Segunda Turma Confirma Rescisão de Compra de Lotes da Terracap por Falta de Infraestrutura no Local

​A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a rescisão contratual e a restituição integral dos valores pagos por uma empresa na compra de lotes da Terracap, por falta de implementação de rede coletora de águas pluviais e quedas frequentes no fornecimento de energia elétrica no local. A Terracap é uma empresa pública responsável pela gestão dos imóveis pertencentes ao Distrito Federal.

Segundo o colegiado, embora a rescisão determinada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) tenha se baseado em documentação apresentada pela compradora depois do recurso de apelação em processo que ajuizou contra a Terracap, foi comprovado que houve intimação da empresa pública para se manifestar a respeito – o que ela não fez.

 

Terrenos Comprados para Implantação de Indústria

Os terrenos, localizados no Setor de Indústrias de Ceilândia, foram comprados em licitação por R$ 5,75 milhões para a implantação de uma indústria de beneficiamento de cereais, como arroz e feijão. Ela alegou que não pôde concretizar seu projeto por conta da falta de infraestrutura na região, que havia sido prometida pela Terracap na ocasião da venda.

Em grau de apelação, o TJDFT decidiu que, embora o edital de licitação tivesse cláusula que vedasse ao comprador o direito de resilição contratual, é cabível ao Poder Judiciário rescindir o contrato quando demonstrado que houve omissão da vendedora em implantar a infraestrutura básica prevista em lei e no próprio edital (artigo 79, inciso III, da Lei 8.666/1993).

 

Descumprimento de Obrigação Legal e Editalícia

Ao STJ, a Terracap alegou que a compradora foi ardilosa ao apresentar nova documentação por meio de petição simples, após a apelação. Segundo a empresa pública, ela deveria ter sido intimada a se manifestar sobre os documentos, sob pena de caracterização de "decisão surpresa".

O ministro Francisco Falcão, relator do recurso especial, afirmou que a alegação da Terracap foi decidida pelo TJDFT após a oposição de embargos declaratórios, de maneira que a sua irresignação foi "evidentemente limitada ao fato de estar diante de decisão contrária a seus interesses, o que não viabiliza o referido recurso declaratório".

Segundo o magistrado, é fato incontroverso que o acórdão recorrido se baseou na documentação apresentada, após a apelação, pela compradora dos terrenos, que atestou – na avaliação do TJDFT – que a Terracap descumpriu obrigação legal e editalícia, pois se comprometeu a assegurar infraestrutura básica no prazo de quatro anos e não o fez.

 

Houve Reabertura de Prazo após Fatos Novos

O relator registrou que, como ressaltado pelo acórdão recorrido, após a juntada dos documentos – considerados fatos novos por terem sido apresentados após a apelação –, houve reabertura do prazo para a apresentação de contrarrazões, mas a Terracap se manteve em silêncio.

"Nesse panorama, não há como reconhecer a pretensão recursal especial, fundada na alegação de que não teria havido a necessária intimação para manifestação", pois a Terracap "não pode, agora, em razão de sua desídia, invocar nulidade com tal fundamentação", concluiu Francisco Falcão.

 

Número do Processo

REsp 1.800.062

 

Ementa

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RESCISÃO CONTRATUAL. FALTA DE IMPLEMENTAÇÃO DE REDE COLETORA. ÁGUAS PLUVIAIS. RESPONSABILIDADE DA RÉ. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA EM GRAU RECURSAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489 E 1.022, DO CPC/2015 NÃO CARACTERIZADA. DOCUMENTAÇÃO JUNTADA EM MOMENTO POSTERIOR À APELAÇÃO. ABERTURA DE PRAZO PARA A PARTE CONTRÁRIA, QUE NÃO SE MANIFESTOU.

I - Na origem, a empresa M.G. Comércio de Alimentos Ltda ajuizou ação contra a Companhia Imobiliária de Brasília - Terracap com o objetivo de obter a rescisão contratual, bem como a restituição integral dos valores pagos, relativamente aos lotes que adquiriu por força de licitação pública, sob a alegação de que a ré não teria implementado, na localidade, rede coletora de águas pluviais, e em razão de queda e oscilação da frequência no fornecimento de energia elétrica na região, o que impediu a autora de implantar a indústria de beneficiamento que pretendia.

II - A ação foi julgada improcedente, mas a decisão reformada, em grau recursal, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal de dos Territórios, à consideração que a empresa apelante teria comprovado suas alegações em momento posterior à interposição do recurso de apelação.

III - Não se vislumbra a apontada violação dos arts. 489 e 1.022, do CPC/2015, na medida em que o Tribunal a quo apresentou decisão devidamente fundamentada, inclusive mencionando de forma expressa o inconformismo da embargante em sede de julgamento dos aclaratórios.

IV - É fato incontroverso nos autos que o acórdão recorrido, ao reformar a sentença monocrática, baseou-se na documentação juntada pela apelante/autora, em momento posterior ao seu recurso de apelação, mas, também incontroverso é o fato de que houve despacho, com menção expressa aos arts. 9º, 10º, do CPC/2015, intimando a apelada, ora recorrente, para se manifestar a respeito, no que ela quedou-se inerte.

V - Alegação de violação dos arts. 9º, 10º, 11, 435, §1º e 437, §1º, do CPC/2015 não caracterizada, não sendo possível alegar nulidade em relação ao respectivo ponto.

VI - Recurso especial improvido.

 

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Herman Benjamin.

Dr(a). ANTONIO CARLOS SOBRAL ROLLEMBERG, pela parte RECORRIDA: M.G COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA - EP

Brasília (DF), 14 de setembro de 2021(Data do Julgamento)

MINISTRO FRANCISCO FALCÃO

Relator

 

Fonte

STJ