TJMG Mantém Negado Direito de Recorrer em Liberdade

Por Elen Moreira - 25/09/2024 as 12:00

Ao julgar os recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público e pelos sentenciados, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais manteve a proibição do direito de recorrer em liberdade, com base na ADI 6.581/DF, na garantia da ordem pública e nos elementos que indicam dedicação estável e permanente ao tráfico de drogas.

 

Entenda o Caso

Os recursos de apelação foram interpostos pelo Ministério Público e pelos sentenciados.

O primeiro teve fixada a pena de 10 anos e 01 mês de reclusão, em regime inicial fechado, e 1408 dias-multa, pela conduta tipificada nos artigos 33 e 35 da Lei nº 11.343/06.

Nas razões, alegou:

(i) a nulidade da busca e apreensão; (ii) o cerceamento de defesa pela falta de oitiva de testemunha da defesa; (iii) a nulidade da análise do aparelho celular apreendido; (iv) a absolvição do crime previsto no art. 35 da Lei nº 11.343/06; (v) a redução da pena-base; (vi) a aplicação do privilégio do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06.

O segundo sentenciado teve a pena fixada em 03 anos e 06 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 816 dias-multa, pela prevista no art. 35 da Lei nº 11.343/06.

Em suas razões, alegou;

[...] a nulidade / inexistência da prova consubstanciada em gravações de conversas telefônicas; (ii) a ilicitude do acesso ao telefone celular do corréu; (iii) a invalidade da prova baseada em "prints" do whatsapp; (iv) a ilicitude do procedimento de busca e apreensão; (v) a absolvição por ausência de provas da prática do crime de associação para o tráfico.

O Ministério Público insistiu na condenação do segundo pela prática do crime previsto no art. 33 da Lei nº 11.343/06.

 

Decisão do TJMG

A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, com voto do Desembargador Relator Franklin Higino Caldeira Filho, rejeitou as preliminares e deu provimento ao recurso ministerial e parcial provimento aos recursos defensivos.

A preliminar de cerceamento de defesa pelo indeferimento da oitiva da testemunha foi rejeitada, considerando que “[...] o fornecimento de endereço (completo), que permita a localização da testemunha arrolada pela parte, é ônus que a ela incumbe e não à Administração da Justiça”.

Ainda, destacou que o contato telefônico com a testemunha realizado pelos servidores do Foro “[...] não supre a necessidade da obtenção do endereço a fim de viabilizar a condução coercitiva pelo oficial de justiça”.

E reiterou os termos da sentença aduzindo que “[...] a parte não pode pretender transferir ao Poder Judiciário o ônus de localizar a testemunha por ela arrolada”.

Quanto à redução da pena-base destacou que “[...] a culpabilidade, a conduta social, os motivos e as consequências do crime não comportam a valoração negativa operada em sentença”.

No entanto, manteve a valoração negativa decorrente da quantidade e natureza das drogas (21 porções de haxixe, pesando 1.350g, 04 barras de maconha, pesando 2.960g, e 01 porção de cocaína, pesando 59,8g).

Ainda, negou a concessão do privilégio do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, “[...] uma vez que a condenação concomitante do agente pela prática do crime de associação para o tráfico revela, com clareza, a sua dedicação a atividades criminosas”.

O direito dos apelantes de recorrer em liberdade se manteve negado, com base na ADI 6.581/DF e “[...] para garantia da ordem pública, diante da gravidade concreta dos crimes cometidos e do risco e reiteração delitiva, nos termos do art. 312 do CPP”.

Para manutenção da prisão durante a fase recursal foi levado em conta, ainda, “[...] que há elementos indicativos de dedicação estável e permanente de C. ao tráfico de drogas e que R. é reincidente na prática do delito de associação para o tráfico”.

