TRF3 Reforma Sentença e Absolve Réu da Imputação de Sonegação

Ao julgar a apelação criminal interposta contra sentença condenatória pela prática dos crimes do art. 168-A, § 1º, I, c. c. art. 71, e no art. 337-A, III, c. c. art. 71, todos do Código Penal, o Tribunal Regional Tribunal Regional Federal absolveu o acusado por ausência de prova suficiente de materialidade e autoria, assentando que a única prova, testemunhal, mostrou contradições, gerando dúvidas.

 

Entenda o Caso

O sentenciado foi denunciado por “[...] deixar de repassar à Previdência Social, no prazo e forma legais, os valores descontados de seus empregados, a título de contribuições sociais, bem como suprimiu ou reduziu o pagamento de contribuição social previdenciária mediante omissão de informações”.

Foi interposta apelação contra a sentença que condenou o apelante pela prática dos crimes descritos no art. 168-A, § 1º, I, c. c. art. 71, e no art. 337-A, III, c. c. art. 71, cumulados com o art. 69, todos do Código Penal, à pena de 7 anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 22  dias-multa.

A defesa invocou a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva entre a data dos fatos e a do recebimento da denúncia; a nulidade da sentença por ilegitimidade de parte; a ausência de autoria delitiva; e, subsidiariamente, requereu a redução das penas e a fixação do regime inicial aberto.

 

Decisão do TRF3

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, sob voto do Desembargador Federal Relator André Nekatschalow, deu provimento ao recurso.

De início, fez constar que para configurar o delito de sonegação é imprescindível o procedimento administrativo-fiscal como condição de procedibilidade da ação penal, nesse caso, o processo administrativo suspende o curso da prescrição da ação penal, conforme entende o STF - HC n. 81.611-DF.

No caso, o início do prazo prescricional é a data da constituição definitiva do crédito tributário, ou seja, 29.07.14, “[...] quando se esgotou o prazo legal sem apresentação de recurso voluntário em face da decisão proferida na impugnação administrativa [...]”.

Nessa linha, destacou que “O crédito tributário foi constituído depois da edição da Lei n. 12.234/10 que alterou a redação do art. 110, §1º, do Código Penal, e revogou seu § 2º, vedando o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva retroativa no período anterior à data do recebimento da denúncia ou da queixa”.

A pena individual fixada em 3 anos de reclusão prescreve em 8 anos, não tendo decorrido tal prazo entre a data do recebimento da denúncia, 06.03.18, e a data da sentença condenatória, 30.06.21, ou entre a sentença e o acórdão.

No mérito, constou que a materialidade e a autoria não restaram comprovadas, porquanto o documento acostado não comprova sonegação e sim o lançamento da multa por descumprimento de obrigação acessória, bem como a prova da autoria teria base apenas no conteúdo testemunhal, a qual não é robusta, verificando contradições entre os depoimentos das testemunhas, “[...] gerando dúvida razoável sobre o fato de o réu ser o real administrador da empresa C. [...]”.

Por fim, foi rejeitada a preliminar e dado provimento ao recurso da defesa para absolver o acusado.

 

Número do Processo

0000707-37.2018.4.03.6104

 

Ementa

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. Prescrição retroativa. Lei n. 12.234/10. Art. 110 do Código Penal. Data da CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PRELIMINAR REJEITADA. MATERIALIDADE QUANTO AO FATO OCORRIDO EM MARÇO DE 2012 NÃO COMPROVADA. AUTORIA DELITIVA NÃO DEMONSTRADA. ABSOLVIÇÃO. RECURSO DA DEFESA PROVIDO.

1. Resta pacificado no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que o delito tipificado no art. 1º da Lei n. 8.137/90 é de natureza material e apenas se configura com a efetiva lesão aos cofres públicos, de maneira que o procedimento administrativo-fiscal constitui condição de procedibilidade da ação penal e, enquanto perdurar o processo administrativo, por iniciativa do contribuinte, suspende-se o curso da prescrição da ação penal (STF, Pleno, HC n. 81.611-DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, maioria, j. 10.12.03). O mesmo tratamento jurídico deve ser dado ao delito previsto no art. 337-A do Código Penal, pois disciplina a mesma realidade fática especificamente em relação às contribuições previdenciárias (STF, HC n. 89.965, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 06.02.07; TRF da 3ª Região, HC n. 31.355, Rel. Des. Fed. Cotrim Guimarães, j. 25.11.08).

2. Resta pacificado nos Tribunais Superiores o entendimento de que o delito tipificado no art. 168-A do Código Penal é de natureza material, uma vez que para sua consumação exige-se a efetiva frustração à arrecadação da Seguridade Social, razão pela qual é exigível o encerramento do procedimento administrativo (STF, Inq n. 2.537 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 10.03.08; STJ, HC n. 209.712, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, j. 16.05.13; STJ, HC n. 186.200, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, j. 14.05.13; STJ, AgRg no REsp n. 1.172.001, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 05.02.13). Também é nesse sentido a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF da 3ª Região, Ação Penal n. 0000767-76.2005.4.03.6003, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, Órgão Especial, j. 10.07.13; TRF da 3ª Região, Primeira Seção, Emb. Infr. n. 0002806-34.2011.4.03.6133, Rel. para acórdão Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 04.07.13).

3. Revejo meu entendimento para acolher a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e da 4ª Seção deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no sentido de que, quanto ao delito de sonegação fiscal, deve ser considerada a data da constituição definitiva do crédito tributário para fins de aplicação da Lei n. 12.234/10, que alterou a redação do art. 110, §1º, do Código Penal, e revogou seu § 2º, vedando o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva retroativa no período anterior à data do recebimento da denúncia ou da queixa (STJ, AgRg no AREsp 1.563.941, Relª. Minª. Laurita Vaz, j. 22.09.20 e AgRg no ED no AREsp 1.265.734, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06.12.18; TRF 3ª Região, ElfNu n. 0000389-85.2016.4.03.6181, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 15.04.21).

4. A partir da Lei n. 12.234/10, que deu nova redação ao § 1º do art. 110 do Código Penal, e revogou seu § 2º, é vedado o reconhecimento da prescrição retroativa no período anterior à data do recebimento da denúncia ou da queixa, regra que, por ser mais prejudicial ao agente, não se aplica retroativamente. No que se refere ao delito de apropriação indébita previdenciária, de natureza material, à semelhança do delito de sonegação fiscal, considera-se a data da constituição definitiva do crédito tributário para determinar a aplicabilidade da nova disposição (STJ, AgRg no AREsp n. 1708693, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 23.02.21, AgRg no AREsp 1.563.941, Relª. Minª. Laurita Vaz, j. 22.09.20 e AgRg no ED no AREsp 1.265.734, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06.12.18 e TRF 3ª Região, ElfNu n. 0000389-85.2016.4.03.6181, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 15.04.21).

5. Materialidade quanto ao fato ocorrido em março de 2012 não comprovada.

6. Autoria delitiva em relação aos fatos ocorridos nos anos de 2007 e de 2008 não demonstrada.

7. De acordo com a acusação, a prova da autoria delitiva seria exclusivamente testemunhal, não havendo um único documento que relacione o acusado à empresa Caviahue, muito menos à sua administração. Ademais, a prova testemunhal não é robusta, havendo contradições entre os depoimentos das testemunhas, gerando dúvida razoável sobre o fato de o réu ser o real administrador da empresa.

8. Embora seja o responsável por outras duas empresas do grupo empresarial, não há prova suficiente nos autos que demonstre que o réu tinha efetivo poder de gestão na empresa Caviahue Serviços para TV a Cabo Ltda. nos anos de 2007 e de 2008.

9. Recurso da defesa provido.

 

Acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu, REJEITAR a preliminar e DAR PROVIMENTO ao recurso da defesa para absolver o acusado do crime do art. 337-A, III, do Código Penal, ocorrido em março de 2012, com fundamento no art. 386, I, do Código de Processo Penal, e absolver o réu dos crimes do art. 168-A, § 1º, I, e do art. 337-A, III, ambos do Código Penal, praticados no período de janeiro de 2007 a dezembro de 2008, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.