TJRJ Analisa Aumento da Pena-Base em Furto com Abuso de Confiança

Ao julgar a apelação da defesa para ajuste na dosimetria da pena do réu condenado por furto cometido contra idoso mediante abuso de confiança o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro deu parcial provimento mantendo o aumento da pena-base sob fundamento de que os valores economizados para comprar a casa própria não foram recuperados pela vítima.

 

Entenda o Caso

O apelante foi condenado por incurso no artigo 155, §4º, II, do CP, em continuidade delitiva, à 02 anos e 10 meses de reclusão, no regime aberto, e 14 dias multa, sendo a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de R$ 30.425,70, em favor da vítima.

A Defensoria Pública recorreu, “[...] pugnando pela fixação da pena-base no mínimo legal, alertando que o réu é primário e portador de bons antecedentes; a preponderância da atenuante da confissão sobre a agravante prevista no art. 61, II, alínea “h”, do CP; a fixação da fração mínima prevista no artigo 71-CP e, por fim, a redução da prestação pecuniária ao menor patamar estabelecido no §1º, do art. 45-CP”. 

 

Decisão do TJRJ

A 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, sob voto da Desembargadora Relatora Maria Sandra Kayat Direito, deu parcial provimento do recurso defensivo.

Com relação a aplicação da pena base (caput do art. 59 do Código Penal), foram analisados os requisitos: “[...] culpabilidade; antecedentes; conduta social; personalidade do agente; motivos, circunstâncias e consequências do crime; e comportamento da vítima, e indicar, especificamente, dentro destes parâmetros, os motivos concretos pelos quais as considera favoráveis ou desfavoráveis [...]”.

O aumento da pena-base foi confirmado, nos moldes da sentença, com fundamento de que os valores economizados para comprar a casa própria não foram recuperados pela vítima idosa, que ficou “totalmente desassistida financeiramente”.

O relator entendeu que o fundamento não é inerente ao tipo penal, visto que “[...] por si só evidencia todo o sofrimento que passou com o desfalque praticado pelo sobrinho, ora apelante”.

Foi negado o pleito de preponderância da atenuante da confissão sobre a agravante do crime praticado contra idoso.

No caso, foi reconhecida a agravante da senilidade e compensada com a atenuante da confissão.

Nesse ponto, destacou: “De acordo com a jurisprudência do superior Tribunal de Justiça, a menoridade relativa, assim como a senilidade, na forma do artigo 67-CP, possuem maior grau de preponderância em relação àquelas igualmente preponderantes, decorrentes dos motivos determinantes do crime e reincidência”.

Ademais, diante da inúmera quantidade de transferências realizadas foi mantida a fração de aumento em ¼, enfatizando que o magistrado foi benevolente, considerando que o artigo 71-CP “[...] permitiria o estabelecimento da fração máxima de 2/3, conforme jurisprudência consolidada pelo STJ”.

Já a prestação pecuniária foi considerada “[...] exagerada e impossível de ser cumprida pelo apelante”.

Isso porque “[...] a prestação pecuniária tem natureza penal e indenizatória, mas, para sua aplicação, deve ser levada em conta se ela se mostra suficiente para reprovação e prevenção do crime, bem como o prejuízo da vítima”.

Ademais, “[...] deve ser avaliada a situação econômica do réu, sempre com o objetivo de tornar a sanção possível de ser cumprida pelo condenado”.

Assim, foi reduzida a pena alternativa para R$10.000,00.

 

Número do Processo

0003353-55.2017.8.19.0064

 

