Ao julgar o recurso de agravo contra decisão que reconheceu a falta grave e determinou a interrupção do prazo para a progressão de regime, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro declarou nulo o PAD e cassou a decisão por ausência de advogado no processo administrativo.
Entenda o Caso
O recurso de agravo foi interposto pela Defesa contra decisão do Juízo da Vara de Execuções Penais, que reconheceu a falta grave prevista no art. 50, VII da LEP, decorrente do procedimento disciplinar e determinou a interrupção do prazo para a progressão de regime.
A falta grave se deu diante da posse de aparelho celular encontrado dentro de um pacote de biscoito, após revista na cela.
A Defesa pleiteou a nulidade do processo disciplinar, alegando cerceamento de defesa por ausência de defensor na oitiva, contrariando o disposto no art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal.
Ainda, argumentou que não foi colhido o termo de declaração do verdadeiro proprietário do aparelho celular e acentuou a não realização de audiência de justificativa, perante a Vara de Execuções Penais.
O Procurador de Justiça opinou pelo provimento do agravo e a consequente nulidade do procedimento administrativo.
Decisão do TJRJ
A 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sob voto da Desembargadora Relatora Maria Angélica G. Guerra Guedes, deu provimento ao recurso.
Foi consignado, com base no artigo 59 da LEP, que “[...] qualquer sanção imposta reclama prévio processo administrativo disciplinar, observadas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa”.
Nessa linha, constou ainda a súmula 533 do STJ, que dispõe:
[...] “para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado”.
Mencionando a Súmula Vinculante nº 5 do STF, no sentido de que “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição”, ressaltou que “[...] o Plenário do Pretório Excelso, em julgamento do RE nº.398.269/RS, Rel. Exmo. Min. Gilmar Mendes, DJe 26/2/2010, concluiu pela inaplicabilidade da mesma aos procedimentos administrativos destinados a apuração de falta grave”.
E esclareceu que “Tal entendimento se justifica ante a possibilidade de interferência do direito de ir e vir do apenado, razão pela qual a presença de advogado constituído, ou de Defensor Público nomeado é essencial para o exercício do contraditório e da ampla defesa”.
Com isso, foi dado provimento ao agravo, declarado nulo o Procedimento Administrativo Disciplinar e cassada a decisão do juízo da execução que deferiu a interrupção da contagem de prazo para progressão de regime.
Número do Processo
Ementa
AGRAVO EM EXECUÇÃO. PENAL. CONSTITUCIONAL. FALTA GRAVE, CONSISTENTE EM POSSE DE TELEFONE CELULAR NO INTERIOR DE PRESÍDIO. DECISÃO DO JUÍZO DA VEP QUE RECONHECEU A VALIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO E DETERMINOU A INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA A PROGRESSÃO DE REGIME. INCONFORMISMO DO AGRAVANTE QUE REQUER A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR PELA AUSÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA POR OCASIÃO DA OITIVA DO APENADO. NO MÉRITO PUGNA PELO RECONHECIMENTO DA ATIPICIDADE DA CONDUTA, ALEGANDO QUE O AGRAVANTE TERIA RECEBIDO DE OUTRO INTERNO UM PACOTE DE BISCOITO, QUE CONTINHA O REFERIDO TELEFONE CELULAR, SEM QUE SOUBESSE DISSO, E QUE, POSTERIORMENTE, ESTE INTERNO TERIA ASSUMIDO SER POSSUIDOR DO APARELHO. Ab initio, consigna-se que o judiciário exerce o controle dos procedimentos administrativos examinando a observância das formalidades exigidas, não devendo, salvo em casos excepcionais, quando evidente a violação ao princípio da proporcionalidade ou razoabilidade, interferir no mérito da punição ou na sua própria graduação. Na hipótese dos autos, observa-se que ao ora agravante não foi viabilizado o exercício pleno da defesa, haja vista que, por ocasião de sua oitiva, embora tenha sido previamente advertido acerca de seu direito ao silêncio e tenha manifestado o desejo de ser assistido pela Defensoria Pública, não havia nenhum integrante desta nobre instituição o assistindo. Ainda que, na oportunidade tenha respondido negativamente, ao lhe ser perguntado acerca da necessidade da presença de Defensor Público durante a oitiva, tal fato consiste em mácula ao pleno direito à ampla defesa, sendo desinfluente a posterior abertura de vista à Defensoria. Na ocasião, no exercício de sua autodefesa, o apenado negou a prática dos fatos narrados. Impende destacar que, a despeito de a Súmula Vinculante nº. 5 do STF dispor que “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição”, o Plenário do Pretório Excelso, em julgamento do RE nº.398.269/RS, Rel. Exmo. Min. Gilmar Mendes, DJe 26/2/2010, concluiu pela inaplicabilidade da mesma aos procedimentos administrativos destinados a apuração de falta grave. Destarte, impõe-se a declaração de nulidade do PAD n. E21.049.032.2020, por inobservância aos ditames legais e constitucionais vigentes, e, por conseguinte, cassa-se a decisão do juízo da execução que, em razão dele, deferiu a interrupção da contagem de prazo para progressão de regime. AGRAVO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
Acórdão
ACORDAM os Desembargadores que compõem a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em dar provimento ao presente agravo, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.
Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.
Desembargadora Maria Angélica G. Guerra Guedes
Relatora