TJMG Determina Recolhimento do Salvado do Veículo com Perda Total

Ao julgar os recursos de apelação interpostos contra sentença que condenou a seguradora ré a pagar a indenização securitária decorrente da perda total do veículo, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais determinou que a seguradora recolha o salvado do veículo e proceda à transferência da propriedade junto ao DETRAN.

 

Entenda o Caso

O primeiro recurso foi interposto pelos autores e o segundo pela companhia de seguros em face da sentença proferida nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos materiais e morais, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais.

A sentença condenou a seguradora ré a pagar a indenização securitária decorrente da perda total, conforme o contrato de seguro.

Além disso, determinou que a segunda autora entregasse à seguradora/ré “[...] o salvado do veículo, livre e desembaraçado de quaisquer ônus, bem como a documentação necessária à transferência de sua propriedade, no ato do pagamento a ser feito pela mesma seguradora do saldo da indenização”.

Nas razões, em suma, os autores impugnaram o valor base da condenação por perda total do bem e pugnaram pela condenação da ré ao ressarcimento do valor das despesas com tributos incidentes sobre o veículo.

A seguradora pugnou pela improcedência da ação, alegando que “[...] má-fé e/ou fraude nas declarações do autor quando da contratação do seguro, bem como alega ser verificável a alteração da verdade dos fatos pelos autores”.

Ainda, afirmou “[...] que não consta registro de dano de alta monta no veículo junto ao DETRAN, pelo que não restaria a perda total comprovada, sendo a seguradora responsável pela indenização apenas na medida do dano”.

 

Decisão do TJMG

A 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, com voto do Desembargador Relator Domingos Coelho, deu provimento parcial ao recurso dos autores.

Quanto à má-fé destacou que o autor figura no contrato como principal condutor, no entanto, “[...] as declarações prestadas em seguida dão conta que há menores de 26 (vinte e seis) anos que podem, eventualmente, até duas vezes na semana, dirigir o veículo, residentes ou não com o autor”.

Sendo assim, ressaltou que é regra a presunção de boa-fé na relação securitária, “[...] o seu oposto, ou seja, a má-fé, deve ser objeto de prova inequívoca, o que, entendo, não restou feito nestes autos”.

Nessa linha, consignou que a ré afirma que o menor de 26 anos dirigia o veículo mais de duas vezes por semana, mas não produziu provas para infirmar as alegações do autor.

Ademais, fez constar que a própria seguradora identificou a perda total no veículo conforme o relatório de avaliação do sinistro, portanto:

[...] se a própria seguradora emite parecer reconhecendo o dano nessa monta, não pode depois, quando acionada judicialmente, descontruir o entendimento que ela proferiu junto ao consumidor/segurado, quando da análise presencial do bem, sob pena de incidir em conduta de má-fé, bem como infringência ao princípio do venire contra factum próprium.

Por fim, fio dado parcial provimento ao primeiro recurso para: “(i) determinar que a seguradora recolha o salvado do veículo no endereço que os requerentes indicarem nos autos, bem como proceda à imediata transferência da propriedade junto ao órgão competente, sob pena de multa diária [...]”.

E “[...] incluir na condenação o dever de ressarcimento das taxas e impostos incidentes sobre o veículo, desde novembro de 2018, e (iii) como consectário do dever de regularização da requerida, autorizar, em caso de quitação pela seguradora, de multa sobre o bem cujo pagamento seja necessário para efetuar a transferência do bem, o desconto do valor em liquidação de sentença”.

 

Número do Processo

1.0000.22.185484-7/001

 

Ementa

PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO CÍVEL - SEGURO VEICULAR - PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ NAS DECLARAÇÕES DO SEGURADO - PERDA TOTAL - RECONHECIMENTO PELA SEGURADORA - MODIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO - VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM - ASTREINTES - POSSIBILIDADE - DANO MORAL - INOCORRÊNCIA - MERO ABORRECIMENTO.

- A má-fé do segurado em prestar as declarações no ato da celebração do seguro não se presume, devendo restar provada de forma indiscutível nos autos para que a seguradora se exima da obrigação de pagar a indenização prevista no contrato.

- Se a própria seguradora emite parecer reconhecendo a perda total do veículo, não pode, depois, quando acionada judicialmente, descontruir esse entendimento, sob pena de incidir em conduta de má-fé, bem como infringência ao princípio do venire contra factum próprium.

- É possível a incidência de astreintes com o fito de ofertar efetividade à decisão judicial, ou seja, possibilitar o alcance do resultado prático desejado, com o cumprimento da obrigação de fazer, consoante exegese do art. 497 do Código de Processo Civil.

- A simples quebra de contrato é incapaz de atingir a honra ou abalar o psicológico dos autores, sendo esses os requisitos para a concessão da indenização, não vindo a passar de um mero dissabor do cotidiano.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.22.185484-7/001 - COMARCA DE BOM DESPACHO - APELANTE(S): CLARISSA FERREIRA MESQUITA NUNES, FERNANDO JOSE NUNES, BRASILVEICULOS COMPANHIA DE SEGUROS - APELADO(A)(S): CLARISSA FERREIRA MESQUITA NUNES, FERNANDO JOSE NUNES, BRASILVEICULOS COMPANHIA DE SEGUROS

 

Acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGAR PROVIMENTO AO SEGUNDO.

DES. DOMINGOS COELHO

RELATOR