Ementa

APELAÇÃO – FURTO QUALIFICADO, PELO ABUSO DE CONFIANÇA, PRATICADO EM CONTINUIDADE DELITIVA – ART. 155, § 4º, INCISO II, (DIVERSAS VEZES), N/F DO ART. 71, TODOS DO CÓDIGO PENAL – CONDENAÇÃO – PENA DE 02 ANOS E 10 MESES DE RECLUSÃO, NO REGIME ABERTO, E 14 DIAS MULTA, SENDO A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS, CONSUBSTANCIADAS EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE PELO MESMO PRAZO DE 02 ANOS E 10 MESES E PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, NO VALOR DE R$30.425,70, A SER REVERTIDO EM FAVOR DA VÍTIMA – MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS NÃO CONTESTADAS - INSATISFAÇÃO COM A DOSIMETRIA PENAL – PENA-BASE DEVIDAMENTE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL (02 ANOS E 03 MESES DE RECLUSÃO), EM RAZÃO DO PREJUÍZO SOFRIDO PELA VÍTIMA DE 67 ANOS DE IDADE, QUE FICOU TOTALMENTE DESASSISTIDA FINANCEIRAMENTE – AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 61, II, “H”, DO CP (MAIOR DE 60 ANOS DE IDADE) COMPENSADA COM A CONFISSÃO ESPONTÂNEA – AUSÊNCIA DE PREPONDERÂNCIA – COMPENSAÇÃO QUE SE MOSTRA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL – IMPOSSÍVEL REDUZIR A FRAÇÃO DE AUMENTO ESTABELECIDA NA SENTENÇA (1/4), EM RAZÃO DA CONTINUIDADE DELITIVA – FORAM Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Primeira Câmara Criminal Apelação nº 0003353-55.2017.8.19.0064 Secretaria da Primeira Câmara Criminal Beco da Música, 175, 1º andar – Sala 101 – Lâmina IV Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-5178 – E-mail: [email protected] 2 DIVERSAS AS TRANSFERÊNCIAS REALIZADAS PELO APELANTE EM PREJUÍZO DA LESADA, SENDO CERTO QUE EM APENAS UM EXTRATO BANCÁRIO DA CONTA CORRENTE DA VÍTIMA HAVIA PELO MENOS 10 TRANSFERÊNCIAS, O QUE ENSEJARIA, NO CASO, A ADOÇÃO DA FRAÇÃO MÁXIMA DE 2/3, CONFORME JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADE NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – PLEITO DE REDUÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA - NO PRESENTE CASO, A REPRIMENDA DE 02 ANOS E 10 MESES DE RECLUSÃO FOI SUBSTITUÍDA POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE E PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, NO VALOR DE R$30.425,70, A SER REVERTIDO EM FAVOR DA VÍTIMA LUCINEA. COMO É DE CONHECIMENTO, A PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA TEM NATUREZA PENAL E INDENIZATÓRIA, MAS, PARA SUA APLICAÇÃO, DEVE SER LEVADA EM CONTA SE ELA SE MOSTRA SUFICIENTE PARA REPROVAÇÃO E PREVENÇÃO DO CRIME, BEM COMO O PREJUÍZO DA VÍTIMA. ALÉM DISSO, DEVE SER AVALIADA A SITUAÇÃO ECONÔMICA DO RÉU, SEMPRE COM O OBJETIVO DE TORNAR A SANÇÃO POSSÍVEL DE SER CUMPRIDA PELO CONDENADO. DESTARTE, NÃO OBSTANTE A CONDUTA DO RÉU SER REPROVÁVEL, SUBTRAINDO IMPORTÂNCIAS DA PRÓPRIA TIA/MADRINHA, COM ABUSO DE CONFIANÇA, A FIM DE POSSIBILITAR O CUMPRIMENTO DA PENA PECUNIÁRIA, SEM QUE HAJA REVOGAÇÃO DA BENESSE POR FALTA DE CONDIÇÕES DE PAGAMENTO, COM A CONSEQUENTE PRISÃO, A REFERIDA PENA ALTERNATIVA É REDUZIDA PARA O VALOR R$10.000,00, A SER REVERTIDO EM FAVOR DA VÍTIMA. A FORMA DE PAGAMENTO DEVERÁ SER ESTABELECIDA NA AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA, A SER REALIZADA NO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RESSALTO Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Primeira Câmara Criminal Apelação nº 0003353-55.2017.8.19.0064 Secretaria da Primeira Câmara Criminal Beco da Música, 175, 1º andar – Sala 101 – Lâmina IV Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-5178 – E-mail: [email protected] 3 QUE, NOS TERMOS DO ARTIGO 45, §1º, DO CP, O VALOR PAGO SERÁ DEDUZIDO DO MONTANTE DE EVENTUAL CONDENAÇÃO EM AÇÃO DE REPARAÇÃO CIVIL. QUANTO AO PREQUESTIONAMENTO FORMULADO PELA DEFESA, NÃO SE VISLUMBRA OFENSA A DISPOSITIVOS DE LEIS OU À NORMA CONSTITUCIONAL. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO

 

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos do apelo nº 0003353-55.2017.8.19.0064, em que figuram como apelante André Antônio Argemiro Siqueira e como apelado o Ministério Público,

ACORDAM os Desembargadores que integram a Colenda Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em sessão de julgamento realizada em 22-março-2022, por unanimidade de votos, em prover parcialmente o recurso defensivo, para tão somente reduzir a pena pecuniária substitutiva para o valor de R$10.000,00, a ser revertido em favor da vítima, mantendo-se, no mais, a sentença combatida, nos termos do voto da Desembargadora-Relatora.