A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial do Ministério Público Federal (MPF) para condenar um professor por improbidade administrativa, em razão do acúmulo da docência em regime de dedicação exclusiva no serviço público com atividade remunerada em um colégio particular.
O MPF ajuizou ação contra um professor do Instituto Federal de Sergipe por violação à Lei 8.429 de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa. Para o MPF, o réu obteve enriquecimento ilícito e causou lesão aos cofres públicos e à moralidade administrativa porque recebeu gratificação de dedicação exclusiva sem, em contrapartida, cumprir a totalidade de sua obrigação.
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) manteve a sentença que julgou a ação improcedente por entender que a acumulação indevida não foi tão grave a ponto de caracterizar violação dos deveres de honestidade e lealdade às instituições.
A corte regional registrou que o professor, condenado em processo administrativo disciplinar, estava devolvendo a gratificação recebida durante a acumulação indevida, por meio de desconto parcelado em folha.
Desnecessidade de Comprovação de Prejuízo ao Erário
O ministro Herman Benjamin, relator do recurso no STJ, afirmou que está presente no caso o dolo de obter vantagem em prejuízo da administração pública, pois "o réu, professor de regime de dedicação exclusiva, tinha consciência de que era proibido ter outra atividade remunerada de docente na iniciativa privada, e ainda assim a exerceu".
Segundo o magistrado, "o fato de haver devolução por desconto em contracheque não descaracteriza improbidade, pois a restituição parcelada não significa ausência, mas mitigação do prejuízo".
De todo modo – acrescentou –, a jurisprudência do STJ tem entendimento firmado de que, para a configuração dos atos de improbidade que atentam contra os princípios da administração (artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa), não se exige a comprovação de enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário (AREsp 818.503).
Herman Benjamin apontou que a mesma situação dos autos já foi analisada em outros julgamentos do STJ, como no REsp 1.445.262, quando se concluiu que o professor em regime de dedicação exclusiva que acumula função remunerada em outra instituição de ensino comete ato de improbidade previsto no artigo 11.
Ao dar provimento ao recurso especial e condenar o professor pela prática da improbidade, o ministro determinou o retorno do processo à segunda instância para que o TRF5 fixe as penas.
Número do Processo
REsp 1.672.212
Ementa
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE DOCENTE EM REGIME DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. CONCORRÊNCIA COM OUTRA ATIVIDADE REMUNERADA. CONFIGURAÇÃO DE ATO ÍMPROBO.
1. Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou Ação de Improbidade Administrativa, objetivando a condenação do réu por indevida acumulação do cargo de Professor do Instituto Federal de Sergipe (IFS), em regime de dedicação exclusiva, com outra atividade remunerada de docente na iniciativa privada.
2. Embora o agravante sustente que não tinha consciência da ilegalidade, o regime de dedicação exclusiva que lhe era imposto encontra-se previsto no Decreto 94.664/1987, que permite aos docentes apenas dois regimes: dedicação exclusiva ou tempo parcial. A dedicação exclusiva gera àquele que por ela opte uma gratificação específica, fato admitido pelo Tribunal de origem ao consignar no acórdão recorrido que "a quantia recebida a título de gratificação de dedicação exclusiva está sendo devolvida por meio de desconto em contracheque." (fl. 289, e-STJ). Não há como afastar o dolo no caso. Houve, como é incontroverso nos autos, indevida percepção de gratificação especificamente paga pela exclusividade, entre 3.2.2003 e 2.8.2010.
3. "Comete ato de improbidade administrativa previsto no art. 11, 'caput', e I, da Lei n. 8.429/92 o professor universitário submetido ao regime de dedicação exclusiva que acumula função remunerada em outra instituição de ensino" (AgInt no REsp 1.445.262/ES, Rel. p/Acórdão Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 14.3.2018). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.473.709/MG, Relator Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 18.6.2018.
4. O fato de haver devolução por desconto em contracheque não descaracteriza a improbidade, pois a restituição parcelada não significa ausência, mas mitigação do prejuízo. E mesmo que isso pudesse ser superado, não assistiria razão ao recorrente, pois o entendimento dominante no Superior Tribunal de Justiça é o de que, "para a configuração dos atos de improbidade que atentam contra os princípios da Administração (art. 11 da LIA), não se exige a comprovação do enriquecimento ilícito do agente ou prejuízo ao erário." (AgInt no AREsp 818.503/RS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 17.10.2019). Na mesma linha: AgRg no AREsp 712.341/MS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 29/6/2016; AgRg no AREsp 804.289/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 24.5.2016.
5. Agravo Interno não provido.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: ""A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator."
Brasília, 27 de abril de 2021(data do julgamento).
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator