Ao julgar o agravo de instrumento contra a decisão que determinou o desentranhamento da contestação intempestiva, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro deu provimento e manteve a peça nos autos assentando que o desentranhamento não é um dos efeitos da revelia.
Entenda o Caso
O espólio ajuizou ação que objetiva a anulação de negócio jurídico e indenização por danos morais, afirmando que a falecida “[...] vítima de golpe perpetrado pelos réus que culminou na venda de um quadro pintado por Cândido Portinari em 1959, especialmente para a família, avaliado em R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais), pelo preço de R$ 70.000,00 (setenta mil reais); fato descoberto pela família após a sua morte”.
O pedido de tutela de urgência foi deferido para obstar a comercialização do quadro, nomeando o 1º réu como depositário fiel.
Em contestação, o primeiro réu argumentou que o quadro estava em estado precário de conservação e que o valor da negociação foi de 300 mil reais, sendo 130 mil entregues em espécie à falecida.
Foi decretada a revelia da segunda ré e determinado o desentranhamento da contestação.
Nos embargos de declaração o parcial provimento se deu a fim de declarar à revelia da segunda ré “[...] contudo, sem os seus efeitos, eis que a defesa se amolda a hipótese prevista no art. 345, I, do CPC”.
O agravo de instrumento interposto impugnou a decisão que determinou o desentranhamento de contestação intempestiva.
Nas razões, a recorrente alegou que: “a) não há previsão legal que determine a exclusão da peça; b) ainda que a peça não possa ser utilizada para questões de fato, ainda resta útil quanto às discussões de direito e aos documentos apresentados, que colaboram para o deslinde da controvérsia, de modo que a decisão cerceia seu direito à ampla defesa e ao contraditório”.
Decisão do TJRJ
A 27ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sob voto da Desembargadora Relatora Maria Luiza De Freitas Carvalho, deu provimento ao recurso.
A taxatividade do art. 1015 do CPC foi mitigada “[...] dada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação, eis que, após a sentença, o reentranhamento da peça e a anulação/repetição dos atos subsequentes implicaria em franco prejuízo à celeridade/efetividade processual”.
Destacando os efeitos da revelia, a Câmara esclareceu que “[...] o desentranhamento da contestação intempestiva não constitui um dos efeitos da revelia [...]”.
Foram colacionados os artigos 355, 344 e 346 do CPC, que assim dispõem:
Art. 344. Se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor.
Art. 346. Os prazos contra o revel que não tenha patrono nos autos fluirão da data de publicação do ato decisório no órgão oficial. Parágrafo único. O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar.
Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349.
Pelo exposto, foi dado provimento ao recurso, para que seja mantida a contestação nos autos.
Número do Processo
Ementa
Agravo de Instrumento. Ação objetivando, além de indenização por danos morais, a anulação de negócio jurídico de compra e venda de um quadro do pintor Cândido Portinari. Decisão que determinou o desentranhamento de contestação intempestiva. Preliminarmente, embora a referida decisão não esteja dentre as hipóteses de cabimento do recurso de agravo de instrumento, à luz da taxatividade mitigada, firmada no julgamento dos REsp 1.696.396/MT e REsp 1.704.520/MT, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o recurso deve ser conhecido dada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão na apelação, eis que, após a sentença, o reentranhamento da peça e a anulação/repetição dos atos subsequentes implicaria em franco prejuízo à celeridade/efetividade processual. No mérito, é cediço que, dentre os efeitos (material e processual) da revelia, não se encontra o desentranhamento da contestação intempestiva. Inteligência dos artigos 344 e 346 do CPC e inexistência de dispositivo legal que determine o desentranhamento. Logo, como a presunção de veracidade decorrente da decretação da revelia é restrita às alegações fáticas e como o revel pode intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar, a peça deve ser mantida nos autos ante seu caráter informativo, viabilizando a livre apreciação das questões de direito, assim como das provas junto a ela acostadas, (Verbete sumular nº 231-STF), em atendimento à ampla defesa e ao contraditório. Decisão reformada. PROVIMENTO DO RECURSO
Acórdão
ACORDAM os Desembargadores da VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por UNANIMIDADE, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto da relatora.