A diversidade dos tipos de ações, que envolvem pais e filhos, dentro do Poder Judiciário, é grande. Dessa forma, o intuito deste artigo é fazer um apanhado geral, expondo as principais espécies de ações referentes a pais e filhos, dando ênfase as de maior relevância social e as que causam um maior impacto familiar. Destaca-se que, vários desses temas podem ser objeto de ação judicial própria, contudo, é bastante comum que tenham pedidos cumulados, como ocorre, por exemplo, na ação de fixação de guarda com alimentos e regulamentação do direito de convivência.
A seguir, serão demonstradas as demandas mais corriqueiras no Judiciário.
Investigação de Paternidade
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 27, preconiza que o reconhecimento do estado de filiação é um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição.
Por se tratar de direito fundamental à identidade, qualquer indivíduo, não importando a sua idade, possui o direito de investigar seus vínculos parentais, não se admitindo tratamento discriminatório com relação aos filhos (DIAS, 2021, p. 269).
Por outro lado, há presunção de paternidade aos filhos nascidos na constância do casamento, o que não ocorre com os havidos fora do vínculo conjugal, em que se exige o reconhecimento judicial, por meio da ação de investigação de paternidade, quando o mesmo não se der de forma voluntária pelo suposto pai.
A ação de investigação de paternidade tem natureza declaratória e os seus efeitos retroagem ao nascimento do filho. Por tratar-se de direito personalíssimo, a legitimidade para ingressar com a ação pertence ao próprio filho, e este, quando incapaz, será representado ou assistido por seu representante legal. Ainda que personalíssima, se a ação já tiver sido intentada por quem de direito, caso haja o posterior falecimento do autor, seus herdeiros poderão dar prosseguimento ao feito, quando este não tiver sido extinto (CC, 1.606).
Visando consagrar o princípio da proteção integral à criança, presente no texto do ECA, foi disposto, no art. 26, parágrafo único, a possibilidade de reconhecimento da paternidade antes mesmo do nascimento do filho, possuindo o nascituro legitimidade para ingresso com a referida ação, sendo representado pela sua mãe, tendo em vista a possibilidade de realização do exame de DNA ainda no período gestacional.
Frisa-se que, de acordo com a Súmula 301, do STJ, a recusa do provável pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção relativa de paternidade.
No polo passivo da ação figurará o pretenso pai, e caso este já esteja falecido, seus herdeiros. A investigação de paternidade poderá ser cumulada com pedido de fixação de alimentos, regulamentação de visita e até mesmo com indenização por dano moral afetivo, em decorrência do abandono.
Negatória de Paternidade
O Código Civil Brasileiro confere ao marido, suposto pai, o direito de contestar a paternidade de filhos havidos na constância do casamento (CC, art. 601). Isso ocorre porque, no mesmo diploma legal, foi consagrada a presunção (relativa) de que os filhos concebidos durante o vínculo conjugal são filhos do marido (CC 1.597). Neste ponto, com a evolução da jurisprudência (STF, temas 498 e 809) para reconhecer a igualdade entre o casamento e a união estável, as presunções de paternidade não mais se limitam ao casamento (DIAS, 2021, p. 274).
Para Maria Berenice Dias, a ação negatória de paternidade deve ter como fundamento a ocorrência de vício de vontade, ou seja, a indução daquele suposto pai por erro, dolo ou coação, de que o filho nascido de sua esposa também é seu. Da mesma forma, defende a autora a necessidade de se provar a inexistência do vínculo de filiação socioafetiva entre supostos pais e filhos (DIAS, 2021, p. 276).
Nessa linha, entende o Superior Tribunal de Justiça que, para que seja julgada procedente a negatória de paternidade, além da ausência do vínculo genético, é fundamental a comprovação de inexistência da ligação socioafetiva, prova que compete ao suposto pai produzir (STJ - REsp 1.664.554/SP).
Trata-se de ação personalíssima, somente podendo ser promovida pelo pai registral. Com eventual morte deste, após a propositura da ação, seus herdeiros podem prosseguir no feito (CC, 1.606).
Guarda
Nas ações relativas à guarda de menores, pode ser requerida tanto a fixação quanto de modificação da guarda, entre as espécies existentes, que variam entre a guarda unilateral, fixada a apenas um dos genitores, bem como a compartilhada ou alternada entre os pais.
Nessas demandas, há a possibilidade de ser requerida a guarda provisória da criança ou do adolescente, que será concedida antes mesmo da decisão judicial definitiva. Para a concessão da guarda provisória, deverão ser demonstrados os requisitos comuns aos pedidos liminares, ou seja, a “fumaça do bom direito” e o perigo da demora, atestando a capacidade daquele guardião de cuidar do menor, além dos perigos que este ficará exposto, diante da demora no aguardo da decisão judicial final. Preferencialmente, o juiz deverá ouvir ambos os genitores antes de decidir sobre a guarda provisória, salvo se a proteção dos interesses dos filhos recomendar o contrário (CC, 1.585).
Neste tipo de ação, a legitimidade ativa caberá ao responsável que pretende obter ou modificar a guarda do menor, figurando no polo passivo da demanda o outro genitor.
Caso seja estipulada a guarda unilateral, em regra, será definido também o regime de convivência ao pai que não for o guardião, de modo a preservar os laços afetivos parentais, observando sempre o melhor interesse da criança, bem como o princípio da proteção integral.
Regime de Convivência
Com o decorrer do tempo, a doutrina familiarista substituiu o termo “direito de visitas”, antes muito utilizado, pela expressão mais apropriada, denominada "regime de convivência”. Isso porque, afirmar que ao genitor, que não possui a guarda do filho, é garantido o direito de conviver com sua prole, é reconhecer que apenas o estabelecimento de dias determinados para visitação, não é nem de longe o suficiente para perpetuação do vínculo entre pai e filho. Os encargos inerentes ao poder familiar não se limitam a garantir ao genitor a companhia de seu filho em dias determinados, pois é obrigação dos pais garantir efetiva convivência familiar com os mesmos (DIAS, 2021, p. 393).
Nos casos em que houver divergência entre os pais, a mediação mostra-se uma das ferramentas mais adequadas a solucionar a controvérsia, podendo o juiz, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público, buscar orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe (CC, 1.584, §3º).
A partir do momento em que for homologado judicialmente o acordo de convivência, torna-se obrigação dos pais respeitarem os horários de visitação ajustados. Ao pai ou à mãe que se recuse a cumpri-lo ou que promova obstáculos ao seu cumprimento, é cabível a imposição de multa com caráter coercitivo, ou seja, com a intenção de dar efetividade ao mandamento judicial. Essas medidas são válidas tanto para que um dos pais cumpra o regime de visitação como para que o outro entregue o menor, conforme previamente acordado por ambos.
Assim, estipulado o regime de visitas, pode o juiz, de ofício ou a pedido, fixar o valor da multa para cada visita que seja descumprida, revertendo-se esse valor em benefício do filho. O objetivo dessa multa não é sancionar o pai faltoso, mas sim compeli-lo a cumprir a obrigação nos moldes ajustados anteriormente. Não há necessidade de ingresso com execução de fazer ou não fazer, a referida medida poderá ser requerida nos próprios autos da ação em que for estipulado o regime de convivência (DIAS, 2021, p. 401).
O Código de Processo Civil, estabelece, ainda, que o descumprimento de decisão judicial que fixe o regime de convivência, evidencia a prática de alienação parental, bem como pode configurar ato atentatório à dignidade da justiça (CPC, 77, IV), o que também enseja aplicação de multa, além de sanções penais (CPC, 77, §2º).
Alimentos
Nas ações relativas a alimentos, podem ser requeridos a sua concessão, revisão, bem como a extinção do dever de pagar.
Quando não forem pagos de forma voluntária, o alimentando pode valer-se de ação judicial para compelir seu genitor(a) ao pagamento das prestações que destinam-se, não somente a garantir-lhe a subsistência, mas também a proporcionar o mesmo padrão de vida de seus pais.
Diante da urgência dos interesses envolvidos, as ações de fixação e revisão de alimentos possuem rito célere, obedecendo à legislação específica, Lei nº 5.478/1968, chamada de Lei de Alimentos. Em que pese a ação seguir o rito especial, contido na referida norma, após a fixação dos alimentos e seu trânsito em julgado, a execução das prestações segue pelo procedimento da lei processual comum, disposto no Código de Processo Civil Brasileiro. Da mesma forma, também há disposições presentes na lei processual comum a serem aplicadas na ação de alimentos, como é o caso da tramitação do processo durante as férias forenses (CPC, 215, II), bem como a estipulação do valor da causa, que deve corresponder à soma de 12 (doze) prestações mensais pretendidas pelo autor da demanda (CPC, 292, III).
