O Ministro Gilmar Mendes concedeu a liminar pleiteada no recurso ordinário em habeas corpus e determinou a soltura do condenado, até o julgamento do mérito do recurso, assentando a fragilidade do reconhecimento realizado por meio de uma única foto enviada pelos policiais por WhatsApp, sem que tenham sido constatadas outras provas a evidenciar a autoria.
Entenda o Caso
O recurso ordinário em habeas corpus foi interposto contra acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, nos autos do HC 608.756/SP.
A DPU impetrou habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça arguindo, como consta, “[...] a nulidade do reconhecimento pessoal realizado em Juízo, porquanto os policiais teriam, no momento da abordagem, fotografado o recorrente e enviado a foto a seus colegas que estavam com as vítimas, que o reconheceram e, por isso, foi ele conduzido à delegacia, onde se procedeu ao reconhecimento pessoal”.
O Superior Tribunal de Justiça indeferiu liminarmente o habeas corpus e, em seguida, negado provimento ao agravo regimental.
Rejeitados, ainda, os embargos de declaração opostos.
No Supremo Tribunal Federal o recorrente reiterou pedidos formulados.
Decisão do STF
O Ministro Relator Gilmar Mendes, de início, assentou que se trata de habeas corpus impetrado após o trânsito em julgado da sentença condenatória, não havendo, no entanto, vedação à análise, como arguiu a PGR (AgR no HC 193.877, Segunda Turma).
Nesse caso, consignou que “[...] não é necessário revolver as provas dos autos. Basta a análise da sentença [...]”.
Da prisão em flagrante constatou que “[...] com ele não foi encontrado nenhum objeto do delito; não foi encontrada a arma de fogo; não foram encontrados os demais agentes”.
E que “[...] não há, nos autos, informações que expliquem por qual razão os policiais fotografaram o recorrente no momento da abordagem, uma vez que, com ele, nada foi encontrado”.
Sobre o reconhecimento fotográfico extraiu da doutrina: “No que refere especificamente à prova de reconhecimento, a preservação do mito da 'memória máquina filmadora’ significa aquiescer a falsos negativos e a falsos positivos, isto é, à absolvição de culpados e à condenação de inocentes”.
Ressaltando, também, a ocorrência das falsas memórias.
No caso, destacou que há dúvida porquanto, mesmo que o Juízo tenha registrado o depoimento de dois policiais, “[...] nenhum outro elemento corrobora as declarações das vítimas, que afirmaram reconhecer o recorrente, inicialmente, por foto recebida via WhatsApp”.
Até mesmo porque a constatação de que os depoimentos são cópia integral um do outro fragilizou a credibilidade.
Assim, foi determinada a imediata soltura do recorrente até julgamento do mérito do recurso.
Número do Processo
Ementa
EMENTA: I. Reconhecimento de pessoa: sua realização sem observância do procedimento determinado imperativamente pelo art. 226 C.Pr.Pen. elide sua força probante e induz à falta de justa causa para a condenação que, além dele e de sua reiteração em juízo, também sem atendimento às formalidades legais, só se apóia em confissão policial retratada.
A ratificação, em Juízo, não o qualifica como dado autônomo, apto a lastrear a condenação. Também a menção a depoimento do policial civil, no que apenas confirmou a realização do reconhecimento, nada acrescentando em relação à autoria do crime, surge insubsistente.
Decisão
Como se vê, penso, neste momento, assistir razão à DPU ao afirmar que, no caso concreto, o reconhecimento judicial está viciado pelo reconhecimento fotográfico realizado por WhatsApp, somado ao fato de que nenhuma outra prova há nos autos no sentido de confirmar a autoria sobre o recorrente.
Ante o exposto, concedo a liminar para determinar a imediata soltura do recorrente, se por outro motivo não estiver preso, até o julgamento do mérito deste recurso pelo colegiado.
Publique-se. Comunique-se com urgência.
Brasília, 28 de setembro de 2021.
Ministro GILMAR MENDES
Relator