Direito Penal: A Criminalização da Pornografia de Vingança
Com o advento da internet e da criação de novos aparatos tecnológicos, a lógica da criminalidade se alterou contundentemente. Antes da era tecnológica, a preocupação das políticas públicas se limitava a questões “mais palpáveis” – combate à violência, roubos, furtos, homicídios e etc. Hoje, todavia, a criminalidade se expressa através de novas ferramentas, sendo certo que seu combate deve ser reanalisado e reconfigurado. O criminoso agora pode agir por trás de uma tela de computador, causando consequências sérias e devastadoras na vida das vítimas – como é o caso dos agentes da Pornografia de Vingança. Além disso, a era digital trouxe desafios cada vez maiores no combate aos delitos informáticos, vez que a identificação de um delinquente virtual demanda um trabalho investigativo complexo.
Os chamados crimes cibernéticos, por sua vez, são aqueles cometidos no espaço virtual da rede – apesar de ampla, essa é a definição que melhor explica a generalidade desses crimes, que podem comportar-se por meio de uma exposição indevida de imagens que estavam sob posse do autor; por meio do acesso não autorizado de algum dado eletrônico; entre outras tantas formas delitivas. (SCHMIDT, Jus Brasil, 2014). Devido à rápida dinâmica proporcionada pela internet, classificações e definições mais complexas tornam-se rapidamente obsoletas, haja vista que as espécies de crimes informáticos se multiplicam conforme o avanço tecnológico. Devido à rápida dinâmica proporcionada pela internet, classificações e definições mais complexas tornam-se rapidamente obsoletas, haja vista que as espécies de crimes informáticos se multiplicam conforme o avanço tecnológico.
Diante dessa premissa, cabe elucidar que a legislação criminal possui um relevante valor social. Isso ocorre porque a lei penal funciona, historicamente, como uma ferramenta de acesso aos direitos pelos mais diversos setores da sociedade. Nesse sentido, a pena impõe-se como um mecanismo simbólico de proteção dos valores ético-sociais estabelecidos socialmente. É função do Direito Penal valorar as ações que são reconhecidas como positivas e vedar as condutas com valor negativo, atuando na positivação de valores culturalmente fundamentais para a vida coletiva e resguardando bens jurídicos avaliados como importantes no meio social. (CDH/UFMG, 2015, p. 12)
No entanto, tal fenômeno, apesar de ser uma forma devastadora de violência de gênero – como demonstrado pela análise de casos – não possui uma tipificação clara no ordenamento jurídico penal. Conforme será observado ao longo do artigo, existe uma dependência e insuficiência legislativa referente ao crime de Pornografia de Vingança.
A defesa de uma especificação legal da pornografia não consensual decorre da necessidade de nominação e do consequente reconhecimento formal do problema pelo Poder Público, retirando-o da invisibilidade. Ademais, ressalta-se que a referida conduta delitiva implica danos concretos ao bem jurídico tangível – qual seja a liberdade sexual – que integra a restrita pauta de criminalização defendida nos programas de direito penal mínimo. (CDH/UFMG, 2015, p. 12)
Embora necessária, a criminalização da pornografia de vingança, por si só, não é suficiente para enfrentar as mazelas proporcionadas pela violência de gênero. Sendo certo, portanto, que a incessante e progressiva busca pela resposta penal não pode ofuscar a discussão acerca das causas que levam o responsável a utilizar-se da sexualidade feminina para humilhar a vítima.
Deve-se questionar, antes de qualquer outra medida, a superestrutura de dominação masculina e as ferramentas utilizadas para sua perpetuação. (BUZZI, 2015, p. 98) Só a partir do combate às causas, será possível evitar novos casos. Sendo assim, é necessário mesclar a promoção do questionamento sobre a origem desse fenômeno com a nominação legal do delito de Pornografia de Revanche, com o intuito de impactar efetivamente o combate à violência de gênero.
Diante do exposto, cabe analisar os diplomas legais utilizados na criminalização do delito da Pornografia de Vingança, bem como apontar a sua aplicação atual no cenário jurídico brasileiro.
