Há aproximadamente 16 anos desde a promulgação da Lei 11.445/2007, que passou a definir diversos pontos imprescindíveis para a instauração e funcionamento do serviço de saneamento básico, como as diretrizes do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), os princípios aplicados aos prestadores de serviço e o papel das agências regulatórias na fiscalização dos contratos e serviços, ocorria também a separação do planejamento, regulação e a prestação dos serviços por meio deste marco regulatório. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações em Saneamento (SNIS, 2007), em 2006, o índice médio nacional de abastecimento de água era de cerca de 93,1%, valores relativamente elevados, quando comparados aos valores referentes à coleta de esgoto, com índice médio nacional de 48,3% e, de apenas 32,2% para o tratamento desse esgoto coletado, demonstrando escassez e extrema precarização do serviço oferecido à população. Destaca-se a ineficiência do atendimento aos cidadãos de baixa renda, que inclusive, explicitam a desigualdade regional causada pela menor capacidade de pagamento quando comparados, por exemplo, os dados das regiões norte e nordeste com as regiões sul e sudeste, relacionando este déficit de investimento com o perfil de renda dos seus consumidores (LEONETI; PRADO; OLIVEIRA, 2011, p. 335).
Atualmente, levando em consideração dados de 2018 do Snis, 83,6% dos brasileiros possuíam acesso ao serviço de abastecimento de água, enquanto 53,2% da população possuía acesso aos serviços de coleta de esgoto, dos quais apenas 46,3% possuíam tratamento. Significa, em termos quantitativos, que quase 35 milhões de pessoas ainda não têm acesso a água tratada no Brasil e que, cerca de 100 milhões de pessoas vivem sem coleta de esgoto, causando impactos diretos na saúde da população quanto à contaminação e à mortalidade por doenças que poderiam ser evitadas com o efetivo investimento ao setor de saneamento básico. Neste sentido, insta pontuar que, segundo dados do IBGE, a falta de saneamento mata 11 mil pessoas por ano no país, sendo a maior parte desses óbitos pertencentes a idosos com 60 anos ou mais (VASCO, 2022).
Tais consequências podem ser observadas em países menos favorecidos economicamente, pois evidenciam que grande parte da parcela da população que não possui acesso aos serviços de saneamento básico reside em países em desenvolvimento, exigindo um maior fortalecimento do papel do Estado para garantir a oferta adequada do serviço à população. Infere-se que no Brasil, apesar do avanço paulatino no setor com a instituição do Marco regulatório e suas sucessivas atualizações, não houve a efetividade esperada tanto em relação aos desafios da universalização do saneamento quanto em relação à manutenção do arranjo institucional histórico que, apenas atuou a fim de garantir a hegemonia dos grupos diretamente interessados nele. Cabe mencionar que a noção de universalidade confere à possibilidade de toda a população poder lograr uma ação ou serviço de que necessite, sem qualquer barreira de acessibilidade, seja ela legal, econômica, física ou cultural e que, diante dos dados, remetem uma meta distante de êxito no Brasil (CARCARÁ; SILVA; MOITA, 2019, p. 495). Os impactos causados pela falta de acesso ao saneamento apresentam impacto direto sobre as atividades econômicas, pois interfere na produtividade do trabalho e na capacidade de desempenho dos estudantes, causando, em longo prazo, efeitos expressivos sobre a renda das famílias, que para além da mortalidade, precisam lidar com o afastamento das suas atividades cotidianas por causa das doenças de veiculação hídricas e que só em 2021, de acordo com o Ministério da Saúde (DATASUS 2021), foram registradas cerca de 130 mil internações provocadas pela contaminação da água (VARELLA, 2023).
Neste sentido, nos compete compreender quais as barreiras enfrentadas não só no Brasil, mas por todos os demais municípios e países que, diante da dificuldade de investimentos e aprimoramento do setor, optaram pela desestatização dos seus serviços, e ainda, quais foram suas respectivas experiências, uma vez que após passarem a gestão aos operadores privados, optaram pela adoção do processo de remunicipalização ou reestatização, enquanto os estados brasileiros têm insistido em prosseguir com as tratativas privatistas para o setor de saneamento básico no país. Ressalta-se que para além da análise de eficácia, o trabalho aborda o objetivo de universalização, uma vez que o déficit aos serviços de saneamento está concentrado, prioritariamente, nas populações de baixa renda, baixa escolaridade e autodeclaradas pardas. (MELO, 2023, p. 25).
Tais resultados evidenciam, portanto, a maior necessidade de promoção da equidade e universalização na prestação dos serviços de saneamento básico através do atendimento às populações mais vulneráveis e deficitárias.