Ao julgar o recurso interposto pelo Ministério Público contra a decisão que rejeitou a denúncia por atipicidade da conduta de violação de decisão administrativa de suspensão do direito de dirigir o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul negou provimento assentando que somente a decisão judicial pode ser objeto do descumprimento do tipo do art. 307, caput, do CTB.
Entenda o Caso
A peça acusatória atribuiu ao denunciado a violação de decisão administrativa de suspensão do direito de dirigir.
O Ministério Público recorreu da decisão que rejeitou a denúncia por atipicidade da conduta.
Decisão do TJRS
A 3ª Turma Recursal Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, sob voto do Desembargador Relator Luiz Antônio Alves Capra, negou provimento ao recurso.
A conduta foi confirmada pela Turma como atípica, “[...] na medida em que apenas a violação a suspensão imposta em razão de decisão judicial configura o tipo penal, uma vez que o tipo penal do art. 307 do CTB tutela a administração da justiça”.
Nessa linha, destacou o entendimento doutrinário de Marcellus Polastri, no sentido de que:
[...] o Código de Trânsito Brasileiro erigiu a suspensão ou proibição de obtenção da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor como pena criminal autônoma, nos casos dos arts. 302, 303, 306 e 308, podendo, ainda, vir a ser aplicada como penalidade principal, isolada ou cumulativamente, na forma do art. 292 deste Código. Assim, o descumprimento pelo agente da suspensão ou proibição de obtenção da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, imposta como pena criminal pelo juiz, na forma dos arts. 292 e 293 do Código de Trânsito Brasileiro, equivalerá a verdadeira desobediência à determinação judicial, sendo erigida em tipo penal no art. 307 no Estatuto de Trânsito. Portanto, o bem jurídico tutelado é a decisão ou autoridade do juiz, ou seja, em suma, a administração da justiça.
Ainda, foi colacionado o entendimento pacífico da Turma Recursal (Recurso Crime Nº 71008080921), de acordo, também, com o STJ (HC 427.472/SP):
[...] 3. Dada a natureza penal da sanção, somente a decisão lavrada por juízo penal pode ser objeto do descumprimento previsto no tipo do art. 307, caput, do CTB, não estando ali abrangida a hipótese de descumprimento de decisão administrativa, que, por natureza, não tem o efeito de coisa julgada e, por isso, está sujeita à revisão da via judicial.
4. In casu, a conduta de violar decisão administrativa que suspendeu a habilitação para dirigir veículo automotor não configura o crime do artigo 307, caput, do CTB, embora possa constituir outra espécie de infração administrativa, segundo as normas correlatas.
5. Ordem concedida para anular a condenação do paciente e determinar o trancamento do procedimento penal que já se encontra em fase de execução.
Pelo exposto, foi mantida a decisão recorrida.
Número do Processo
Ementa
apelação. crime DE TRÂNSITO. ART. 307 DO CTB. DIRIGIR VEÍCULO COM HABILITAÇÃO SUSPENSA. MUDANÇA DE ORIENTAÇÃO.
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Conduta que se afigura atípica na medida em que apenas a violação a suspensão imposta em razão de decisão judicial configura o tipo penal, uma vez que o tipo penal do art. 307 do CTB tutela a administração da justiça. Questão pacificada perante esta Turma Recursal.
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Precedente do STJ no julgamento do HC n. 427472 / SP que consagra esse entendimento: “[...] nos termos do art. 292 do CTB, a suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imputada como espécie de sanção penal, aplicada isolada ou cumulativamente com outras penas. 3. Dada a natureza penal da sanção, somente a decisão lavrada por juízo penal pode ser objeto do descumprimento previsto no tipo do art. 307, caput, do CTB, não estando ali abrangida a hipótese de descumprimento de decisão administrativa, que, por natureza, não tem o efeito de coisa julgada e, por isso, está sujeita à revisão da via judicial[...]”.
RECURSO IMPROVIDO.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Juízes de Direito integrantes da Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DR. EDSON JORGE CECHET (PRESIDENTE) E DR. LUIS GUSTAVO ZANELLA PICCININ.
Porto Alegre, 23 de maio de 2022.
DR. LUIZ ANTÔNIO ALVES CAPRA,
Relator.