Lei 11.340/06: Lei Maria da Penha
A Lei de Violência Doméstica é um marco simbólico na luta contra a violência perpetrada em face da mulher. Isso, pois foi o primeiro diploma legal a mencionar de forma explícita a proteção dos direitos sexuais femininos. (PEGORER; ALVES, 2013, p. 11). Esse diploma legal foi assim intitulado em razão da história da cearense Maria da Penha. No ano de 1983, Maria da Penha foi vítima de um tiro nas costas enquanto dormia. O disparo partiu de seu marido à época e tornou a vítima paraplégica. Diante disso, Maria buscou apoio jurídico, mas seu ex cônjuge foi absolvido por duas vezes. Diante da negligência do Estado brasileiro, foi realizada denúncia junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).O Brasil foi condenado por omissão aos casos de violência contra a mulher e, a partir de então, a pressão internacional fez com que o chefe do executivo promulgasse a lei que ficou conhecida como Lei Maria da Penha, no ano de 2006. A partir da leitura da Lei, observa-se que o diploma se preocupou em criar um sistema de proteção à mulher vítima de diversas modalidades de violência. Em seu Art. 7º, ao longo dos incisos, faz referência a variadas formas de violentar pessoas do sexo feminino:
São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (Grifo meu)
O fenômeno da Pornografia de Vingança, por sua vez, pode ser facilmente classificado e tipificado como forma de violência psicológica ou moral. Nesse contexto, a violência psicológica se ilustra do início ao fim do crime – das ameaças de publicação até o cumprimento das promessas de exposição. A moral, por sua vez, se consuma quando as fotos íntimas são dispostas publicamente em sites e redes sociais, configurando uma grave violação à intimidade e honra da vítima. (BUZZI, 2015, p. 76)
Observa-se, no entanto, a problemática levantada no tópico anterior: inexiste qualquer menção à violência de gênero ou condutas ofensivas direcionadas à mulher no âmbito da internet, conferindo ao crime aqui estudado uma situação de invisibilidade jurídica. Historicamente, a inexistência de tipificação impossibilitou o desenvolvimento de meios coercitivos específicos e eficazes para o combate desse tipo de crime – o que acabou gerando uma sensação de impunidade para os agressores.
O fenômeno da Pornografia de Vingança, bem como outras modalidades de Pornografia Não Consensual, ganhou destaque nos últimos tempos, haja vista que o meio virtual teve seu acesso democratizado e facilitado, aumentando exponencialmente esse tipo de delito informático – conforme dados indicados pela SaferNet Brasil, uma associação civil de direito privado, com atuação nacional, sem fins lucrativos ou econômicos, sem vinculação político partidária, religiosa ou racial, fundada em 20 de dezembro de 2005 por um grupo de cientistas da computação, professores, pesquisadores e bacharéis em Direito, a organização surgiu para materializar ações concebidas ao longo de 2004 e 2005, quando os fundadores desenvolveram pesquisas e projetos sociais voltados para o combate à pornografia infantil na Internet brasileira”.
A referida instituição criou um site a fim de promover o auxílio às vítimas de crimes na internet. A plataforma intitulada de “Indicadores HelpLine” faz, periodicamente, um compilado dos atendimentos que promove. Em uma análise comparativa durante cinco anos de funcionamento, percebe-se o aumento exponencial do número de atendimentos de vítimas da exposição íntima na web - no ano de 2012, foram atendidas apenas 4 demandas de mulheres, ao passo que no ano de 2017 esse número saltou para 204 vítimas do sexo feminino.
Diante do aumento dos casos da divulgação de material íntimo e da percepção de que se trata de um fenômeno diretamente relacionado à violência de gênero, segundo informações veiculadas pela Revista “Consultor Jurídico” em 2018, alguns tribunais passaram a aplicar a Lei Maria da Penha para casos de exposição pornográfica não consensual. Os casos vêm sendo tratados como violência moral e vem ganhando cada vez mais enfoque entre os operadores da Justiça, vez que o número de casos que chegam ao tribunal também tem aumentado exponencialmente.
