Ao julgar a apelação interposta em face da sentença que declarou a nulidade da convocação para Reunião de Sócios de Grupo Empresarial, o Tribunal de Justiça de Pernambuco deu provimento ao recurso julgar improcedente a inicial e afastar a declaração de nulidade assentando que são dispensadas as formalidades em caso de ciência expressa do sócio acerca do ato.
Entenda o Caso
A ação foi ajuizada a fim de suspender a Reunião de Sócios “[...] até ulterior deliberação deste juízo e necessária regularização de todos os atos e pressupostos para a convocação e instalação válida da reunião, garantindo-se a separação das reuniões, que deverão ocorrer de forma individualizada, e sendo observada a ordem do dia específica para cada sociedade”.
Na petição inicial, o autor alegou a ilegitimidade da convocação de Reunião de Sócios referente a todas as empresas do Grupo, sendo que duas delas tem como diretor administrador o próprio autor.
Argumentou que a reunião não foi convocada por administradoras das referidas sociedades e “não aconteceu nenhuma das causas legitimadoras de convocação por não administradores, de forma que a Convocação é nula de pleno direito e ineficaz em relação a essas sociedades e a todos os seus sócios”.
A sentença julgou procedentes os pedidos e declarou “nula a reunião e as deliberações nela descritas, as quais não podem ser averbadas em Contrato Social ou impostas a terceiros ou partes deste processo”.
Nas razões de apelação as rés afirmaram, dentre outros pontos, que a reunião tinha como fundamento a deliberação de matérias relacionadas a todo o grupo.
Ainda, alegou que a declaração de nulidade da convocação, do ato e das deliberações “[...] implicará no desrespeito ao fundamental princípio de direito que impede qualquer parte de alegar a própria torpeza em seu benefício, uma vez que a nulidade seria passível de regularização ou convalidação apenas por ato do próprio Apelado [...]”.
Decisão do TJPE
A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, com voto do Desembargador Relator Eduardo Sertório Canto, deu provimento ao recurso.
De início, constatou que a convocação se dirigiu a todas as empresas do grupo, pelas pessoas físicas que são sócias e Diretoras Executivas da controladora direta ou indireta de algumas das sociedades.
Também destacou a cláusula décima oitava dos contratos sociais, que dispõe:
As deliberações dos sócios serão tomadas em reunião, devendo ser convocadas pelo Diretor Presidente ou seu substituto, de conformidade com o disposto no artigo 1.072 do Novo Código Civil e deverão obedecer ao disposto no artigo 1.076 do mesmo Código.
No caso, o Diretor Presidente estava doente e faleceu posteriormente, sem que fosse indicado substituto, inclusive no contrato.
Por conseguinte, aplicou o art. 1.072 do CC/2002, no sentido de que “a convocação de reunião para deliberações dos sócios deve ser feita pelos administradores”.
E prosseguiu, mencionando o § 2º do art. 1.072 que dispensa as formalidades da convocação se “[...] todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia”.
Nessa linha, verificou que o autor foi notificado da reunião via cartório, tanto que ajuizou a ação antes da data prevista para o ato.
Sendo assim, concluiu que o não comparecimento à reunião “[...] não afasta a incidência do § 2º do art. 1.072 do CC/2002, tendo em vista que o referido dispositivo legal não exige o comparecimento, mas a ciência do sócio do local, data, hora e ordem do dia”.
Ademais, destacou o princípio geral de direito “segundo o qual a ninguém é dado aproveitar-se de sua própria torpeza”.
Número do Processo
0012316-81.2018.8.17.2001
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO EMPRESARIAL. SOCIEDADE LIMITADA. CONVOCAÇÃO DE REUNIÃO DE SÓCIOS REALIZADA POR SÓCIOS NÃO ADMINISTRADORES. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO §2º DO ART. 1.072 DO CC/2002. SÓCIO INSURGENTE QUE FOI NOTIFICADO, POR CARTÓRIO, DO LOCAL, DATA, HORA E ORDEM DO DIA DA REUNIÃO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO NEMO AUDITUR PROPRIAM TURPITUDINEM ALLEGANS (NINGUÉM PODE SE BENEFICIAR DA PRÓPRIA TORPEZA). APELO PROVIDO. 1. A controvérsia posta nos autos reside em aferir se a convocação de reunião de sócios por parte das apelantes, a saber, Tânia, Zélia, Maria e Rodoviária Borborema Ltda., designada para o dia 22/3/2018, é ou não válida. 2. Da leitura do caput do art. 1.072 do CC/2002, constata-se que a convocação de reunião para deliberações dos sócios deve ser feita pelos administradores. 3. A parte final do § 2º do art. 1.072 do CC/2002 estabelece que se dispensam “as formalidades de convocação previstas no § 3º do art. 1.152, quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia”. 4. No caso dos autos, restou provado ter sido Carlos Alberto notificado, via cartório Mariani, do edital de convocação para a reunião dos sócios do Grupo Borborema no dia 2/3/2018, ou seja, bem antes da data designada para tal reunião, qual seja, 22/3/2018. 5. O Juízo de primeiro grau se equivocou quando deixou de aplicar a incidência do § 2º do art. 1.072 do CC/2002 ao caso dos autos pelo fato de Carlos Alberto não ter comparecido à reunião, porquanto a parte final do referido dispositivo legal estabelece ser dispensada as formalidades de convocação na hipótese de o sócio declarar por escrito estar ciente do local, data e ordem do dia. 6. O não comparecimento voluntário de Carlos Alberto, apesar de estar ciente da data do local, data, hora e ordem do dia da reunião dos sócios do Grupo Borborema designada para o dia 22/3/2018, não afasta a incidência do § 2º do art. 1.072 do CC/2002, tendo em vista que o referido dispositivo legal não exige o comparecimento, mas a ciência do sócio do local, data, hora e ordem do dia. 7. Não é lícito à parte arguir vício para o qual em tese concorreu em sua produção, sob pena de se violar o princípio geral de direito segundo o qual a ninguém é dado aproveitar-se de sua própria torpeza. 8. Apelo provido.7
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível n. 0012316-81.2018.8.17.2001, em que figuram como partes as acima indicadas, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, por unanimidade, em DAR PROVIMENTO ao recurso interposto por Tânia Maria Schwambach, Zélia Maria Schwambach, Maria das Graças Schwambach e Rodoviária Borborema Ltda., na conformidade do relatório, voto, ementa e notas taquigráficas que integram este julgado.
Recife, data da certificação digital.
EDUARDO SERTÓRIO CANTO
Desembargador Relator