Reconhecimento e investigação parental

O presente artigo tem o objetivo de conceituar e analisar os institutos do reconhecimento e da investigação parental, bem como abordar os artigos sobre o tema previstos no Código Civil.

O que é o reconhecimento parental?

O reconhecimento da paternidade, previsto nos artigos 1.607 ao 1.617 do Código Civil, é um ato, voluntário (ato espontâneo praticado pelos genitores) ou forçado (contra a sua vontade), através do qual se estabelece a relação de parentesco em primeiro grau na linha reta1

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Maria Helena Diniz conceitua da seguinte forma:

“(...) É, por isso, declaratório e não constitutivo. Esse ato declaratório, ao estabelecer a relação de parentesco entre os genitores e a prole, origina efeitos jurídicos. Desde o instante do reconhecimento válido, proclama-se a filiação, dela decorrendo consequências jurídicas, já que antes do reconhecimento, na órbita do direito, não há qualquer parentesco.”

A Carta Magna de 1988, no seu artigo 227, §6º, trouxe um avanço ao dispor que os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Ou seja, trouxe ao ordenamento jurídico o princípio da igualdade substancial entre os filhos, vedando o tratamento diferenciado. Nesse sentido argumentam os autores Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves:

“Acresça-se, ademais, que o princípio da igualdade substancial entre os filhos impede, efetivamente, qualquer óbice à obtenção da perfilhação. Ou seja, independentemente da situação familiar dos pais, é sempre assegurado o direito ao reconhecimento de parentalidade, voluntário ou forçado”.

O artigo 1.597 do Código Civil prevê a presunção de paternidade, que só tem aplicação para os filhos de pessoas casadas entre si, conforme segue:

Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Cumpre ressaltar que essa presunção é relativa, pois admite prova em contrário, podendo ser contestada a paternidade.

Reconhecimento Voluntário

O artigo 1.607 do Código Civil dispõe que o filho havido fora do casamento pode ser reconhecido pelos pais, conjunta ou separadamente. Dessa forma, temos o reconhecimento voluntário, caso os genitores perfizeram o ato espontaneamente, sem qualquer imposição.

O que esse artigo nos informa também é que somente os filhos de pessoas não casadas entre si, naturalmente, precisam ter o seu vínculo filiatório reconhecido pelos seus pais, através de ato espontâneo ou da intervenção judiciária2

O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou pode ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes, conforme parágrafo único do artigo 1.609 do CC.

Ainda, o mesmo artigo dispõe que o reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: a) no registro do nascimento; b) por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório; c) por testamento, ainda que incidentalmente manifestado ou d) por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Reconhecimento de filho maior e de filho menor

O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação, conforme o artigo 1.614 do Código Civil.

Porém, o filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, ficará sob a de quem melhor atender aos interesses do menor, conforme artigo 1.612 do Código Civil.

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Nesse sentido, segue o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça3:

“(...) Essa criança ou adolescente tem o direito de impugnar a sua paternidade, no prazo decadencial dos quatro anos que se seguirem à sua maioridade, ou à emancipação, o que não o impede de se opor ao seu reconhecimento antes, mas deverá ser judicialmente representado, se tiver menos de dezesseis anos, e assistido após esta idade e antes de atingir os dezoito anos de idade, ou ser emancipado, não se deslembrando que o Superior Tribunal de Justiça reiteradamente vem afirmando se tratar de um direito personalíssimo e imprescritível do filho impugnar a sua paternidade”. 

Reconhecimento voluntário realizado de forma administrativa

A Lei 8.560/92 trouxe no seu artigo 2º uma forma simplificada de reconhecer a paternidade: em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, o oficial remeterá, ao juiz, certidão integral do registro e o nome e prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim de ser averiguada oficiosamente a procedência da alegação.

Importante ressaltar que esse procedimento administrativo não é pré-requisito para ajuizar a ação de investigação de paternidade.

Investigação parental

É uma espécie forçada de reconhecimento de filhos, pois é realizada através de decisão do Poder Judiciário, proferida em ação de investigação de paternidade.

De acordo com Rolf Madaleno, essa ação tem natureza declaratória, porque a decisão judicial não constitui a filiação biológica existente desde a concepção, sendo assim o reconhecimento forçado da paternidade é uma ação de estado da pessoa, com o escopo de declarar a relação jurídica de filiação, considerada um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível.

De acordo com o artigo 1.615 do Código Civil, qualquer pessoa, que justo interesse tenha, pode contestar a ação de investigação de paternidade, ou maternidade.

Assim, podemos dizer que a expressão correta é investigação de “parentalidade”, uma vez que pode ser investigada não só a paternidade, como também a maternidade e outros vínculos de parentesco, como os avós.

Dessa forma, é necessário distinguir a ação de parentalidade da ação de ascendência genética (realizada através do exame de DNA).

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Os autores Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves explicam perfeitamente a diferença entre elas:

“(...) Através da ação de investigação de parentalidade pretende-se obter o reconhecimento filiatório, (...) uma relação de parentesco, com todos os seus efeitos pessoais (direito ao sobrenome do pai e ao registro civil) e patrimoniais (direito à herança, aos alimentos, etc.). (...) A outro guro, através da investigação de origem genética, uma pessoa que titulariza uma relação paterno-filial (ou seja, já tem genitor), estabelecida a partir de hipóteses não biológicas (por exemplo, através de adoção ou de filiação socioafetiva), pretende obter o reconhecimento da sua origem ancestral, em relação ao seu genitor biológico. (...) Aqui, funda-se o pedido no exercício de um direito da personalidade (totalmente desatrelado de uma relação de família) e a pretensão é, por igual, imprescritível, e o direito em disputa, inalienável”.

Portanto, o reconhecimento da origem genética não depende de um vínculo filiatório, diferentemente da investigação de parentalidade.

1 ROSENVALD, Nelson e DE FARIAS, Cristiano Chaves. Curso de Direito Civil – Famílias, 2017. Editora Juspodivm, p. 619.
2 Idem - pg. 620.
3 REsp. n. 939.818/RS; REsp. n. 595.942/MG; REsp. n. 714.969/MS e REsp. n. 987.987/SP

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família, 2012. Editora Saraiva, p. 516.

MADALENO, Rolf. Direito de Família, 2020. Editora Forense, p. 1028.

ROSENVALD, Nelson e DE FARIAS, Cristiano Chaves. Curso de Direito Civil – Famílias, 2017. Editora Juspodivm, pgs. 619, 620, 632, 633.