Um dos exemplos da utilização da Lei Maria da Penha em face do crime de Pornografia de Vingança se deu na 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, consoante informações expostas no Portal TJMG, em Abril de 2017. No episódio em epígrafe, foi determinada a condenação de um rapaz no patamar de R$75.000,00 à título de indenização à sua ex-namorada, que teve as fotos íntimas divulgadas por ele. Em Cuiabá, por outro lado, uma jovem de 17 anos, cujo vídeo íntimo foi publicado pelo ex-namorado em sites internacionais, teve direito a medidas protetivas de urgência. (CONJUR, 2018)
Além da passagem acima mencionada, o Art. 5º do mesmo diploma legal também demonstra a possibilidade de utilizar a Lei Maria da Penha no caso da violência ser perpetrada por namorados/ex-namorados ou quaisquer pessoas com vínculo afetivo entre si, conforme se observa pela leitura do inciso III do dispositivo:
Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. (grifo meu)
Portanto, conforme será desenvolvido em tópico posterior há projetos de lei que visam a regulamentação penal do crime de Pornografia de Vingança, com o intuito de conferir-lhe maior visibilidade, bem como de criar uma figura específica no ordenamento jurídico – haja vista a gravidade e complexidade do delito. No mais, enquanto os projetos não são aplicados, existe a possibilidade de aplicar a Lei Maria da Penha de forma análoga.
Lei 12.737/12: Lei Carolina Dieckmann
Segundo seu respectivo texto legislativo, esse diploma legal “dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; e dá outras providências” (BRASIL, Lei nº. 12.737) O diploma é conhecido como “Lei Carolina Dieckmann” haja vista que a atriz foi vítima da divulgação de suas fotos íntimas por força da invasão de seu email, onde guardava o material privado. A atriz passou a receber ameaças acerca da exposição de suas fotos, os autores passaram a chantageá-la, requerendo a quantia de R$10.000 para não realizar a divulgação das imagens. Contudo, Carolina não cedeu à extorsão e acabou tendo sua privacidade violada, em 07 de Maio de 2012.
A promulgação dessa lei comportou-se como uma novidade legislativa, tendo em vista que antes de ser promulgada havia lacunas na lei acerca do tema. Essas brechas legislativas permitiam a impunidade de condutas reprováveis praticadas no ambiente virtual, no tocante à proteção de dados e informações pessoais. (BORGES, JusBrasil. 2013) Esse diploma tipificou os chamados delitos cibernéticos conferindo maior segurança e garantia aos dados. É importante ressaltar que os crimes cibernéticos referem-se a todos os delitos cometidos utilizando computadores ou internet, por meio de uma rede pública, privada ou doméstica. As formas de cometer tais delitos são diversas e podem atingir desde um usuário até um sistema de redes completo.
Por fim, cumpre mencionar que a cominação legal da pena nos crimes disciplinados pelo referido diploma legislativo é deveras desproporcional quando comparado aos efeitos da conduta realizada. O Art. 154-A. em seu parágrafo único, determina que o responsável pela invasão de dispositivo alheio deverá cumprir pena de detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano, o que significa dizer que o crime possui tratamento similar àqueles considerados de “menor potencial ofensivo”.
Nesse sentido, é possível observar diversas lacunas na lei que não corroboram para a ausência de efetividade da norma, sendo certo que, além de não possuir um objeto suficientemente amplo, comina uma pena que não se coaduna com o sofrimento empreendido pela vítima.
Lei 13.718/2018 e Projetos de Lei Pertinentes ao Tema
A Pornografia de Vingança, no dia 24 de Setembro de 2018 deixou a fase da criminalização primária, vez que foi sancionada a Lei nº. 13.718 de 2018, que determinou a alteração do Código Penal vigente. Segundo Zaffaroni (2015, p.43), criminalização primária é o ato formal do Legislativo de discutir e analisar o sancionamento de uma lei penal, buscando a reprovação legal de condutas moralmente reprováveis, viabilizando a punição dos autores.
Conforme informações vinculadas pelo site ConJur (POMPEU, 2018), como Presidente Interino, o Ministro Dias Toffoly, do Supremo Tribunal Federal, sancionou a lei que tipifica como crime a prática de importunação sexual e de “Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia” (BRASIL, Lei nº. 13.718/2018) Cabe salientar que esse diploma legal é recente, tendo sido sancionado em 24 de Setembro de 2018. Portanto, a produção bibliográfica é ainda muito incipiente.
