STJ Nega Produção de Prova para Cessar Pensão por Invalidez

​​​​​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso de uma empresa de ônibus que, no cumprimento de sentença condenatória por atropelamento, buscava produzir provas que demonstrassem que a vítima voltou a trabalhar e que, por isso, teria ocorrido causa extintiva da obrigação do pagamento de pensão alimentícia.

Para o colegiado, embora a instrução probatória na fase de execução e a eventual revisão do valor da pensão sejam possíveis, a produção da prova pretendida pela empresa não teria a capacidade de modificar a sentença, que reconheceu a invalidez total e permanente da vítima.

Segundo a empresa, em razão do retorno da vítima às atividades profissionais, deveria ser deferida a produção de prova pericial para comprovar a ocorrência de causa superveniente extintiva da obrigação de pagar a pensão.

Além disso, a empresa alegou que a vítima não teria mais direito à gratuidade de Justiça, pois recebeu parte das quantias previstas na sentença, o que teria modificado a sua situação financeira.

 

Produção de Prova no Cumprimento de Sentença

A ministra Nancy Andrighi, relatora, apontou que o recebimento de valores decorrentes do próprio processo em que a parte teve a gratuidade de Justiça não constitui fato novo capaz de motivar a revogação do benefício.

Ela destacou que é plenamente possível a instrução probatória durante o cumprimento de sentença, especialmente quando o executado, no momento da impugnação, invoca causas supervenientes impeditivas, modificativas ou extintivas da obrigação.

"Ademais, no que diz respeito à prestação de alimentos decorrente da prática de ato ilícito, não há que se falar, em princípio, em violação à coisa julgada em virtude do requerimento, em impugnação ao cumprimento de sentença, de produção de prova pericial com o objetivo de comprovar a alteração superveniente da situação fática ou jurídica subjacente" – declarou a ministra, invocando o artigo 533, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil.

 

Premiar o Ofensor e Punir a Vítima

Entretanto, Nancy Andrighi ponderou que não seria ética nem juridicamente admissível premiar o ofensor e punir a vítima, suprimindo-lhe por completo a indenização, na hipótese em que esta consegue reverter a situação desfavorável que lhe foi imposta.

A relatora observou que as únicas situações autorizadoras da revisão dos alimentos devidos em virtude da prática de ato ilícito são o decréscimo das condições econômicas da vítima (por exemplo, se houver defasagem da indenização) e a mudança da capacidade de pagamento do devedor (que possibilitará o pedido de aumento ou de redução da pensão, conforme o caso).

Segundo a ministra, o fato de a vítima se encontrar capacitada para exercer algum trabalho não lhe retira o direito ao pensionamento, pois se reconhece, nessas situações, maior sacrifício para a realização do serviço.

"Portanto, quando a causa extintiva da obrigação que se pretende provar, em sede de cumprimento de sentença, é o suposto restabelecimento da capacidade laborativa da vítima com o objetivo de eximir-se do pagamento da pensão alimentícia, é de ser indeferida a dilação probatória, porquanto imprestável a alterar a conclusão do órgão julgador", finalizou a relatora.

 

Número do Processo

REsp 1.923.611

 

Ementa

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. OMISSÕES. AUSÊNCIA. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. SÚMULA 7 DO STJ. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DAS PARCELAS VINCENDAS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 7 DO STJ. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. IMPOSSIBILIDADE. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. AUSÊNCIA. ALIMENTOS DECORRENTES DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO. HIPÓTESES AUTORIZADORAS DA REVISÃO.

1- Recurso especial interposto em 19/10/2020 e concluso ao gabinete em 26/2/2021.

2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) o acórdão recorrido padece de omissões; b) houve violação à coisa julgada em virtude da alegada alteração na forma de incidência dos juros de mora; c) cabe à instituição financeira arcar com o pagamento dos juros de mora e da correção monetária dos valores depositados em conta judicial; d) deve ser suspenso o pagamento das parcelas vincendas da pensão alimentícia; e) deve ser mantido o benefício da justiça gratuita; e f) é possível a produção de prova pericial no bojo de cumprimento de sentença com o objetivo de apurar a existência de causa superveniente e extintiva da obrigação. 3- Na hipótese em exame é de ser afastada a existência de omissões no acórdão recorrido, à consideração de que a matéria impugnada foi enfrentada de forma objetiva e fundamentada no julgamento do recurso, naquilo que o Tribunal a quo entendeu pertinente à solução da controvérsia.

4- Derruir a conclusão a que chegou o Tribunal estadual, que, a partir do exame dos cálculos apresentados pela contadoria, afastou a existência de violação à coisa julgada, demandaria o revolvimento do arcabouço fático-probatório, o que é vedado pelo enunciado da Súmula 7 do STJ.

5- No que diz respeito à tese segundo a qual a instituição financeira deveria arcar com o pagamento dos juros de mora e da correção monetária dos valores depositados em conta judicial, tem-se, no ponto, inviável o debate, porquanto não se observa o indispensável prequestionamento. Incidência das Súmulas 282 e 356 do STF.

6- A tese relativa à necessidade de suspensão do pagamento das parcelas vincendas não foi enfrentada pela Corte de origem à luz dos argumentos desenvolvidos pela recorrente nas razões do recurso especial, o que atrai os óbices das Súmulas 282 e 356 do STF.

7- Derruir a conclusão a que chegou a Corte estadual, no sentido de que não estaria comprovado o periculum in mora apto a fundamentar a suspensão da execução, demandaria o revolvimento do arcabouço fático-probatório acostado aos autos, o que é vedado pelo enunciado da Súmula 7 do STJ.

8- O fato de a parte receber ou estar em vias de receber valores decorrentes do próprio processo em que figura como beneficiária da justiça gratuita não constitui fato novo apto a ensejar a revogação do benefício. Precedentes.

9- Na fase de cumprimento de sentença, é plenamente possível a instrução probatória, notadamente quando o executado, na impugnação, invoca causas supervenientes impeditivas, modificativas ou extintivas da obrigação.

10- No que diz respeito à prestação de alimentos decorrente da prática de ato ilícito, não há que se falar, em princípio, em violação à coisa julgada em virtude do requerimento, em impugnação ao cumprimento de sentença, de produção de prova pericial com o objetivo de provar a alteração superveniente da situação fática ou jurídica subjacente à demanda.

11- Não se revela ética e juridicamente admissível premiar o ofensor e punir a vítima, suprimindo-lhe por completo a indenização, na hipótese em que esta logra êxito em reverter a situação desfavorável que lhe foi imposta. Precedente.

12- O fato de a vítima se encontrar capacitada para exercer alguma atividade laboral não lhe retira o direito ao pensionamento, porquanto se reconhece, nessas hipóteses, maior sacrifício para a realização do trabalho.

13- Quando a causa extintiva da obrigação que se pretende provar, em sede de cumprimento de sentença, é o suposto restabelecimento da capacidade laborativa da vítima com o objetivo de eximir-se do pagamento da prestação alimentícia, é de ser indeferida a dilação probatória, porquanto imprestável a alterar a conclusão do órgão julgador.

14- Ainda que seja admissível a dilação probatória na fase de cumprimento de sentença e ainda que isso não represente violação à coisa julgada nas hipóteses em que se pretende a revisão do pensionamento fixado, é totalmente destituída de efeitos práticos, na espécie, a produção da prova pericial pretendida, pois, mesmo que o recorrido se encontre supervenientemente capacitado para exercer alguma atividade laboral, fará jus ao recebimento dos alimentos indenizativos fixados.

15- Recurso especial conhecido em parte e não provido

 

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 04 de maio de 2021(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

 

Fonte

STJ