romper o nexo de causalidade, exceto nas circunstâncias que guardar conexidade com as atividades desenvolvidas pela concessionária de serviço público. 5. Na hipótese dos autos, é impossível afirmar que a ocorrência do dano sofrido pelos recorridos guarda conexidade com as atividades desenvolvidas pela recorrente. 6. A ocorrência de roubo e sequestro, com emprego de arma de fogo, é evento capaz e suficiente para romper com a existência de nexo causal, afastando-se, assim, a responsabilidade da recorrente. 7. Recurso especial provido (REsp 1749941/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª T., julgado em 4-12-2018, DJe 7-12-2018).

Fabrício Bolzan complementa com a culpa concorrente:

“Mais uma vez vale ressaltar que a culpa concorrente atenua a responsabilidade do fornecedor, mas não a exclui. Este é o posicionamento dominante na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quando, por exemplo, pedestre é atropelado em via férrea ao tentar atravessá-la. Neste caso, concorrem com culpa a concessionária do serviço de transporte coletivo que não impede a travessia e o consumidor que sabia — ou deveria saber — dos riscos de sua conduta: É civilmente responsável, por culpa concorrente, a concessionária do transporte ferroviário pelo falecimento de pedestre vítima de atropelamento por trem em via férrea, porquanto incumbe à empresa que explora essa atividade cercar e fiscalizar, devidamente, a linha, de modo a impedir sua invasão por terceiros, notadamente em locais urbanos e populosos. (AgRg no AREsp 34.287/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 14-12-2011)”.

Por fim, “prevalece também na responsabilidade pelo fato do serviço que o fornecedor estará isento de responder pelos danos decorrentes da prestação de serviços defeituosos quando ocorrer caso fortuito ou força maior durante ou após a prestação da atividade no mercado de consumo”, expõe Bolzan.

 

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

DE ALMEIDA, Fabrício Bolzan. Direito do Consumidor Esquematizado, pgs. 521, 525-527, 536 e 538.