Ao julgar a apelação interposta pela União Federal e à Remessa Necessária contra decisão que determinou que o fornecimento do medicamento Stelara (Ustequinumabe) para portadora de Doença de Crohn e de Espondilite Anquilosante, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região julgou improvidos concluindo que é obrigação do Estado assegurar às pessoas o acesso ao tratamento necessário para cura de doenças.
Entenda o Caso
A autora é portadora da Doença de Crohn e de Espondilite Anquilosante e apresentou refratariedade do quadro inflamatório, sendo necessária a mudança na terapia com o medicamento Humira - Adalimumabe para a medicação Stelara (Ustequinumabe).
A apelação foi interposta pela União Federal e Remessa Necessária em face da sentença que julgou procedente o pedido para condenar a União e o Estado a entregar à Autora o medicamento.
Na Apelação, a União Federal alegou, como consta “[...] que não há evidências científicas que autorizem a afastar a conclusão da CONITEC - quando da avaliação para atualização do PCDT da Doença de Crohn - quanto à não incorporação da medicação ao SUS”.
Ainda, argumentou que “[...] deve ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente”, afirmando que “[...] há integral, eficaz e efetivo tratamento terapêutico ofertado pelo SUS para o caso da Autora, inexistindo razões suficientes para sua substituição pela opção terapêutica pleiteada nesta ação”.
Decisão do TRF5
A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, sob voto do relator Desembargador Federal Cid Marconi, negou provimento ao recurso e à remessa necessária.
Inicialmente, destacou o direito de todos e dever do Estado previsto no art. 196 da Constituição Federal, concluindo que “É obrigação do Estado, no sentido lato (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso ao tratamento necessário à cura de suas mazelas, em especial, as mais graves”.
Ademais, asseverou a responsabilidade solidária dos entes federativos (RE 855.178/RG).
No caso, constatou que o laudo pericial concluiu que “[...] a medicação solicitada é a única disponível no mercado Nacional e Internacional para o tratamento da doença que acomete a Autora e que inexiste medicamento de eficácia similar fornecido pelo SUS [...]”.
Ainda, levando em conta que o medicamento pleiteado é registrado na ANVISA, foi mantida a determinação do fornecimento do medicamento pleiteado.
Número do processo
0809565-59.2019.4.05.8100
Ementa
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: COSMA MARIA CALAÇA RODRIGUES REPRESENTANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Cid Marconi Gurgel de Souza - 3ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Luis Praxedes Vieira Da Silva EMENTA ADMINISTRATIVO. TRATAMENTO MÉDICO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. LAUDO PERICIAL. NECESSIDADE COMPROVADA.
1. Apelação interposta pela União Federal e Remessa Necessária em face de sentença que julgou procedente o pedido para condenar a União Federal e o Estado do Ceará a entregar à Autora, de forma efetiva, imediata e regular, o medicamento Ustequinumabe (Stelara) na dosagem prescrita pelo Médico que a acompanha. A União Federal deixou de ser condenada no pagamento de honorários em favor da DPU, mas o Estado do Ceará foi condenado a pagar honorários de sucumbência no valor de R$ 600,00.
2. A Carta Magna de 1988 erige a saúde ao patamar de direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí a seguinte conclusão: É obrigação do Estado, no sentido lato (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso ao tratamento necessário à cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. Destarte, os aludidos entes federativos detêm responsabilidade solidária, de modo que qualquer um deles tem legitimidade para figurar no polo passivo das ações em que se busca atendimento médico, bem como o fornecimento de medicamentos, para aqueles impossibilitados de arcar com o tratamento necessário. O col. STF já teve oportunidade de se pronunciar nesse mesmo sentido, ao julgar o RE 855.178/RG, em sede de Repercussão Geral.
3. A divisão administrativa de atribuições entre tais Entes, prevista na Lei nº 8.080/90, não deve servir de empecilho à população para o acesso ao tratamento necessário à cura de suas doenças, não podendo restringir a responsabilidade solidária dos Entes da Federação. Essa divisão nada mais é do que a repartição do ônus financeiro decorrente desse dever de prestar assistência à saúde da população e deve ser resolvida entre os próprios Entes, seja administrativamente ou mesmo pela via judicial.
4. O col. STF se pronunciou afirmando "ser possível ao Judiciário a determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada fornecida pelo SUS, desde que reste comprovação de que não haja nela opção de tratamento eficaz para a enfermidade" (STF - ARE 926.469 AgR, Rel. Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 07/06/2016, processo eletrônico DJe-128 divulg 20-06-2016 public 21-06-2016).
5. Compulsando os autos, verifica-se, por meio de Laudos Médicos Particulares e de Laudo Pericial Judicial, que a Autora é portadora da Doença de Crohn (CID K 50.1), uma doença inflamatória intestinal grave também chamada de Pancolite grave, refratária a tratamento conservador. Além disso, também é portadora de Espondilite Anquilosante. Também restou consignado que a paciente, depois de inúmeros tratamentos, tem apresentado refratariedade do quadro inflamatório, mesmo em uso da terapia com o medicamento Humira - Adalimumabe. Em razão disso e para evitar risco de complicações da doença, é necessária a mudança na terapia para a medicação Stelara (Ustequinumabe), que é indicada para o tratamento das duas doenças.
6. Por sua vez, o Perito Judicial concluiu que a medicação solicitada é a única disponível no mercado Nacional e Internacional para o tratamento da doença que acomete a Autora e que inexiste medicamento de eficácia similar fornecido pelo SUS que seja indicado para o seu tratamento. Inclusive, informou existir evidência científica comprovando a eficácia do fármaco pleiteado para a doença da Demandante. Ao final do seu laudo, concluiu que há elementos técnicos para sustentar a indicação da Ustequinumabe na situação da Postulante, tendo em vista a evidência em literatura médico-científica de que a terapia com essa substância traz benefícios para os pacientes portadores da Doença de Crohn grave, refratários à terapia com drogas disponíveis pelo SUS, incluindo Anti-TNF.
7. Sabe-se que o perito indicado pelo Juízo, além do vasto conhecimento na área da Perícia que vai realizar, é imparcial e equidistante do interesse das partes envolvidas no litígio, de forma que tais condições contribuem sobremaneira para a formação da convicção do Magistrado. Além do mais, o medicamento pleiteado é registrado na ANVISA.
8. Tais elementos são mais do que suficientes para formar a convicção do Juízo pela necessidade de se determinar o fornecimento do medicamento pleiteado à Autora. 9. Apelação e Remessa Necessária improvidas. Sem condenação em honorários recursais, eis que a União Federal não foi condenada em honorários sucumbenciais.
(PROCESSO: 08095655920194058100, APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA, DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI GURGEL DE SOUZA, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 05/08/2021)