Para que seja seguido o procedimento da Lei de Alimentos, deve ser demonstrada, de plano, a prova da filiação, por meio da certidão de nascimento, podendo, contudo, ser dispensada a produção inicial de prova, nos casos previstos no art. 2º, §1º, da referida norma.
As ações de exoneração da obrigação de pagar, por sua vez, seguem o procedimento comum ordinário.
Competência
A regra da competência do foro para ingresso da ação de alimentos foi definida pelo CPC, em seu art. 53, II, estipulando-se o foro do domicílio ou residência do alimentando, e quando este for menor ou incapaz, a residência de seus representantes. A mesma regra aplica-se à ação revisional e exoneratória de alimentos, independentemente de onde tenha tramitado a ação de fixação. Caso haja mudança de domicílio do alimentando, este pode optar em ingressar com a execução dos alimentos no local onde foi decidida a causa ou pelo juízo de seu novo domicílio (CPC, 528 e 516, II).
Legitimidade
Na ação de alimentos, advinda da relação de filiação, a legitimidade ativa para a propositura da ação pertence ao alimentando e, sendo este menor ou incapaz, deverá ser representado ou assistido por seu representante legal.
Importante destacar o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a fim de conferir legitimidade ao Ministério Público para ajuizar ação de alimentos na condição de substituto processual de crianças e adolescentes, independentemente do exercício do poder familiar dos pais, ou do fato de o menor se encontrar em situações de risco, tampouco se existe órgão da Defensoria Pública na comarca (STJ, Súmula 594).
Demais Particularidades
Outra peculiaridade desta ação é a possibilidade de seu ingresso sem a presença de advogado, caso em que o interessado poderá dirigir-se diretamente ao juízo competente e formular o pedido, sendo depois encaminhado ao órgão da Defensoria Pública para prosseguimento do feito (Lei 5.478/68, art. 2º).
Quanto à concessão do benefício da justiça gratuita, o STJ firmou entendimento no sentido de que, ajuizada a ação de alimentos por menor de 18 anos, não é admissível condicionar a concessão da gratuidade de justiça à demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal, presumindo-se, no caso dos menores de idade, a insuficiência de recurso. Tal fato não impede que a outra parte demonstre o contrário e requeira a revogação do benefício (STJ, REsp 1.807.2016-SP).
Importante questão, que gera divergência na jurisprudência, diz respeito à possibilidade ou não da mãe ter legitimidade para prosseguimento na execução de alimentos propostos na época em que a mesma era guardiã do filho, quando posteriormente a guarda do menor for transferida ao pai, devedor dos alimentos.
Neste ponto, a 4ª Turma do STJ entendeu pela possibilidade da genitora ser ressarcida, ainda que a guarda tenha sido transferida posteriormente ao devedor (STJ, 4ª Turma, REsp 1.410.815-SC). Em contrapartida, entendeu a 3ª Turma do STJ que a mãe não poderá prosseguir na execução dos alimentos, em nome próprio, visando o recebimento dos valores relativos aos débitos alimentares vencidos, após a transferência da titularidade da guarda, não havendo que se falar em sub-rogação, considerando o caráter personalíssimo do direito de receber alimentos (STJ, 3ª Turma, REsp 1.771.258-SP).
Prisão do Devedor
O Código de Processo Civil previu a possibilidade de ser decretada a prisão do devedor de alimentos, pelo prazo de 1 (um) a 3 (três meses), em decorrência do não pagamento das prestações devidas, bem como no caso de o juízo não aceitar as justificativas apresentadas pelo devedor (CPC, 528, §3º).
O débito que autoriza a prisão é o que compreende até as 3 (três) prestações vencidas anteriormente à execução e as que se vencerem no curso do processo. A prisão, de acordo com CPC, deverá ocorrer em regime fechado e o cumprimento da pena não exime o devedor de efetuar o pagamento das prestações vencidas e vincendas. No momento em que for pago o débito alimentar, será suspensa a ordem de prisão.
Referências
BRASIL. Código de Processo Civil (2015). Código de Processo Civil Brasileiro. Brasília, DF: Senado, 2015.
BRASIL. Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968. Dispõe sobre as Ações de Alimentos e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 27 jul. 1968.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 16 jul. 1990.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 14. ed. Salvador: Juspodivm, 2021