Ao julgar a apelação cível interposto contra a sentença de procedência dos pedidos de indenização por danos materiais e morais e lucros cessantes em decorrência da invasão de hackers na plataforma de vendas, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais acolheu a preliminar de julgamento ultra petita.
Entenda o Caso
A autora/apelada teve a conta na plataforma digital do Mercado Livre invadida por "Hackers", tendo sido realizadas diversas vendas de produtos cosméticos com preços absurdamente reduzidos, inclusive de produtos não oferecidos pela empresa, como iphones.
Também afirmou que foram adiantados os valores das vendas, realizadas transferências via pix e pagamentos por boletos bancários.
Ao reportar o ocorrido informou que teve sua conta suspensa.
O recurso de apelação cível foi interposto contra a sentença proferida nos autos pretensão indenizatória que julgou procedentes os pedidos para condenar as requeridas ao pagamento de R$ 85.000,00 a título de indenização por danos materiais e R$ 10.000,00 por danos morais, além de lucros cessantes.
Nas razões, as apelantes alegaram a preliminar de julgamento ultra petita e, no mérito, defenderam a inaplicabilidade do Código de Defesa de Consumidor “[...] ao argumento de que a apelada utiliza os serviços prestados pelas ora apelantes para a divulgação de sua atividade comercial, não sendo, portanto, destinatária final do serviço”.
Ainda, dentre outros pontos, reiteraram a alegada inexistência de ato ilícito pela culpa exclusiva de terceiros e da própria vítima.
Decisão do TJMG
A 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, com voto do Desembargador Relator Marcelo de Oliveira Milagres, acolheu a preliminar de julgamento ultra petita.
Isso porque constatou que na petição inicial foi pleiteado o ressarcimento de R$85.000,00 a título de danos materiais e, em emenda à inicial requereu a retificação do valor para R$44.265,00.
No entanto, a sentença condenou os apelantes ao pagamento de indenização por danos materiais no importe de R$85.000,00 “[...] julgando, portanto, além do pedido formulado nos autos, em ofensa ao disposto no art. 492 do Código de Processo Civil”.
Assim, foi alterado o valor para o limite inicial.
No mérito, verificando a responsabilidade das apelantes quanto aos danos patrimoniais e extrapatrimoniais experimentados destacou que “[...] decorre da aplicação da Teoria do Risco, prevista pelo art. 927, parágrafo único, do Código Civil”.
Nessa linha, destacou o art. 931 do Código Civil:
Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação.
E, ainda, o Enunciado n. 378 da IV Jornada de Direito Civil: Aplica-se o art. 931 do Código Civil, haja ou não relação de consumo.
Sendo assim, concluiu que “[...] sobre qualquer ângulo que se analise a questão, resta inconteste a responsabilidade das apelantes pelos danos causados à apelada em virtude da utilização da plataforma digital por elas oferecida, independentemente de ser aplicável ou não a legislação consumerista”.
Pelo exposto, manteve a sentença nos demais pontos, alterando o valor da indenização a título de danos materiais e determinando o cálculo dos lucros cessantes com base no lucro líquido da empresa apelada, “descontadas as despesas operacionais, inclusive eventuais tributos”.
Número do Processo
1.0000.21.112772-5/002
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL - COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS NA PLATAFORMA DIGITAL MERCADO LIVRE - PESSOA JURÍDICA - USO INDEVIDO DE CONTA POR TERCEIROS - TEORIA DO RISCO - FORTUITO INTERNO - DANOS PATRIMONIAIS - DEMONSTRAÇÃO - DANOS MORAIS - CABIMENTO - LUCROS CESSANTES - CÁLCULO. 1 - Nos termos do artigo 492 do Código de Processo Civil "É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado." 2- Segundo a Teoria do Risco consagrada no art. 927, parágrafo único do Código Civil, aquele que cria um risco de dano pelo exercício de sua atividade obriga-se a repará-lo. 3 - Demonstrado nos autos os danos patrimoniais e extrapatrimoniais experimentados, faz jus a apelada à reparação pelos prejuízos sofridos. 4 - Nos termos da Súmula n. 227 do STJ, "A pessoa jurídica pode sofrer dano moral". 5 - Fixação do valor da indenização por prejuízo extrapatrimonial em consonância com a sua extensão. 6 - Na esteira do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, para se aferir o valor dos lucros cessantes deve ser considerado o lucro líquido, descontadas as despesas operacionais, inclusive eventuais tributos.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.21.112772-5/002 - COMARCA DE BETIM - APELANTE(S): EBAZAR COM BR LTDA, MERCADOPAGOCOM REPRESENTAÇÕES LTDA - APELADO(A)(S): ALESSANDRA PEREIRA DOS ANJOS SANTOS 05678571664
Acórdão
Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em ACOLHER PRELIMINAR DE JULGAMENTO ULTRA PETITA PARA ADEQUAR A SENTENÇA E NO MÉRITO, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. MARCELO DE OLIVEIRA MILAGRES
RELATOR