A tutela dos direitos fundamentais está disposta no art. 5º do texto constitucional. Tal artigo trouxe através do inciso XXXII a proteção ao consumidor, onde “compete ao Estado promover na forma da lei a defesa do consumidor” “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.”
Vale frisar que, de acordo com o art. 60, §4º, IV, “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais”. Assim, tal artigo é consagrado como cláusula pétrea.
As cláusulas pétreas são limitações materiais ao poder de reforma da Constituição Federal. Desse modo, elas não são passíveis de alteração, pois tem a função de proteger os direitos fundamentais dos cidadãos.
Nesse sentido, considerando que a Constituição Federal buscou tutelar a proteção e defesa do consumidor dentro do art. 5º, artigo este que cuida dos direitos individuais dos cidadãos, entende-se então que a proteção do consumidor é considerada como cláusula pétrea.
O código de defesa do consumidor
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) dispõe sobre a proteção do consumidor e demais assunto acerca do tema. O CDC, assim chamado, estabelece normas de proteção de ordem pública e de interesse social, conforme disposto em seu art. 1º.
As normas cogentes ou de ordem pública não podem ser invalidadas pela vontade das partes. Isso se dá em razão da natureza de sua proteção; no caso do CDC busca-se proteger o consumidor que é considerado vulnerável na relação de consumo.
Desse modo, mesmo que o consumidor, por exemplo, tenha ciência do excesso de onerosidade em uma relação contratual e mesmo assim resolve aceitar tal negócio, esse contrato poderá ser revisto futuramente a fim de afastar a cláusula abusiva.
Consoante ao disposto em relação à análise do Código de Defesa do Consumidor, certo que, é necessário conceituar a figura do consumidor nos termos do art. 2º. Desse modo, considera-se consumidor “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”
Insta salientar que, no parágrafo do referido artigo, há a figura do consumidor por equiparação. Vejam-se:
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Outrossim, o art. 17 do aludido código onde aborda a responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, depreende que:
Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
Desse modo, considera-se consumidor por equiparação aquele que não fez parte diretamente da relação de consumo, no entanto, sofreu com o dano decorrente da falha de prestação de serviço ou do produto que foi contratado por terceiros.
Para melhor elucidação, vamos utilizar um exemplo: um motorista de uma determinada empresa de transporte estava dirigindo um ônibus cheio de passageiro de forma imprudente e acabou perdendo o controle, vindo a atingir um pedestre na rua.
Assim, considerando o exemplo acima, o pedestre é o terceiro interessado na relação de consumo. Desse modo, considerando a falha na prestação de serviços entre os passageiros e a empresa, o pedestre (consumidor por equiparação) poderá requerer indenização por danos morais/materiais, além da responsabilização penal.
A dignidade da pessoa humana no âmbito do direito do consumidor
A Constituição Federal através do inciso III do art. 1º positivou o princípio da dignidade da pessoa humana, sendo este um dos princípios basilares, conforme ditame constitucional.
Insta salientar que o princípio da dignidade humana é um dos mais importantes dentro do contexto jurídico e social, pois o mesmo é inerente à pessoa.
Para alguns doutrinadores, tal princípio está relacionado diretamente ao conceito de mínimo existencial, bem como é o cerne de todo ordenamento jurídico, independentemente de qual seja a esfera do direito, podendo ser direito penal, direito constitucional, direito civil, direito do consumidor ou qualquer outro ramo.
Quanto ao direito do consumidor, o consumidor é considerado a parte mais fraca da relação de consumo, desse modo, o princípio da dignidade da pessoa humana no âmbito do direito do consumidor está relacionado com uma relação contratual justa entre consumidor e fornecedor.
Esse relacionamento deve ser pautado no princípio da boa-fé, sem haver, por exemplo, propaganda enganosa ou abusiva, sem onerosidade excessiva para o consumidor. Pois, as relações devem ser transparentes, sem que haja meios de ludibriar as partes contratantes.
Desse modo, o princípio da dignidade da pessoa humana está relacionado diretamente ao caput do art. 4º do Código de Defesa do Consumidor. Vejamos:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.
Assim, visando a busca de um equilíbrio nas relações contratuais, tendo em vista que o consumidor é o elo vulnerável da relação de consumo, o texto constitucional e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) buscaram tutelar a proteção do consumidor.
Outrossim, a fim de proteger o consumidor, o Estado também criou alguns mecanismos de proteção, como por exemplo, as agências reguladoras ANATEL, ANEEL, ANS, ANVISA, ANAC etc., que possuem a finalidade de fiscalizar, controlar e regulamentar serviços e produtos que estão disponíveis no mercado de consumo.
Além das agências reguladoras, houve também a criação do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor que tem objetivo de orientar os consumidores sobre as relações contratuais, mediar os possíveis conflitos oriundos destas relações e fiscalizar a fim de coibir práticas desleais que prejudiquem o consumidor.
A defesa do consumidor como princípio da ordem econômica
O princípio da ordem econômica está fundado em dois pilares importantes que são a valoração do trabalho e a livre iniciativa, tal princípio está descrito no art. 170 da Constituição Federal. Vejamos:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios. (...)
V - defesa do consumidor (...)
Em que pese haver várias discussões na doutrina a respeito do modelo econômico que seguimos, é inevitável associar o Brasil a um estilo de sociedade capitalista, no entanto, o texto legal também busca efetivar direitos sociais, assim, muitos dizem que o Estado se pautou no Bem- Estar Social.
Tal entendimento se dá devido o artigo supracitado proteger a livre iniciativa, o direito à propriedade privada - previsto na Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) - etc., conquanto, há também a proteção pautada na valoração do trabalho, na defesa do consumidor, na defesa do meio ambiente, entre outros.
Desse modo, a Constituição Federal entendeu que havia a necessidade do livre comércio, ou seja, de ser um estado liberal, ao passo que também havia a necessidade de se pensar no social, pois o mesmo está ligado ao bem-estar de todos os cidadãos e, principalmente, com a dignidade da pessoa humana.
Conforme dito, a valoração do trabalho e a livre iniciativa são pilares do princípio da ordem econômica e são um dos fundamentos que constituem o Estado Democrático de Direito, conforme disposto no inciso IV do art. 1º do texto constitucional.
A parte final do caput do art. 170 dispõe assegurar a todos uma vida digna, trazendo tais ponderações para a proteção do consumidor, nos termos do inciso V, mais uma vez entendemos o contexto no qual o consumidor se enquadra dentro das relações de consumo, a vulnerabilidade.
Considerando que o livre comércio muitas vezes traz situações complexas onde o consumidor poderá ser lesado de alguma forma, assim, a atividade econômica buscou positivar o princípio da defesa do consumidor trazendo proteção ao mesmo, tendo em vista que o consumidor é o elo mais fraco na relação de consumo.
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