TRF4 Reforma Sentença Condenatória em Regime Fechado

Ao julgar a apelação interposta contra sentença condenatória por uso de documento falso e estelionato, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento ao apelo e, de ofício, reduziu as penas, revogando a prisão preventiva e determinando a imediata soltura.

 

Entenda o Caso

A denúncia foi oferecida diante das condutas previstas no artigo 171, § 3º, c/c artigo 14, todos do Código Penal, porquanto utilizando de Carteira Nacional de Habilitação falsa, com sua fotografia, mas com dados qualificadores de outra pessoa, compareceu na agência da Caixa Econômica e informou querer fazer um saque de R$ 5.000,00, não obtendo êxito ante a desconfiança do caixa do Banco.

A sentença o condenou pela prática do delito previsto no art.171, §3º, c/c artigo 14, inciso II, e pela prática do crime previsto no artigo 304, c/c artigo 297 do Código Penal, todos na forma do artigo 70 do Código Penal à pena total de 04  anos e 08 meses de reclusão, em regime fechado, mantendo a prisão preventiva, e pena de multa de 150  dias-multa.

A Defesa interpôs apelação alegando “[...] a incompetência da Justiça Federal para processamento e julgamento do feito. E, quanto ao mérito, em síntese, sustentou (ev. 7 da apelação penal): (a) restar caracterizada, na espécie, a figura do crime impossível, em face da ineficácia absoluta do meio já que a falsificação da CNH é grosseira; e (b) o afastamento da condenação pelo delito de falsificação de documento público na forma do enunciado na súmula 17 do STJ”. 

 

Decisão do TRF4

A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sob voto da Desembargadora Federal Relatora Salise Monteiro Sanchotene, negou provimento ao recurso e, de ofício, corrigiu as penas e determinou a imediata expedição do alvará de soltura.

Quanto a alegação de crime impossível, a Turma ressaltou que “A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região exige que a caracterização da conduta como crime impossível tenha por base a ineficácia absoluta do meio empregado pelo agente”.

No caso, destacou que restou confirmada a potencialidade lesiva do documento falso apresentado e que “[...] a mera presença de segurança no estabelecimento bancário não é bastante para tornar impossível a prática do crime de estelionato”, mencionando a Súmula nº 567 do STJ.

Em situação semelhante acostou o entendimento julgado no ACR 5067496-56.2017.4.04.7100, da 8ª Turma.

No entanto, as penas fixadas na sentença foram readequadas, passando a ser fixada pena de em 10 meses e 4 dias-multas para o delito de estelionato e para o delito de uso de documento público falso a pena foi fixada em 2 anos, 5 meses e 5 dias de reclusão e 21 dias-multa.

Feita a detração de 05 meses de prisão provisória decorrente do recolhimento desde a prisão em flagrante, foi estabelecido o regime aberto para cumprimento e substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, revogando a prisão preventiva.

 

Número do Processo

5019329-66.2021.4.04.7003

 

Ementa

PENAL. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO - ART. 304 C/C ART. 297 DO CÓDIGO PENAL. ESTELIONATO TENTADO CONTRA A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL -  CRIME IMPOSSÍVEL NÃO CONFIGURADO. PRINCIPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE. DOSIMETRIA. QUANTUM DE EXASPERAÇÃO POR VETORIAL NEGATIVADA - REDUÇÃO DE OFÍCIO. PENAS REDUZIDAS. PRISÃO PREVENTIVA REVOGADA

1 A apresentação de documentos falsos à empregado da Caixa Econômica Federal, para o fim de sacar valores de conta de terceiro, atrai a competência para o processamento e o julgamento da causa para Justiça Federal, de acordo com o artigo 109, incisos I e IV, da Constituição Federal (precedentes).

2. Presente prova da materialidade, da autoria e do dolo no agir, bem como inexistentes causas excludentes da culpabilidade ou da ilicitude, impõe-se a condenação do réu pela prática do crime de uso de documento público falso (art. 304 c/c 297, todos do Código Penal).

3. Comprovado que o réu, de maneira livre e consciente, empregou meio fraudulento com o fim de obter vantagem indevida, em prejuízo da Autarquia Federal, não conseguindo seu intento, em face de razão alheias à sua vontade, resta caracterizado o delito tipificado no art. 171, § 3º, c/c art. 14, ambos do Código Penal.

4. Não há falar em crime impossível quando o meio empregado era perfeitamente idôneo para obtenção do resultado criminoso, o qual somente não foi alcançado por circunstância alheia à vontade do agente, uma vez que os próprios servidores da Autarquia lograram descobrir a fraude anteriormente a obtenção da vantagem indevida pelo agente.

5. Verificado que o documento falso (identidade em nome de outrem) é apto e possibilita muitos outros estelionatos, de modo que a potencialidade lesiva não se esgota apenas no estelionato tentado indicado na denúncia, sendo hipótese de concurso formal e não de aplicação do princípio da consunção. Inviável a aplicação da Súmula 17/STJ. Precedentes.

6. O ordenamento jurídico não estabeleceu um critério fixo de aumento para cada circunstância judicial, deixando a critério do magistrado, que deve obedecer os limites mínimos e máximos da pena prevista para o delito cometido pelo réu e apresentar fundamentação seguindo a razoabilidade e proporcionalidade.

7. O acréscimo de pena para um agravamento comum, sem nota de destaque, é suficientemente realizado agregando à pena base 1/8 do termo médio. Ainda que o juízo não esteja adstrito a  fórmulas matemáticas, o referencial da fração de 1/8 sobre o termo médio para o acréscimo de pena nas circunstâncias judiciais é admitida pelo Superior Tribunal de Justiça.

8. Tendo o julgamento da apelação implicado na redução da pena privativa de liberdade, a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, no caso concreto, a prisão preventiva decretada não pode subsistir. Tratando-se de réu primário, que não ostenta registros criminais que correspondam a maus antecedentes ou à reincidência, cuja pena aplicada poderá ser cumprida em regime aberto e com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, impõe-se a concessão da liberdade provisória mediante os compromissos do artigo 328 do Código de Processo Penal (não mudar de residência, ou ausentar-se por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar ao juízo onde será encontrado).

 

Acórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo e, de ofício, reduzir as penas aplicadas ao apelante, revogar a prisão preventiva, determinar a imediata comunicação ao juízo de primeiro grau, para que seja expedido alvará de soltura, a fim de que o réu seja posto em liberdade, se por outro motivo não estiver preso, mediante confirmação, quando da intimação desta decisão, do endereço de sua residência, onde poderá ser encontrado, devendo tal declaração constar do termo de compromisso relativo ao art. 328 do CPP, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 25 de janeiro de 2022.

SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Desembargadora Federal