TRF3 Veda Aumento de Pena por Lucro Fácil e Lesão ao Erário

Ao julgar a apelação interposta pela defesa contra condenação a pena de 2 anos pelo crime de descaminho o Tribunal Regional Federal da 3ª Região excluiu o aumento da pena-base assentando que o lucro fácil e a lesão ao erário estão inseridos no tipo penal, fixando a pena em 1 ano e 4 meses.

Entenda o Caso

A Apelação Criminal foi interposta em face da sentença que condenou o réu à pena privativa de liberdade de 02 anos de reclusão em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos.

A conduta foi tipificada no artigo 334, inciso IV, do Código Penal - Descaminho, ante a importação de mercadorias estrangeiras sem regularidade fiscal, conforme exposto no Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias, resultando em tributos federais no valor de R$ 635.699,31.

Em Apelação a Defesa requereu “[...] a absolvição do réu sob o argumento de que a pena de perdimento de bens seria incompatível com a aplicação do tipo penal de descaminho”.

Subsidiariamente, pleiteou “[...] a redução da pena-base para o mínimo legal e a diminuição do valor da prestação pecuniária para 01 (um) salário-mínimo, alegando hipossuficiência do acusado”.

Decisão do TRF3

A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, com voto do Desembargador Relator Fausto de Sanctis, deu provimento parcial ao recurso.

De início, consignou o teor do previsto no artigo 334, §1º, inciso IV, do Código Penal, que expõe:

Descaminho

Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria.

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem:

(...)

IV - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.

Analisando o pleito de absolvição destacou que “O delito de descaminho consuma-se quando a mercadoria destinada à importação ou exportação irregular ingressa no território nacional, com a ilusão dos tributos devidos”.

Esclarecendo, ainda, sobre a autonomia de instâncias “[...] sendo plenamente possível que uma única conduta reverbere nos campos penal, cível, administrativo e tributário”.

Por conseguinte, confirmadas materialidade e autoria, as quais não foram impugnadas, foi mantida a condenação,

Sob análise da dosimetria da pena constatou que a pena-base foi exacerbada “ante a valoração negativa da culpabilidade, dos motivos do crime, das consequências e dos maus antecedentes”.

Considerando o transporte de mercadoria em elevado valor manteve negativa a culpabilidade e confirmou os maus antecedentes, no entanto, excluiu o aumento decorrente dos motivos do crime e das consequências.

Isso porque entende que o lucro fácil e a lesão ao erário estão inseridos no tipo penal.

Por fim, aplicada a atenuante da confissão, fixou a pena em 01 ano e 04 meses de reclusão em regime de cumprimento inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos.

Número do Processo

0007407-79.2016.4.03.6110

Ementa

PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGO 334, §1º, INCISO IV, DO CÓDIGO PENAL (REDAÇÃO ATUAL). DESCAMINHO CONFIGURADO. PENA DE PERDIMENTO DE BENS NÃO AFASTA A TIPICIDADE DA CONDUTA. DOSIMETRIA DA PENA. EXCLUSÃO DOS MOTIVOS E DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. MANUTENÇÃO DO VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. APELAÇÃO DO RÉU PROVIDA EM PARTE.

1. Perdimento de bens. Alegação de atipicidade da conduta afastada. A imposição da pena de perdimento (de matiz eminentemente aduaneira) não possui o condão de afastar a tipicidade do crime de descaminho. Precedente jurisprudencial.

2. Em que pese não tenha havido insurgência quanto à existência de autoria, materialidade e elemento subjetivo, tem-se que tais elementos restaram suficientemente comprovados nos autos, notadamente pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito, pelo Auto de Apresentação e Apreensão da mercadoria estrangeira, pelo Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias e Planilha de Tributos Federais não recolhidos, aliados à prova oral carreada aos autos, tendo o réu confessado os fatos.

3. Dosimetria da pena. O lucro fácil está ínsito ao tipo penal e sua revaloração na primeira etapa dosimétrica configuraria bis in idem, razão pela qual deve ser afastado o vetor “motivos do crime”. As consequências do delito, apontadas como lesão ao erário, também estão inseridas no crime de descaminho, registrando-se que o alto valor sonegado será aferido na culpabilidade, sendo o caso de se afastar aludido vetor. Mantidas a aferição negativa da culpabilidade no patamar eleito pela r. sentença, uma vez que o transporte de mercadoria em tão elevado valor (R$ 1.065.818,48), gerando alta sonegação de tributos federais (R$ 635.699,31), revelou maior grau de reprovabilidade da conduta do agente e foge dos casos comumente praticados neste tipo penal, bem como dos maus antecedentes, configurados pelo registro criminal do acusado. Pena-base reduzida para 02 (dois) anos de reclusão. Mantida a atenuante da confissão e seu respectivo redutor (1/3), diminuindo a pena para 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, a qual se torna definitiva ante a ausência de outras atenuantes, agravantes, causas de aumento ou de diminuição, a ser cumprida em regime inicial ABERTO.

4. Substituição da reprimenda corporal por restritivas de direitos. A reprimenda corporal foi substituída por duas restritivas de direitos consubstanciadas em prestação de serviços à comunidade, pelo tempo da reprimenda corporal substituída, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários-mínimos, destinada a entidade a ser determinada pelo Juízo da Execução Penal, o que deve ser mantido em razão das peculiaridades do caso em concreto e da possibilidade de parcelamento, tratando-se de patamar que atende ao propósito de reprimir o acusado pelo ilícito praticado.

5. Apelação do réu provida em parte.

Acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação da Defesa, a fim de reduzir a pena privativa de liberdade para 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime de cumprimento inicial ABERTO, mantendo-se, no mais, a r. sentença recorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.