Art. 218-C: Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação. (grifo meu)
O parágrafo primeiro do referido dispositivo, consoante citação acima, determina uma causa de aumento de pena caso o crime seja cometido por autor que mantenha relação íntima e de afeto com a vítima. Nesse sentido, faz-se necessário estabelecer uma coesão imediata com o fenômeno aqui estudado. Isso, pois, conforme já visto nos capítulos iniciais, a Pornografia de Vingança é uma modalidade específica da pornografia não consensual, que traz consigo o elemento do vínculo de confiança.
Para além do sancionamento desse diploma legal, insta demonstrar e catalogar a vigência de diversos projetos de lei que visam à regulamentação ainda mais precisa desse delito. Além de propor alterações na Lei Maria da Penha e no Código Penal, propõem dispositivos que sejam capazes de tipificar o crime de forma objetiva. Por este motivo cumpre analisar os projetos de lei que estão em trâmite na Câmara dos Deputados e no Senado, de maneira a analisar qual a repercussão jurídico-criminal vem sendo conferida a esse fenômeno.
O Legislativo passou a receber projetos de lei visando uma maior regulamentação legal do fenômeno da Pornografia de Vingança, haja vista a grande quantidade de casos relatados – conforme já mencionado anteriormente. Entre os projetos, destaca-se o Projeto Lei 5555/2013 proposto pelo deputado federal João Arruda (PMDB/PR) buscando criar a chamada “Lei Maria da Penha Virtual” ou “Lei Rose Leonel”, que visa reconhecer a violação da intimidade da mulher como uma das modalidades de violência doméstica e familiar, ou seja, acrescenta um novo inciso ao Art. 7º transcrito anteriormente.
Art. 7º, inciso VI: violação da sua intimidade, entendida como a divulgação por meio da Internet, ou em qualquer outro meio de propagação da informação, sem o seu expresso consentimento, de imagens, informações, dados pessoais, vídeos, áudios, montagens ou fotocomposições da mulher, obtidos no âmbito de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade. (BRASIL. Projeto de Lei nº 5.555, de 09 de janeiro de 2013, Brasília, DF)
A partir da leitura do PL veiculado no site da câmara, observa-se que o projeto busca tipificar a exposição pública e virtual da intimidade sexual, alterando a Lei Maria da Penha e o Código Penal. Ademais, o mesmo PL, abreviatura utilizada para designar o termo “Projeto Lei”, prevê o acréscimo de um §5º ao artigo 22, determinando que, uma vez ocorrida a violação da intimidade da vítima, o juiz determinará que o provedor da internet remova, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, o conteúdo ofensivo. (PEGORER; ALVES, 2013, p. 14). Deve-se ressaltar que o caput do dispositivo mencionado conta com a seguinte redação: “Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras.”.
Art. 22, §5º: Na hipótese de aplicação do inciso VI do artigo 7º desta Lei, o juiz ordenará ao provedor de serviço de e-mail, perfil de rede social, de hospedagem de site, de hospedagem de blog, de telefonia móvel ou qualquer outro prestador do serviço de propagação de informação, que remova, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, o conteúdo que viola a intimidade da mulher. (BRASIL. Projeto de Lei nº 5.555/2013)
Em 21 de fevereiro de 2017, o projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados, sendo enviada para a arguição do Senado, sendo certo que seu número passou a ser PLC 18/2017. Contudo, até o mês de Julho de 2018 não houve nenhum resultado, conforme pode ser observado pela situação do PL disposta no site da câmara: “Situação: Pronta para Pauta no PLENÁRIO (PLEN); Pronta para Pauta na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC); Pronta para Pauta na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMULHER)”.