 

Número do Processo

1.0024.20.145055-8/001

 

Ementa

APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS - PRELIMINAR - CERCEAMENTO DE DEFESA - INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA - TENTATIVAS FRUSTRADAS DE LOCALIZAÇÃO - FORNECIMENTO DE ENDEREÇO COMPLETO - ÔNUS DA PARTE - MÉRITO - NULIDADE DE PROVAS - INOCORRÊNCIA - MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO - FUNDADAS RAZOES - VERIFICAÇÃO - "PRINTS DE WHATSAPP" - CADEIA DE CUSTÓDIA - VIOLAÇÃO - EFICÁCIA PROBATÓRIA - ANÁLISE EM CONCRETO - PRETENSÃO CONDENATÓRIA (1º Apelante) - TRÁFICO - PROCEDÊNCIA - PRETENSÕES ABSOLUTÓRIAS - ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (3º Apelante) - ACOLHIMENTO - ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO - TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO (2º apelante) - REJEIÇÃO - MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS - INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA - PENA-BASE - CULPABILIDADE - MOTIVOS - CONDUTA SOCIAL - CONSEQUÊNCIAS - VALORAÇÃO NEGATIVA - IMPOSSIBILIDADE - PRIVILÉGIO - CONDENAÇÃO CONCOMITANTE POR ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO - INCOMPATIBILIDADE. É ônus da parte o fornecimento de endereço completo da testemunha a ser intimada e conduzida coercitivamente, não havendo cerceamento de defesa no indeferimento de sua oitiva, após diversas tentativas frustradas, sem que se possa imputar o insucesso ao Poder Judiciário. A presença de fundadas razões, a legitimar a expedição de mandado de busca e apreensão, deve ser aferida com base nos elementos disponíveis e na fundamentação da decisão, e não com referência à eficácia da medida na colheita de elementos penalmente relevantes, sob pena de se inverter condição de validade da diligência (plano normativo) com seu resultado prático (plano fático). A inobservância da cadeia de custódia na produção de relatório de investigação a partir de dados extraídos de aplicativo de conversas em aparelho celular ("whatsapp) não conduz automaticamente à nulidade da prova, devendo ser avaliada, no contexto concreto de sua produção, a confiabilidade dos elementos obtidos e do procedimento adotado (precedentes STJ). Demonstrada a vinculação subjetiva do agente com a substância ilícita apreendida, com finalidade mercantil, impõe-se a sua condenação pelo crime de tráfico de drogas (3º Apelante). Ausentes provas para além de dúvida razoável da estabilidade e permanência do vínculo do agente com demais traficantes, necessária sua absolvição da imputação do delito de associação para o tráfico (3º Apelante). Demonstradas materialidade e autoria dos crimes de tráfico e associação para o tráfico de drogas, mantém-se a condenação (2º Apelante). A culpabilidade, enquanto pressuposto de aplicação da pena, não pode ser utilizada para recrudescer a pena-base. A ausência de motivos não equivale a motivação reprovável, nem essa se caracteriza, no crime de tráfico de drogas, pela busca do lucro fácil. Ausentes elementos nos autos que permitam aferir a conduta social do agente, ela deve ser tida como neutra na dosimetria. Repercussões sociais genéricas do tráfico de drogas, à míngua de indicação de causalidade direta e concreta com a conduta do agente, não podem ser utilizadas para valorar negativamente as consequências do crime, pois se mostram ínsitas ao tipo penal. A condenação concomitante pelo crime de associação para o tráfico é absolutamente incompatível com a incidência do privilégio (art. 33, §4º, Lei nº 11.343/06), pois revela a dedicação do agente a atividades criminosas.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0024.20.145055-8/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - 1º APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - 2º APELANTE: CHARLES LUIZ DE OLIVEIRA - 3º APELANTE: ROBERTO ALVES NERY - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, ROBERTO ALVES NERY

 

Acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR AS PRELIMINARES E DAR PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL E PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS DEFENSIVOS.

DES. FRANKLIN HIGINO

RELATOR