Dispensa de Administrador por Diretor com Procuração sem Firma Reconhecida é Válida

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho acolheu o recurso da Agência de Promoção de Exportações do Brasil (Apex-Brasil) para validar a dispensa de um administrador de empresas de Brasília (DF) ocorrida em novembro de 2013. A demissão havia sido considerada inválida anteriormente por ter sido efetivada pelo diretor de negócios cuja procuração que delegava poderes, embora assinada, não tinha a firma do presidente da agência reconhecida. Todavia, segundo o colegiado, essa obrigação não existe.

 

Dispensa Imotivada

A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) atua para promover produtos e serviços brasileiros no exterior e atrair investimentos estrangeiros para setores estratégicos da economia brasileira. Na reclamação trabalhista, o administrador disse que fora admitido em 2007, por meio de concurso público, e, após seis anos de serviço, foi surpreendido com a demissão. 

Ele sustentava que, embora instituída, por lei, como um serviço social autônomo, a Apex integra a administração pública indireta e é custeada, essencialmente, com recursos públicos. Assim, sua demissão deveria ter sido motivada.

 

Norma Interna

O juízo de primeiro grau validou a dispensa, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) por entender que a agência, mesmo não tendo a obrigação de motivar a dispensa de seus empregados, teria deixado de atender normas internas relativas à autoridade competente para firmar o ato. 

Segundo o TRT, a procuração em que o presidente da Apex delegava poderes ao diretor de negócios para a dispensa do empregado não tinha eficácia, pois estava sem firma reconhecida. Com isso, determinou a reintegração do administrador, com o pagamento das parcelas salariais do período em que ficara afastado.

 

Ato Válido

O relator do recurso de revista da Apex, ministro Douglas Alencar, lembrou que a agência é instituída como serviço social autônomo, tem natureza de pessoa jurídica de direito privado e não integra a administração pública, o que retira a exigência da dispensa motivada dos empregados. 

Em relação à procuração, o ministro observou que as normas internas da empresa não impõem a necessidade de reconhecimento de firma “ou qualquer outra formalidade” para a eficácia da procuração de delegação de poderes para, em ato final, dispensar empregados. O relator também lembrou que, conforme a Súmula 456 do TST, a identificação do subscritor da procuração é suficiente para o reconhecimento da sua validade.
 
(RR/CF)

 

Número do Processo

RR-1306-75.2015.5.10.0001

 

Ementa

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. AGÊNCIA DE PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES DO BRASIL - APEX-BRASIL. SERVIÇO SOCIAL AUTÔNOMO. DISPENSA DE EMPREGADO. NORMAS INTERNAS. AUTORIDADE COMPETENTE. DELEGAÇÃO DE PODERES NO ÂMBITO DA RECLAMADA. REGULARIDADE DA PROCURAÇÃO. VALIDADE DA DISPENSA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CARACTERIZADA.

1. De acordo com o artigo 896-A da CLT, o Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, deve examinar previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.

2. No caso, considerando a jurisprudência desta Corte quanto à validade do instrumento de mandato e visando prevenir possível ofensa ao artigo 654, caput, do Código Civil, impõe-se o provimento do agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido.

II - RECURSO DE REVISTA REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. 1. JULGAMENTO EXTRA PETITA. Considerando a possibilidade de decidir o mérito em favor da Reclamada (art. 282, § 2º, do CPC/2015), desnecessário o exame da preliminar de nulidade por julgamento extra petita. 2. AGÊNCIA DE PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES DO BRASIL - APEX-BRASIL. SERVIÇO SOCIAL AUTÔNOMO. DISPENSA DE EMPREGADO. NORMAS INTERNAS. AUTORIDADE COMPETENTE. DELEGAÇÃO DE PODERES NO ÂMBITO DA RECLAMADA. REGULARIDADE DA PROCURAÇÃO. VALIDADE DA DISPENSA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CARACTERIZADA.

1. De acordo com o artigo 896-A da CLT, o Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, deve examinar previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.

