TRF4 Analisa Responsabilidade em Desconto Indevido do Benefício

Ao julgar as apelações interpostas pelos réus, INSS e Banco, contra sentença de procedência da ação de declaração de inexistência de relação jurídica referente a contrato de empréstimo descontado do benefício previdenciário o Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento assentando a responsabilidade civil do INSS, prevista no § 6º do artigo 37 da CF, e do Banco no CDC, artigos 2º e 3º, § 2º.

 

Entenda o Caso

A ação foi ajuizada contra o INSS e o Banco, objetivando a declaração de inexistência de relação jurídica referente a contrato de empréstimo, a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário e indenização por danos morais.

O valor creditado na conta a título de empréstimo, que a autora negou ter contratado, não foi utilizado e estava sendo descontado de seu benefício em 72 prestações. 

Ao pleitear a suspensão dos descontos aos réus, diante da divergência da assinatura em seu documento de identificação e a do contrato, os réus negaram o pedido.

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a nulidade do contrato de empréstimo consignado e condenar o Banco ao pagamento das parcelas descontadas do benefício, fixando R$ 5.000,00 a título de danos morais para o Banco e para o INSS.

O Banco alegou nulidade da sentença assentando que embora a perícia grafotécnica tenha apontado divergências nas assinaturas, "não eram perceptíveis por pessoas leigas", afirmando ser vítima, assim como a autora, tendo agido com boa-fé.

O INSS alegou culpa exclusiva de terceiro.

 

Decisão do TRF4

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sob voto da Desembargadora Federal Relatora Vânia Hack De Almeida, negou provimento aos recursos.

Quanto à responsabilidade civil do INSS assentou que, conforme previsto no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal, e no Recurso Extraordinário nº 841.526/Supremo Tribunal Federal, concluiu que “[...] configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa [...]”.

Já a responsabilidade civil aplicável ao Banco está fixada no Código de Defesa do Consumidor, nos artigos 2º e 3º, § 2º, da Lei 8.078/90, e no enunciado nº 297 da súmula do Superior Tribunal de Justiça, concluindo que o banco responde objetivamente danos causados por falha do serviço.

Ou seja, “[...] não importa se a instituição bancária agiu com ou sem culpa. Basta a existência de um defeito do serviço bancário aliada à ocorrência de um dano, interligados por um nexo de causalidade”.

Assim, foi mantida a sentença que afastou a isenção de responsabilidade pleiteada pelos réus, salientando a Turma que “[...] o próprio banco reconheceu a fraude e, apesar de ter disponibilizado o valor mutuado na conta da autora, esta dele não usufruiu, tanto que o depositou em juízo”.

Ainda, destacou que o INSS manteve os descontos mesmo depois de procurado pela autora, o que acarretou evidente prejuízo, “[...] uma vez que, embora tenha tido o valor ‘contratado’ depositado em sua conta-corrente, teria ela de arcar com os custos de um empréstimo que não solicitou”.

 

Número do Processo

5074951-04.2019.4.04.7100

 

Ementa

DIREITO ADMINISTRATIVO, DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SEGURADA DO INSS QUE NÃO PACTUOU EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COM INSTITUIÇÃO BANCÁRIA E SOFREU DESCONTOS EM SEU BENEFÍCIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA AUTARQUIA. LEI 10.820/2003. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. BANCOS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. RESPONSABILIDADE CIVIL RECONHECIDA.

1. O INSS é parte legítima em demanda que versa sobre a ilegalidade de descontos efetuados em benefício previdenciário de segurado da Previdência, nos termos do artigo 6º, § 1º, da Lei 10.820/2003, notadamente quando recebeu a documentação do banco acerca do contrato de empréstimo e, mesmo a pedido da segurada, não cancelou a operação fraudulenta, cuja assinatura utilizada para celebrá-la é diferente daquela constante noutros documentos da segurada.

2. A responsabilidade civil do Estado pressupõe a coexistência de três requisitos: a) a comprovação da ocorrência do fato ou evento danoso, bem como de sua vinculação com o serviço público; b) a prova do dano sofrido; e c) a demonstração do nexo de causalidade entre o fato danoso e o dano sofrido.

3. A responsabilização civil dos bancos envolve a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, diploma que, na forma dos artigos 2º e 3º, § 2º, da Lei 8.078/90, bem como do enunciado nº 297 da súmula da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, abrange as operações bancárias.

4. Caso em que o INSS não cessou os descontos no benefício da segurada, apesar de o contrato de empréstimo que recebeu do banco ser fraudulento por conter assinatura diversa da dela, tanto que o próprio banco acabou por reconhecer a fraude.

5. Responsabilidade civil dos réus reconhecida na forma do § 6º do artigo 37 da Constituição Federal (INSS) e artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor (Banco Pan S/A).

 

Acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de novembro de 2021.

VÂNIA HACK DE ALMEIDA