A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Vale S.A. contra decisão que determinara o restabelecimento integral do plano de saúde de um engenheiro de Parauapebas (PA), incluindo sua esposa como dependente. Ele foi demitido durante tratamento de câncer e conseguiu, na Justiça, restabelecer o benefício, mas a empresa sustentava que a decisão valeria apenas para ele.
Câncer
Na reclamação trabalhista originária, o engenheiro disse que, em 2011, fora diagnosticado com um tumor cancerígeno de nove centímetros entre o pulmão e o coração. Em seguida, teve de submeter a um longo tratamento, com sessões de quimioterapia e implante de medula.
Em fevereiro de 2015, ele foi dispensado e ajuizou reclamação trabalhista a fim de anular a dispensa. Em tutela antecipada, pediu o restabelecimento do plano de saúde, para que pudesse dar continuidade ao tratamento.
Todavia, o plano foi restabelecido apenas para ele, sem a inclusão da esposa como dependente. Na mesma decisão, também foi deferida a reintegração do empregado. Segundo a decisão, a dispensa fora discriminatória, em razão da doença grave.
Premissa Básica
No mandado de segurança, o engenheiro argumentou que seu pedido de tutela antecipada surgiu de premissa básica: se o seu contrato de trabalho estivesse ativo, seu plano de saúde e o de sua dependente também estariam. Segundo seu argumento, o acessório sempre irá seguir o principal, e o pedido dizia respeito ao restabelecimento do benefício nos mesmos moldes de quando era empregado.
Resgate
O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA) concedeu a segurança, por entender que a cobertura do plano de saúde aos dependentes seria acessória ao benefício principal. Assim, o restabelecimento do plano do empregado de forma regular implica o resgate do benefício nos moldes do anteriormente cancelado, inclusive com a extensão a todo grupo familiar inscrito na vigência do contrato de trabalho.
Condição Original
O relator do recurso de revista da Vale, ministro Evandro Valadão, relator do caso, observou que o empregado pediu, em tutela antecipada, a reintegração ao trabalho nas mesmas condições anteriormente exercidas, “abrangendo, por óbvio, a extensão da cobertura do plano de saúde a seus familiares”. Segundo ele, a concessão de medida que antecipa os efeitos do provimento quanto ao plano de saúde deve abranger, de fato, sua extensão à esposa do empregado.
A decisão foi unânime.
(RR/CF)
Número do Processo
RO-475-16.2017.5.08.0000
Ementa
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA INTERPOSTO PELO LITISCONSORTE PASSIVO. ATO DITO COATOR PRATICADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. 1. ILEGALIDADE NO RESTABELECIMENTO DO PLANO DE SAÚDE. DISPENSA LEGÍTIMA. PODER POTESTATIVO DO EMPREGADOR. EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES OBJETIVOS PROPOSTOS PELO IMPETRANTE. IMPUGNAÇÃO A OUTRA DECISÃO JUDICIAL QUE NÃO O ATO COATOR. NÃO CONHECIMENTO.
I. O reclamante na ação matriz impetrou a presente ação mandamental em face da decisão da juíza de primeiro grau que limitou, em sede de tutela provisória, o restabelecimento da cobertura do plano de saúde somente ao trabalhador, e não a seus dependentes.
II. O Tribunal Regional concedeu-lhe a segurança pleiteada para estender a cobertura também à sua dependente, esposa do reclamante.
III. Nas razões recursais, a litisconsorte passiva alega que a decisão judicial que deferiu a tutela provisória para restabelecer o plano de saúde do próprio trabalhador deve ser cassada.
IV. Todavia, observa-se que o limite objetivo da lide deste mandamus, estabelecido pelo impetrante ora recorrido, é a impugnação à decisão da magistrada de primeiro grau que restringiu a cobertura do plano de saúde, em sede de tutela provisória, à pessoa do reclamante, não abrangendo sua esposa.
V. Assim, não pode a litisconsorte passiva, em sede de recurso ordinário em mandado de segurança, impugnar decisão outra, que não o ato dito coator, com argumentos que dizem respeito exclusivamente à própria ação matriz, e não a essa ação mandamental.
VI. Recurso ordinário de que se não conhece, no tema.
2. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. DECISÃO QUE LIMITOU O RESTABELECIMENTO DE PLANO DE SAÚDE AO RECLAMANTE REINTEGRADO. SEGURANÇA CONCEDIDA PELO TRIBUNAL REGIONAL. EXTENSÃO DA COBERTURA DO PLANO DE SAÚDE À ESPOSA DO RECLAMANTE. CONSEQUÊNCIA NECESSÁRIA DO PRÓPRIO RECONHECIMENTO DA PRETENSÃO. CONSECTÁRIO LÓGICO DA DECISÃO. RESTABELECIMENTO INTEGRAL DA LESÃO. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. RECONHECIMENTO DA PRETENSÃO EM TODA A SUA EXTENSÃO. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO.