2. O Tribunal Regional, reformando a sentença, declarou a nulidade da dispensa obreira, determinando a reintegração no emprego e o pagamento das parcelas relativas ao período do afastamento. A Corte de origem assinalou que, embora a Demandada, instituída como Serviço Social Autônomo, não tivesse a obrigação de motivar a dispensa de seus empregados, não foram por ela atendidas as normas internas relativas à autoridade competente para firmar o ato final da dispensa de empregados, observando que tal decisão competia ao Presidente da APEX, resguardada a possiblidade de delegação. Explicitou que, conquanto assinadas duas procurações pelo Presidente da APEX, delegando poderes ao Diretor de Negócios (Ricardo Santana) para a dispensa de empregados (autoridade que firmou a dispensa obreira de forma definitiva), um dos instrumentos não detinha eficácia uma vez que não apresentava o reconhecimento da firma, ao passo que no outro tal formalidade havia sido observada em data posterior(06/07/2015) ao ato de dispensa (ocorrido em novembro de 2013). Para alcançar tal conclusão, o Tribunal Regional realizou o cotejo dessa procuração - sem reconhecimento da firma - com outra existente nos autos - com reconhecimento da firma, mas sem a delegação de poderes à autoridade que deliberou sobre a dispensa obreira -, conferindo maior valor probante a essa última em razão do reconhecimento da firma. Ao analisar as referidas procurações, assinalou que, embora não fosse possível asseverar a falsidade das procurações em que delegados poderes à autoridade que deliberou sobre a dispensa do Autor, “certo é que elas não possuem o mesmo valor probante da procuração em que não consta nome do Sr. Ricardo Santana (...).” Com base na indicada irregularidade das procurações (ausência de reconhecimento da firma ou reconhecimento posterior ao ato de dispensa), concluiu pela nulidade do ato resilitório, pois deliberada, de forma definitiva, por autoridade que não detinha competência (Diretor de Negócios da Demandada).

3. Consoante anotado no acórdão regional, a jurisprudência desta Corte sedimentou-se no sentido de que inexiste obrigação de a Demandada (AGÊNCIA DE PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES DO BRASIL - APEX-BRASIL) - instituída como Serviço Social Autônomo, com natureza de pessoa jurídica de direito privado, não integrante da Administração Pública - motivar a dispensa de seus empregados (julgados do TST).

4. No caso, contudo, a decisão do Tribunal Regional embasou-se no descumprimento de norma interna, sob o fundamento de que ineficaz, para a delegação de poderes ali prevista, a procuração sem reconhecimento de firma, conferindo poderes ao Diretor de Negócios para assinar o ato final de dispensa de empregados. Nada obstante a conclusão alcançada, vale destacar que este Tribunal Superior, desde 1995 (Resolução 49/95), cancelou a Súmula 270/TST, que continha orientação no sentido de exigir o reconhecimento de firma para validade de instrumento de mandato, ressaltando-se que, nos termos do art. 654, caput, do Código Civil, a assinatura do outorgante na procuração é suficiente para validá-la, devendo o instrumento particular conter, conforme o disposto no § 1º do referido dispositivo legal, a “(...) indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.” Na hipótese, incontroverso que a procuração invalidada foi devidamente firmada pelo Presidente da APEX, observando-se ainda que as normas internas da empresa não impõem a necessidade de reconhecimento de firma ou qualquer outra formalidade para a eficácia da procuração relativa à delegação de poderes para, em ato final, dispensar empregados (Código Civil, art. 114). É certo ainda que, segundo a reiterada jurisprudência deste Tribunal Superior, a identificação do subscritor da procuração é o bastante para o reconhecimento da respectiva validade, conforme se infere da diretriz da Súmula 456/TST. Julgados do TST.

5. Nesse contexto, a decisão do Tribunal Regional, no sentido de reconhecer a nulidade da dispensa, por considerar a invalidade de procurações sem reconhecimento de firma, mostra-se dissonante da jurisprudência desta Corte Superior, caracterizando-se, pois, a transcendência política do debate proposto, bem como ofensa ao art. 654, caput, do Código Civil. Recurso de revista conhecido e provido.

 

Acórdão

ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, I - dar provimento ao agravo de instrumento para, convertendo-o em recurso de revista, determinar a reautuação do processo e a publicação da certidão de julgamento para ciência e intimação das partes e dos interessados de que o julgamento do recurso de revista se dará na sessão ordinária subsequente ao término do prazo de cinco dias úteis contados da data da publicação da respectiva certidão de julgamento (RITST, arts. 256 e 257 c/c art. 122); e II - conhecer do recurso de revista quanto ao tema “SERVIÇO SOCIAL AUTÔNOMO. DISPENSA DE EMPREGADO. NORMAS INTERNAS. DELEGAÇÃO DE PODERES NO ÂMBITO DA RECLAMADA. REGULARIDADE DA PROCURAÇÃO. VALIDADE DA DISPENSA”, por ofensa ao art. 654, caput, do Código Civil, e, no mérito, dar-lhe provimento para, restabelecendo a sentença, reconhecer a validade da dispensa do Reclamante efetivada pela Demandada, afastando, por conseguinte, a reintegração no emprego e o pagamento das parcelas decorrentes. Inverte-se o ônus da sucumbência e determina-se o pagamento de custas processuais pelo Reclamante no importe de R$4.000,00, calculadas sobre o valor dado à causa (R$200.000,00), do qual se encontra dispensado em face do deferimento dos benefícios da justiça gratuita.

Brasília, 1 de setembro de 2021.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES

Ministro Relator

 

Fonte

TST