A partir desse PL, surgiram outros que se referem às mesmas demandas e matérias. O Projeto Lei nº. 5.822 de 25 de Junho de 2013, de autoria da Deputada Federal Roseane Ferreira (PV/PR) e o Projeto Lei nº. 170 de 04 de Fevereiro de 2015, proposto pela Deputada Federal Carmem Zanotto (PPS/SC) encontram-se, atualmente, apensados ao Projeto lei 5555/13. (BUZZI, 2015, p. 85) Portanto, ambos os projetos têm suas situações junto ao site da câmara são descritas como “situação: arquivada”. (BRASIL, 2013)
O Projeto Lei nº. 6.630 de 23 de Outubro de 2013, de autoria do Deputado Federal Romário (PSB/RJ), embora possua peculiaridades em relação ao PL 5555/13, também foi apensado a este. Sua situação, assim, também consta como “arquivada” no site da câmara. A proposta do referido projeto é mais severa, no sentido de seu objetivo é tipificar o ato de divulgar fotos ou vídeos de cenas íntimas sem autorização da vítima no Código Penal, acrescentando o Art. 216-B (RODRIGUEZ; DUTRA, 2016, p. 17):
Art. 216-B. Divulgar, por qualquer meio, fotografia, imagem, som, vídeo ou qualquer outro material, contendo cena de nudez, ato sexual ou obsceno sem autorização da vítima. Pena – detenção, de um a três anos, e multa. §1º Está sujeito à mesma pena quem realiza montagens ou qualquer artifício com imagens de pessoas. §2º A pena é aumentada de um terço se o crime é cometido: I - com o fim de vingança ou humilhação; II – por agente que era cônjuge, companheiro, noivo, namorado ou manteve relacionamento amoroso com a vítima com ou sem habitualidade; §3º A pena é aumentada da metade se o crime é cometido contra vítima menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa com deficiência. (BRASIL, 2013)
Entre o ano de 2013 e o ano do presente trabalho (2018), muitos outros projetos de lei surgiram com o intuito de regulamentar a Pornografia de Vingança no âmbito criminal, ou seja, de tornar esse fenômeno, de fato, um delito reconhecido pelo ordenamento jurídico. No entanto, não é pertinente à presente pesquisa mencionar todos os projetos existentes, tampouco adentrar seus objetivos e especificidades. O Projeto 5555/13 abarcou grande parte dos projetos de lei surgidos posteriormente, sendo certo que uma eventual lei penal acerca do tema, deverá levar em consideração as diversas nuances tratadas em cada um desses projetos.
Em suma, mesmo com todos os esforços legislativos que vêm sendo apreendidos durante todos esses anos, há uma inegável carência de tipificação específica, o que acaba restringindo as medidas de proteção à vítima. O principal PL em tramitação (PL nº. 5555/13) tem como finalidade acabar com a sensação de impunidade que permeia os autores desse tipo de delito – como dito pelo propositor do projeto em entrevista à Revista Galileu: “A noção de impunidade permite que coisas como essa continuem acontecendo. E então a internet se torna uma arma” (ARRUDA, 2013).
Em uma análise geral sobre os projetos de lei, é possível observar que, em regra, eles possuem um viés punitivista, buscando uma compensação pelo delito já cometido, porém, “não se pode perder de vista que o paradigma punitivo-repressivo nunca se apresentou como suficiente para coibir, desencorajar ou reduzir qualquer conduta tida como desviante”. (BUZZI, 2015, p. 104) Contudo, a solução para a redução da incidência da revengeporn não deve ater-se apenas à criminalização da conduta do agressor, como já dito.
Sabe-se que o avanço legislativo é essencial para respaldar as vítimas e garantir a punição dos autores dos compartilhamentos não consentidos, mas a medida principal deve ser a de conscientização social e educacional no que toca o combate da raiz do problema: a cultura patriarcal que permeia a sociedade brasileira (e mundial).
A lei é necessária, mas não é suficiente. Com a lei, surge a possibilidade de que se encaminhe à Justiça alguns casos, que haja um debate. Mas o problema é estrutural. A sociedade e as instituições que não conseguem, ou não querem, combater o machismo, o racismo, a homofobia e outras opressões nem dentro das escolas, a partir da educação infantil, nunca conseguirão se livrar de seus crimes. Com ou sem lei, ainda não há campanhas efetivas de combate à discriminação. – Thamiris Mayumi Sato (CARVALHO, 2013)
Nesse sentido, é mister arguir que a máquina pública deve ser usada em prol da conscientização, desde a infância, acerca de fenômenos como esse e de tantas outras formas de violência de gênero perpetradas na sociedade. Embora a estrutura dominante corrobore para a submissão feminina em detrimento da dominação masculina, é evidente que a idealização e concretização de políticas públicas nessa seara é capaz de promover a maior equidade de gênero.
Leia a primeira parte deste artigo em: Repercussão Jurídica da Pornografia de Vingança - Parte I