I. Na petição inicial da ação matriz tombada sob o nº. 0000983-91.2016.5.08.0130, o reclamante pleiteou, em sede de tutela provisória, o restabelecimento da cobertura do plano de saúde fornecido pela reclamada a fim de continuar o tratamento contra a doença adquirida (câncer) (fls. 29-39 - aba “Visualizar todos os PDFs”). Nesse sentido, colaciono o seguinte trecho acerca da causa de pedir da referida petição inicial: “o Reclamante sempre se serviu do plano de saúde fornecido pela Reclamada, para dar andamento em seu tratamento e exames, que era obrigado a realizar, semanalmente, EXAMES DE SANGUE, HEMOGRAMA, VACINAS PARA IMUNIDADES ENTRE OUTROS. Todavia, conforme se vê pelos documentos anexos, o Reclamante teve o seu contrato de trabalho rescindido em 09/02/2015, motivo pelo qual não poderá mais usufruir dos tratamentos junto a redes credenciadas da operadora de plano de saúde da Reclamada, o que por certo irá lhe causar prejuízos irreparáveis e irreversíveis, vez que sempre dependeu do plano de saúde para obter guarida em seu tratamento. Assim, diante de todo o exposto, requer o Reclamante que a Reclamada seja compelida a dar continuidade ao seu plano de saúde, até decisão final, afim [sic] de que o Reclamante possa dar continuidade em seu tratamento médico.” (fls. 29-333 – aba “Visualizar todos os PDFs”). Ao receber a aludida demanda, o magistrado deferiu o pleito de tutela provisória, determinando que “(...) não há dúvida de que a conduta da reclamada foi abusiva, uma vez que procedeu à dispensa discriminatória do reclamante, eis que este é portador de doença grave, qual seja câncer (...) Ante o exposto, DEFIRO o pedido de tutela provisória, nos termos do art. 300 do atual Código de Processo Civil, e determino que a reclamada restabeleça de imediato e de forma regular o plano de saúde do reclamante no prazo de dez dias, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (um mil reais) até o limite de R$30.000,00 (trinta mil reais)."
II. Sem embargo, essa decisão foi cumprida de forma parcial, tendo a empresa restabelecido o plano de saúde apenas do reclamante e não de sua esposa, dependente. Por isso, o reclamante apresentou petição requerendo a inclusão da cobertura do plano de saúde também a seus dependentes. Analisando a referida petição, a juíza trabalhista, Dra. MILENE DA CONCEIÇÃO MOUTINHO DA CRUZ, indeferiu o pleito, ora apontado como ato coator, nos seguintes termos: “1-Inicialmente esclareço ao reclamante que este requereu, em sede de tutela antecipada, tão somente o restabelecimento do plano de saúde para que pudesse dar continuidade em seu tratamento médico (fl. 04) e, em obediência ao princípio da adstrição, esse foi o objeto de análise da decisão de fl. 405, pelo que não há falar em restabelecimento em favor de dependentes” (fl. 20 – aba “Visualizar todos os PDFs”). Diante disso, o então reclamante da ação matriz impetrou o presente mandado de segurança.
III. O Tribunal Regional concedeu a segurança sob o fundamento de que “a ordem judicial consistente em determinar o restabelecimento do plano de saúde do empregado de forma regular, implica no resgate do benefício nos moldes do anteriormente cancelado, inclusive com a extensão a todo grupo familiar inscrito na vigência do contrato de trabalho”.
IV. Em face dessa decisão, a reclamada, litisconsorte passiva, interpõe recurso ordinário, alegando ser “possível depreender que o reclamante, em tutela antecipada, somente requereu o restabelecimento do seu plano de saúde, mas não de dependente seu”.
V. Todavia, extrai-se da reclamação trabalhista que o reclamante pleiteia a reintegração ao trabalho nas mesmas condições anteriormente exercidas, abrangendo, por óbvio, a extensão da cobertura do plano de saúde a seus familiares.
VI. Nesse contexto, a concessão de tutela provisória que antecipa os efeitos do provimento no que toca ao plano de saúde deve abranger, de fato, a extensão do plano de saúde à esposa do reclamante da ação matriz, pelos seguintes fundamentos: A uma, porque o restabelecimento de uma lesão deve ser feito em sua integralidade. Desta feita, se o que o reclamante, impetrante, postula é o restabelecimento do plano anterior, como se a lesão não tivesse sido praticada – como se dispensa supostamente discriminatória não tivesse ocorrido –, o direito deve ser restabelecido em sua plenitude para que ocorra o retorno ao status quo ante. A duas, porque o julgador deve, ao pronunciar o julgamento, ao reconhecer uma pretensão, contemplar na condenação o próprio direito em toda a sua extensão. Significa dizer que, no caso concreto, a inclusão da esposa do reclamante no plano de saúde consiste em um pressuposto lógico, em uma consequência necessária do próprio reconhecimento da pretensão. Dito de outro modo, o restabelecimento do plano para todos os membros da entidade familiar é o resultado prático da situação jurídica reconhecida na decisão judicial que antecipa os efeitos da tutela. Nesse contexto, se houve um ato arbitrário - de aparente dispensa discriminatória, no caso concreto -, e o que o reclamante requer é o restabelecimento de todo o direito, não é razoável o deferimento da pretensão de restabelecimento do plano de saúde somente para ele, excluindo sua esposa. Em outros termos, o que o reclamante deseja é o restabelecimento do plano de saúde em sua condição original. Por isso, o restabelecimento do plano – inclusive para sua esposa – é uma decorrência lógica do pedido, porque esse era o direito que foi violado com a dispensa supostamente arbitrária que está sendo discutida nos autos da ação matriz.
VII. Conclui-se, com isso, que o acórdão recorrido, que concedeu a segurança, merece ser mantido, com fundamentos acrescidos de que a lesão deve ser reparada em toda a sua amplitude, haja vista que o pedido reside na postulação do restabelecimento do plano de saúde nos termos originais em que concedido, somente havendo falar em retorno ao status quo ante se a lesão for integralmente reparada, razão pela qual a inclusão da esposa do reclamante no plano de saúde é consectário lógico do reconhecimento da antecipação dos efeitos do provimento final. VIII. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.
Acórdão
ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do recurso ordinário, apenas quanto ao tema “EXTENSÃO DA COBERTURA DO PLANO DE SAÚDE”, e, no mérito, negar-lhe provimento.
Brasília, 17 de agosto de 2021.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
EVANDRO VALADÃO
Ministro Relator