A Reforma Trabalhista e o Contrato de Trabalho Intermitente

Explore como o contrato de trabalho intermitente, criado pela reforma trabalhista, afeta as relações laborais e as condições de emprego no Brasil.

A reforma trabalhista brasileira trouxe significativas mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) relacionadas ao direito do trabalho e ao processo do trabalho. No direito do trabalho, talvez a alteração mais controversa seja a instituição do contrato de trabalho intermitente.

 Este novo modelo de contrato permite que a prestação de serviços ocorra de forma descontínua, alternando períodos de atividade e inatividade. Essa modalidade visa flexibilizar as relações de trabalho, formalizando atividades informais e potencialmente reduzindo o desemprego.

O que é Trabalho intermitente?

Trata-se da figura inserida no art. 452-A da CLT no capítulo sobre o contrato individual do trabalho. O conceito legal do contrato de trabalho intermitente é extraído do artigo 443, §3º da CLT, sendo aquele no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas.

Art. 443.  O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.  

§ 3o  Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.  

Quais são as Características do Contrato de Trabalho Intermitente?

Com base na definição acima se percebe que o contrato forma o vínculo de emprego, porém, não garante ao empregado salário e serviços fixos. Isso porque o empregador tem a faculdade de convocar o obreiro quando julgar pertinente, caso em que informará a jornada com três dias de antecedência, pelo menos. A partir da chamada, o empregado terá um dia útil para a resposta, mas o seu silêncio importará em recusa. Cabe ressaltar que a falta de aceitação da oferta não descaracteriza a subordinação inerente à relação de emprego.

Percebe-se que o contrato de trabalho intermitente trata de forma peculiar a habitualidade e a subordinação, elementos fáticos jurídicos necessários à formação do vínculo de emprego. Como se sabe, a relação de emprego exige, cumulativamente, que o serviço seja prestado por pessoa física, com pessoalidade, onerosidade, subordinação e não eventualidade. No trabalho intermitente, a lei admite como relação de emprego o serviço sem a habitualidade. Já a subordinação incidirá a partir do momento em que o empregado aceitar determinado serviço, pois, conforme visto, o empregado pode recusar a proposta do empregador e tal conduta não configura insubordinação.

Nesse cenário, o modelo inaugurado pela reforma trabalhista foi recebido por alguns com entusiasmo, sob o argumento de que o trabalho intermitente regularizaria os “bicos”, ou seja, os trabalhos informais, e diminuiria o número de desempregados. Na prática, a contratação formal do trabalho intermitente pode reduzir as estatísticas do desemprego, mas não significa que os empregados estejam efetivamente trabalhando.

O Contrato de Trabalho Intermitente e a Precarização das Condições de Trabalho

De outro lado, as regras do trabalho intermitente, da forma como concebidas pela reforma trabalhista, contribuem para a precarização das condições de trabalho sob diversos aspectos. É importante ressaltar que, neste contrato, o empregado não sabe previamente quanto vai receber ou quando irá trabalhar, tendo em vista a alternância entre períodos de atividade e inatividade e forma da remuneração, definida pela quantidade de horas trabalhadas. Lado outro, no contrato comum, a remuneração se dá de acordo com uma jornada mensal de labor.

Além da imprevisibilidade do trabalho e do salário, a própria jornada é indefinida. Inclusive, o tempo de inatividade não é considerado tempo à disposição, o que retira obrigações trabalhistas do empregador. Ainda, essa característica do contrato intermitente retira do empregador uma obrigação inerente ao vínculo de emprego, qual seja, a de fornecer trabalho ao obreiro durante o seu tempo à disposição.

Perceba-se que o trabalho intermitente não garante ao empregado nenhum ganho mínimo mensal, tampouco estabelece um prazo máximo de inatividade. Por tal motivo, argumenta-se que a reforma trabalhista, no ponto em que cria a nova figura, apresenta-se incompatível com a Constituição e com a Convenção de nº 95 da OIT porque viola, dentre outros direitos, a garantia do salário mínimo, justo e razoável. Outrossim, afirma-se que o contrato de trabalho tem a aptidão para transferir os riscos do empreendimento ao empregado, o que afronta um dos princípios basilares do Direito do Trabalho, o da alteridade, previsto no art. 2º da CLT.

Conforme visto, a reforma trabalhista inovou ao possibilitar a contratação formal para a prestação de serviços de forma não contínua, independentemente do tipo de atividade do empregador. No entanto, a relação de emprego, no trabalho intermitente, possui características próprias, distintas do contrato comum ao direito do trabalho. Neste novo modelo, o empregado receberá conforme as horas trabalhadas, sem a predefinição de jornada mensal. Assim, a legalidade do trabalho intermitente tem sido fortemente questionada.

Conclusão

A reforma trabalhista, especialmente com a introdução do contrato de trabalho intermitente, representa um marco na modernização das relações laborais no Brasil. Este tipo de contrato busca flexibilizar e formalizar vínculos de trabalho, adaptando-se às necessidades do mercado e à realidade econômica. No entanto, é imprescindível que sejam observadas as garantias legais para assegurar que os direitos dos trabalhadores sejam protegidos, evitando a precarização e garantindo uma remuneração justa e adequada. A efetiva implementação dessa modalidade requer vigilância contínua e ajustes conforme as demandas sociais e econômicas.