Ao julgar o habeas corpus impetrado em favor do paciente que teve sua prisão em flagrante convertida em preventiva, por suposto delito de tráfico de entorpecentes, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro concedeu a ordem com base na pequena quantidade apreendida, na primariedade e nos bons antecedentes.
Entenda o Caso
O habeas corpus, com pedido de liminar, foi impetrado em favor do paciente que teve sua prisão em flagrante convertida em preventiva.
Consta na denúncia que, ao apurar denúncia anônima, os policiais abordaram o paciente e um adolescente dentro do veículo. Em poder do adolescente foram encontrados 3 pinos de cocaína e 02 buchas de maconha, e embaixo do banco de onde estava sentado o paciente encontraram 33 pinos de cocaína e 10 buchas de maconha.
O Paciente foi autuado como incurso nas penas dos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06.
Na audiência de custódia foi convertida a prisão em flagrante em preventiva.
O impetrante alegou que não cabe a conversão, aduzindo que o paciente é primário, tem bons antecedentes, o crime é sem violência ou grave ameaça e, ainda, que não estão presentes os requisitos da prisão preventiva.
A liminar foi indeferida.
Decisão do TJRJ
A 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sob voto do Desembargador Relator André Ricardo de Franciscis Ramos, concedeu a ordem.
O Juízo converteu a prisão por ofensa à ordem pública, sob fundamento de que se trata de crime grave, e que “[...] a forma de acondicionamento das drogas é indicativa de traficância”.
A Câmara constatou que não há ilegalidade na decisão, no entanto, esclareceu que “[...] a regra é a liberdade, sendo a prisão preventiva uma medida excepcional, que somente deve ser adotada quando necessária, com base em dados concretos, nas hipóteses previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal”.
Assim, afirmou que antes da gravidade do suposto crime, “[...] deve-se avaliar primeiro a possibilidade de aplicação de outras soluções mais brandas, também previstas no ordenamento jurídico, que possam atender a necessidade do Estado e tenham efetividade no acautelamento do caso concreto”.
Portanto, levou em conta a pequena quantidade apreendida, a primariedade e os bons antecedentes, e concluiu pela desnecessidade de segregação cautelar.
Número do Processo
Ementa
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA QUE ALEGA, ALÉM DE MATÉRIAS MERITÓRIAS, AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA MANUTENÇÃO DA PRISÃO E DOS REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA, TAMBÉM ALEGA A DEFESA VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. IMPOSSIBILIDADE DE SE DISCUTIR MÉRITO EM SEDE DE HABEAS CORPUS. DECISÃO FUNDAMENTADA. REQUER A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO, PELA DESNECESSIDADE DA PRISÃO CAUTELAR, AUSÊNCIA DO PERICULUM LIBERTATIS, ALÉM DE SEREM O RÉU PRIMÁRIO, DE BONS ANTECEDENTES, COM RESIDÊNCIA FIXA E TRABALHO LÍCITO. LIMINAR INDEFERIDA. POSICIONAMENTO REVISTO. POSSIBILIDADE. 1. Questões meritórias que, como sabido e consabido, são insuscetíveis de serem apreciadas nesta via que, ante sua estreiteza, obsta o revolvimento e, por conseguinte, a valoração de provas atinentes ao mérito, ou seja, se o réu é inocente, se as provas colhidas na fase inquisitorial são ou não válidas, e se foram ou não ratificadas em sede judicial, razão pela qual não serão aqui conhecidas. 2. In casu, constato que o decisum que recebeu a denúncia e manteve a prisão preventiva se encontra devidamente fundamentado, inclusive adotando a técnica per relationem, plenamente admitida pelas nossas Cortes Superiores. A decisão está lastreada no fumus comissi delicti e periculum libertatis, os quais autorizam a imposição da medida extrema, explicitando a prova da existência do crime e os indícios suficientes de autoria, sendo certo que não se pode olvidar quanto à observância do disposto no art. 93, IX da CRFB/88 e art. 315 do CPP, ambas as normas preconizadoras do princípio da motivação. 3. Porém, é cediço que se deve ter em mente que a regra é a liberdade, sendo a prisão preventiva uma medida excepcional, que somente deve ser adotada quando necessária, de forma fundamentada e com base em dados concretos, nas hipóteses previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal. 4. O Paciente foi preso em flagrante, na posse uma quantidade pequena de maconha (53g) e de cocaína (57g). Assim, mesmo diante da materialidade do delito, dos indícios de autoria e da presença dos pressupostos legais, sendo a prisão uma medida excepcional, deve-se avaliar primeiro a possibilidade de aplicação de outras soluções mais brandas, também previstas no ordenamento jurídico, que possam atender a necessidade do Estado e tenham efetividade no acautelamento do caso concreto. Precedentes. Paciente primário e sem antecedentes. Os requisitos autorizadores da custódia cautelar que, na hipótese em cotejo, restam esmaecidos, não havendo nada nos autos, para além da concepção pessoal do julgador a quo, que faça concluir que a segregação cautelar do ora pacientes se faça necessária. 5. A princípio, o crime de tráfico de drogas permite a concessão de liberdade provisória. Ademais, o réu é primário. 7. Assim, a não concessão da liberdade provisória transforma o ergástulo cautelar numa espécie de antecipação de pena. Afinal, contrapondo-se ao jus puniendi estatal, há o jus libertatis do cidadão que, por força de previsão constitucional, é presumidamente inocente até o trânsito em julgado da condenação. 8. Não bastasse isso, uma outra coisa também há de ser considerada: devido à primariedade do Paciente, como bem salientou a doura PGJ em seu parecer, há uma possibilidade de lhe ser concedido o privilégio constante no artigo 33, § 4º da Lei de Drogas, sendo certo que a pena em perspectiva a ser imposta, ante as suas condições pessoais favoráveis, dificilmente seria cumprida em meio fechado. 9. Retificação do posicionamento adotado quando do indeferimento da liminar, substituindo-se a custódia cautelar por medidas diversas da prisão, previstas nos incisos I, II, IV e V, do art. 319, do CPP: I (comparecimento ao juízo sempre que devidamente intimado para tal, proibição de mudar de endereço sem prévia comunicação ao juízo), IV (proibição de se ausentar da Comarca sem prévia autorização judicial) e V (recolhimento domiciliar noturno entre 22 hs e 06 hs) que, aplicadas em conjunto, alcançam os fins colimados. CONTRANGIMENTO ILEGAL VISLUMBRADO, PARA SE CONCEDER PARCIALMENTE A ORDEM SUBSTITUINDO-SE A PRISÃO PREVENTIVA POR CAUTELARES ALTERNATIVAS. EXPEDIÇÃO DE ALVARÀ DE SOLTURA CLAUSULADO.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos de HABEAS CORPUS nº 0049886-94.2022.8.19.0000, sendo impetrante a Dra. Nathalia Parente de Azevedo, Defensora Pública, paciente ANTÔNIO MATHEUS COSTA LEITE, e autoridades coatoras Juízo da Central de Audiências de Custódia da Capital e Juízo de Direito da Vara Criminal de Araruama, A C O R D A M os Desembargadores que compõem a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, CONCEDER PARCIALMENTE A ORDEM, a fim de revogar a custódia cautelar do ora paciente e, em seu lugar, impor-lhe as cautelares previstas nos incisos I, II, IV e V, do art. 319, do CPP. nos termos do voto do Relator, ordenando-se a expedição de alvará de soltura clausulado.
Rio de Janeiro, na data constante da assinatura digital.
JDS Desembargador ANDRÉ RICARDO DE FRANCISCIS RAMOS
Relator